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Justiça de São Paulo nega indenização por danos morais ao deputado Federal Paulinho da Força

O TJ/SP negou o pedido feito pelo deputado Federal Paulinho da Força de indenização por danos morais contra a editora Abril. O parlamentar pediu um valor de 20 mil reais em razão do título da Veja de 21 de maio de 2008: "O lado negro da Força".

7/7/2010

Danos Morais

Justiça de São Paulo nega indenização por danos morais ao deputado Federal Paulinho da Força

A Justiça de São Paulo negou pedido de indenização por danos morais proposto pelo deputado Federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, contra a editora Abril. O deputado pedia indenização no valor de 20 mil reais em razão de reportagem de capa da revista Veja publicada na edição de 21 de maio de 2008, intitulada "O lado escuro da Força". Segundo Paulinho, a matéria teria promovido contra ele "campanha difamante e desmoralizante", manipulando a verdade.

Para o juiz Luiz Otávio Duarte Camacho, da 4ª vara Cível do Foro Regional de Pinheiros, a reportagem apresentou apenas fatos jornalísticos relacionados ao deputado. Além disso, Paulinho não provou que a matéria mentia e nem o dano que ela teria causado.

Em um trecho da decisão, Camacho afirma que a imprensa não pode ser amordaçada sob nenhum pretexto, muito menos por meio do Poder Judiciário. "Evidente que os meios de comunicação devem praticar a verdade e a ética porque não têm permissão para enxovalhar a imagem de nenhum cidadão. Mas tudo isto não significa ser tíbio e medroso na arte e missão de informar. Especialmente quando se trata dos atos dos agentes públicos como foi dito acima. Então, os meios de comunicação são mesmo, eficaz forma de controlá-los e exigir deles ética e respeito ao povo".

A Editora Abril foi representada pelos advogados Alexandre Fidalgo e Claudia de Brito Pinheiro David, do escritório Lourival J. Santos - Advogados.

_____________

SETENÇA

Em 04 de novembro de 2009, faço estes autos conclusos a MM. Juiz(a) de Direito Dr.(a). LUIZ OTÁVIO DUARTE CAMACHO, Eu, _______(Luis Carlos) Escr. subscr.

Processo nº: 011.09.115165-2

Classe - Assunto Procedimento Ordinário

Requerente: Paulo Pereira da Silva

Requerido: Editora Abril S/A

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luiz Otavio Duarte Camacho

PAULO PEREIRA DA SILVA move a presente ação de indenização por danos morais contra EDITORA ABRIL S/A, alegando, em síntese, que a ré, através de sua revista Veja, causou-lhe dano moral com a publicação da reportagem “O lado escuro da força” e, com ela, ofenderam sua honra, pois que, propositadamente e com fito sensacionalista, apresentaram reportagem de modo falacioso e sem seriedade, daí porque entende ter sofrido dano moral com as notícias veiculadas em face do direito de liberdade de informação da ré através de seu periódico. Com outras ponderações conclui requerendo a procedência da ação e condenação da ré ao pagamento de indenização pelo dano moral causado, bem como a condenação a divulgar a sentença de procedência, na íntegra, na mesma revista, nos moldes apresentados. Requereu, ainda, a condenação da ré ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado. Deu valor à causa e juntou documentos.

Regularmente citada, a requerida apresentou resposta por contestação, sem preliminares, e, no mérito sustentou a tese maior de que sua reportagem não trouxe nenhuma inverdade ou calúnia contra a pessoa e honra do autor. Em seguida, teceu várias considerações a respeito do tema em sustento à sua tese maior e culminou requerendo a improcedência da ação com a condenação do autor nas verbas de sucumbência. Juntou documentos.

Réplica às fls. 277/282.

As partes se sucederam em manifestações.

É o relatório.

D E C I D O.

Este processo deve ser julgado desde já, eis que a matéria de mérito nele versada não exige dilação probatória em audiência de instrução e julgamento.

Com efeito.

“...em uma visão moderna do processo o Juiz deixa de ser aquela figura passiva a quem incumbe apenas receber as provas produzidas pelas parte s editar uma verdade e ditar uma verdade meramente aparente. Agora, ele passa a ser ator coadjuvante na própria instrução processual, incumbindo-lhe determinar de ofício a produção das provas que se mostrem necessárias em determinadas circunstâncias. Afinal, mais do que julgar de acordo com o que está nos autos, o magistrado (compromissado com um processo mais efetivo) deve julgar de acordo com a verdade material” (Provas Aspectos atuais do direito probatório, O Direito à prova e a busca da verdade material de Rogéria Dotti Dórea) Ora, se o juiz hoje tem quase como que um dever a iniciativa e o direito de buscar as provas mais pertinentes e adequadas para que o processo produza a verdade material, é obvio que diante das provas produzidas, e outras requeridas pelas partes, poderá ele, selecionar as que melhor informam a matéria de mérito, dispensando as que se apresentam desnecessárias como é o no presente caso. A prova testemunhal requerida pelo autor é plenamente dispensada porque o “punctun saliens” do mérito está todo ele engendrado e situado na esfera documental, mesmo porque, se trata de uma reportagem publicada na revista da ré e, como tal, serão os documentos que darão o sentido e o caminho para o exame da verdade.

No fundo, é importante, também, se dizer que o autor, pretendendo produzir prova testemunhal quer fazer uma espécie de “defesa pessoal” de seus predicados morais e profissionais, quando isto não é matéria em jogo no mérito desta ação. Nesta ação o que se debate é a procedência e a finalidade de uma reportagem estampada pela revista veja, que, por isto mesmo, já predefine a metodologia e o tipo de provas a serem produzidas e que, aqui, se cingem à produção probatória de um lado e de outro, de caráter documental.

O convencimento do Juiz a respeito do mérito é quem dita a necessidade do tipo de prova a ele dirigida. Quando o juiz dispensa algum tipo de prova, não está cerceando o direito da parte à demonstração de sua verdade, mas tão somente adequa a natureza do mérito ao tipo de prova a ele pertinente. Daí porque, neste caso, a produção de prova testemunhal seria no mínimo ociosa e absolutamente inócua.

O autor da ação postula ser indenizado pela ré em razão do dano moral que ela, Editora Abril S/A, ter-lhe-ía causado, segundo ele, dano à sua pessoa e imagem, como afirma a certa altura da inicial: “..os abusos relatados feriram a imagem social do autor, sua reputação, sua dignidade e o seu decoro, constituindo atos ilícitos...”

A ré se defende e diz que “o autor se viu diretamente envolvido em alguns escândalos atuais (...) ocorre que, dentre os acusados como líderes desta quadrilha, estavam, justamente, pessoas diretamente ligadas à Força Sindical e ao próprio autor, como é o caso, principalmente, do advogado Ricardo Tosto, conselheiro administrativo do BNDS, como representante da Força Sindical indicado pelo próprio autor (...)” ( fls.220, item 14 da contestação)

Com efeito, o autor entende que a ré promoveu “campanha difamante e desmoralizante” contra sua pessoa na matéria de capa da revista VEJA na edição 2061, de 21 de maio de 2008, com o título”O lado escuro da força”.

Estes são os fatos.

Com este panorama, vai-se, agora, ao cerne do mérito:

O DANO MORAL.

Maria Celina Bodin de Moraes conceitua muito bem o dano moral, em seu livro “DANOS À PESSOA HUMANA” (uma leitura civil-constitucional dos danos morais)

Diz ela:

“O dano moral tem como causa a injusta violação a uma situação jurídica subjetiva extrapatrimonial , protegida pelo ordenamento jurídico através da cláusula geral de tutela da personalidade que foi instituída e tem sua fonte na Constituição Federal, em particular e diretamente decorrente do princípio (fundante) da dignidade da pessoa humana (também identificado com o princípio geral de respeito à dignidade humana). Dois termos ou palavras que integram a definição acima se destacam como seu núcleo, por assim dizer, porque guardam em si a chave mestra de todo o universo jurídico da matéria atinente ao dano moral, a saber: “injusta violação”.

Sim. Jamais se verá um episódio de dano moral sem a visibilidade daqueles dois termos. O dano moral nasce e se instala quando uma pessoa é atingida, é agredida pelo gesto ou palavras de outra pessoa que age assim, tem uma conduta que viola a pessoa vítima “por dentro”, na sua personalidade, conduta esta que é injusta. Eu diria “mentirosa” em relação ao histórico de vida desta pessoa, tanto pelo que ela é e pelo que ela faz no âmbito social.

Logo, a agressão precisa ser injusta, ou seja, ser inverídica, mentirosa. Constituir um desrespeito ou uma afronta aos predicados pessoais, valores próprios da pessoa humana.

Pois bem. Resta ver se o caso em comento apresenta esta feição: se a ré, com sua matéria agiu da forma descrita acima com o autor.

A resposta é negativa. A ré não foi injusta com o autor. Em sua contestação, a partir de fls. 219 até 225, nº30, apresenta “FATOS JORNALÍSTICOS RELACIONADOS AO AUTOR”. Os fatos narrados em todos aqueles tópicos são rigorosamente verdadeiros. A ré os apresenta e aponta as suas fontes ou em que setor da mídia foram divulgados.

O autor, por sua vez, não refutou e muito menos trouxe documentos ou outras provas que desmontassem, pedra por pedra, o edifício dos episódios mostrados pela ré, através da sua matéria.

“As reportagens causaram inegável repercussão na sociedade”, afirma o autor, na inicial, a certa altura. Todavia o autor não exibe o contra fato de nenhum ponto, mínimo que seja, da reportagem da ré. Ao contrário. Estende-se em falar acerca da liberdade de imprensa e de fazer sua defesa pessoal, por sinal, fora de lugar, porquanto deveria ter mostrado em que consistiu o dano moral que diz ter sofrido e assim mostrado os efeitos deletérios que causou em sua vida pessoal, social e política. Mas nada disto se vê nos autos, apenas, como se disse logo acima, críticas à imprensa e uma deslocada defesa pessoal.

Na Inicial ( fls.7) o autor afirma que a ré “manipulou a verdade” apresentando seu rosto “deformado” e mais outras ponderações. Ora, a reportagem se intitula “O lado ESCURO da força”. Deveria saber o autor que a linguagem jornalística trabalha com recursos próprios, com um conjunto de técnicas próprias, recursos estes criados com a finalidade de chamar a atenção do público para a matéria, para a “manchete” como se dizia, o que é muito natural nos meios de comunicação, natural e legítimo, porque os meios de comunicação dão destaques maiores ou menores às reportagens que entendem serem mais contundentes, mais graves, mais importantes para o público. Com isto não deformam a verdade, mas a cercam de aparatos para chamar a atenção do público e despertar o seu interesse em se informar.

Seria como fazer um desfile destacando as figuras principais sem atingi-las com o menor gesto de desrespeito. A imprensa tem a obrigação de informar o público.

Mais ainda, de revelar o que ele não sabe, pois em matéria de política, tudo o que é público deve ser de domínio público, sem reservas ou censuras. O autor é um homem público; lida com dinheiro público, representa um certo público, mas, atua e lida com causas públicas, que envolvem, de novo, dinheiro público e por isto tem a obrigação permanente de prestar contas e velar para que nenhuma suspeita paire sobre a sua atividade e sua conduta e que ela não tenha nenhuma faceta obscura.

A fls.221, a ré apresenta mais e maiores referências expressas ao autor em outros periódicos da imprensa.

Mais adiante, a fls.227/229, nos itens 36/47, até reproduz com fidelidade histórica e jornalística os fatos envolvendo o autor, especialmente nos itens 48/59.

Os documentos juntados pelo autor com a sua Inicial são meramente informativos e não desfazem nenhuma das afirmações feitas pela revista VEJA na aludida matéria.

Além disso, a revista da ré, como veículo de imprensa, não escreve suas matérias em tom de panegírico ou de conto de fadas. Sua linguagem, como já disse, é linguagem jornalística, com técnica e recursos próprios, com vistas à divulgação, com chamadas de atenção do público e não uma oratória acadêmica ou religiosa ou mesmo um recital poético. Neste contexto, o mérito desta ação se revela centralizado no binômio dano e mentira o que equivale a dano moral provocado por injusta violação ou lesão à pessoa do autor em sua tríplice epifania: a pessoal, a social e a profissional.

O sábio artigo de Luiz Roberto Barroso, Liberdade de Expressão versus Direitos da Personalidade, publicado em LEITURAS COMPLEMENTARES DE DIREITO CIVIL da Editora Podium-2007, permanece atualíssimo e inspirador. A certa altura, diz o articulista:

“...Se de um lado, portanto, as liberdades de informação e expressão manifestam um caráter individual, e neste sentido funcionam como meios para o desenvolvimento da personalidade, essas mesmas liberdades atendem ao inegável interesse público da livre circulação de idéias, corolário e base de funcionamento do regime democrático, tendo portanto uma dimensão eminentemente coletiva, sobretudo quando se esteja diante de um meio de comunicação social ou de massa. A divulgação de fatos relacionados com a atuação do poder público, ganha ainda importância especial em um regime republicano no qual os agentes públicos praticam atos em nome do povo e a ele devem satisfações. A publicidade dos atos dos agentes públicos, que atuam por delegação do povo, é a única forma de controlá-los.”

A pura verdade.

Os meios de comunicação, todos e entre eles a imprensa, não podem ser amordaçados sob nenhum pretexto e muito menos por meio do Poder Judiciário, sob o sedutor e reluzente brilho de ouropel do sofisma de abuso e desrespeito à pessoa de alguém.

Evidente que os meios de comunicação devem praticar a verdade e a ética porque não têm permissão para enxovalhar a imagem de nenhum cidadão. Mas tudo isto não significa ser tíbio e medroso na arte e missão de informar. Especialmente quando se trata dos atos dos agentes públicos como foi dito acima. Então, os meios de comunicação são mesmo, eficaz forma de controlá-los e exigir deles ética e respeito ao povo.

No presente caso, foi o que aconteceu.

O autor deve esclarecimentos ao povo porque é agente público.

O autor não provou a mentira da matéria da reportagem e nem o dano que dela teria advindo. Apenas critica a reportagem alegando, e só isto, que foi acintosa e desrespeitosa. Sendo assim, sem a prova conclusiva do liame causal entre a conduta da ré através da sua revista VEJA e a conseqüente lesão ao autor não há dano porque não está provada a injusta violação.

A injusta violação não atingiu, também, um direito do autor, como ele mesmo fala que, em alguns casos, o dano moral se sintetiza na violação de um direito.

Não é verdade isto. Não há nos autos o menor sintoma ou a mais desapercebida prova de violação de um direito do autor. Sequer um ceitil de violação, que a provocar efeitos lesivos, quer um mero desrespeito a direito seu, qualquer que seja.

Portanto, não se vê o chamado “propósito sensacionalista” que enxerga o autor na Inicial. Aliás, a revista VEJA, segundo notória sabença, conhecimento público, não é periódico que se alimenta de sensacionalismo ou faz dele seu motor de vendas. É revista que está em circulação há muito tempo e tem um público expressivo na sociedade brasileira. Isto é do conhecimento de todos.

Diante do exposto, e tendo tudo o mais considerado, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação.

Condeno o autor no pagamento das custas processuais e nos honorários ao advogado da requerida que fixo em 20% sobre o valor atribuído à causa.

P.R.I. e C.

São Paulo, 28 de maio de 2010.

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