Falecimento
Morre Sidinei Basile, jornalista, advogado e executivo
Sidinei Basile tinha 64 anos e 43 de profissão. Atuava também como conselheiro do WWF-Brazil - World Wildlife Foundation, do CEBDS - Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável e do Instituto Akatu para o Consumo Consciente. Além disso, era vice-presidente do Comitê de Liberdade de Expressão da Sociedade.
Com vasta formação, Sidinei trabalhou como jornalista na Folha de S. Paulo e na Gazeta Mercantil. Foi diretor-superintendente da Unidade de Negócios Exame, da Editora Abril, e atuou no Citibank e na Burson Marsteller.
Formado pelas Arcadas (Turma 1970) e pelo Departamento de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, em sociologia. Sidinei Basile também foi professor na Faculdade Cásper Líbero e é autor do livro Elementos de Jornalismo Econômico, referência na área. Foi eleito Editor do Ano pelo Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo 2004.
Sidinei Basile deixa esposa, os filhos Alexandre, Juliano (formado pelas Arcadas, Turma 1996), Felipe (formado pelas Arcadas, Turma 2000) noras, netos.
Confira abaixo a íntegra do depoimento da jornalista Míriam Leitão, publicado no jornal O Globo de 17/3/11.
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Um defensor do jornalismo e da liberdade
Míriam Leitão
Quando vi Sidnei Basile pela última vez, ele me disse: “Eu vou morrer. Você sabe, não?” Ele queria dar a notícia, exercendo mais uma vez a atividade que o mobilizou por 43 anos. Em seguida, falamos do que o animava, apesar do câncer fulminante: a segunda edição do seu livro “Elementos de jornalismo econômico.” Queria atualizar com os novos desafios, a presença da mulher na imprensa, e enfatizar a defesa da liberdade de expressão.
A imprensa para Sidnei era sacerdócio, trincheira de defesa de valores, função para ser exercida com olho no interesse público. Nas reuniões de pauta, ele falava de princípios. Isso era em plena ditadura, e ele chefiava a “Gazeta Mercantil”, em Brasília. O sonho que ele tinha era de fazer um jornal econômico moderno, preciso, mas com visão social e política. Montou uma redação com nomes que marcam a imprensa, como Lillian Witte Fibe, Cláudia Safatle, Celso Pinto, Célia de Gouvêa Franco, entre outros. Apesar da pouca idade na época, sua maturidade era notável, seu olhar, surpreendente, sua generosidade, rara.
Quando o vi pela primeira vez, em 1977, buscava emprego em Brasília. Tinha saído do Espírito Santo depois de episódios de perseguição política, não tinha registro profissional, estava grávida do meu segundo filho e ninguém me conhecia na cidade. Entrei na sala tremendo. Precisava de emprego, mas pensei que seria recusada. Havia duas vagas no jornal, tentava a mais modesta.
Conversamos sobre variados assuntos, ele me perguntou de livros que eu tinha lido, tudo como se não fosse uma entrevista de emprego. Aí, ele me ofereceu a melhor vaga. Eu disse: “Queria dizer que estou grávida de quatro meses.” Ele me deu parabéns e pediu que voltasse no dia seguinte já com a carteira.
Essa foi a primeira delicadeza. Nos anos seguintes, Sidnei me ensinou o ofício como nenhuma outra pessoa. Me orientou sobre ter objetivos e persegui- los. Me mostrou falhas; passou truques de textos, apuração e entrevista. Foi a pessoa mais importante na minha formação profissional; e foi referência para inúmeros outros jornalistas pelas lições de rigor na apuração e noção de que servimos a quem consome a nossa informação. “Corra o risco de perder o furo; não corra o risco de dar uma notícia errada”, dizia aos repórteres.
O jornalismo econômico no final dos anos 1970 estava no meio de discussões sobre liberdade das empresas, do mercado, e da cidadania. O Estado, que de tanto crescer sufocava e capturava as empresas, era o mesmo que restringia as liberdades individuais e fechava a economia. Sidnei ensinava que o jornalismo econômico deveria ser exercido dentro desse contexto.
Quando enfrentou a censura, soube estar do lado certo. Na última vez que falou na Associação Nacional de Editores de Revistas, da qual era vicepresidente, avisou: “A luta pela liberdade de expressão não acabou ainda no Brasil.”
Sidnei dirigiu a “Gazeta Mercantil”; foi executivo no Citibank, na Burson-Marsteller. Era vice-presidente institucional da Editora Abril. Foi professor. Era do Comitê de Liberdade de Expressão da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP).
Numa de suas aparições públicas, em 2010, Sidnei fez uma defesa intransigente da liberdade de imprensa e avisou: “Não é o Estado que fiscaliza a imprensa, é a imprensa que fiscaliza o Estado.”
Em novembro, numa reunião da SIP no México, foi homenageado de surpresa. Defendeu de novo os valores democráticos. Lutou, com risco pessoal, por esses valores desde os tempos de estudante de Direito e de Sociologia da USP.
Sidnei morreu ontem, aos 64 anos; deixa Beth, a mulher, os filhos Alexandre, Juliano e Felipe, noras, dois netos e inúmeros amigos, alunos e pessoas gratas a ele pelo apoio em momentos decisivos.
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