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A divisão de riscos extraordinários nas PPPs

A Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs) - Lei 11.079/04 - trouxe como uma de suas grandes novidades o compartilhamento dos riscos entre os parceiros público e privado.

2/2/2005

A divisão de riscos extraordinários nas PPPs


Fernando S. Marcato*

Paulo Henrique Spirandeli Dantas*


A Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs) - Lei 11.079/04 - trouxe como uma de suas grandes novidades o compartilhamento dos riscos entre os parceiros público e privado. Porém, os particulares que desejarem firmar parcerias com o Poder Público devem tomar alguns cuidados, pois a repartição equivocada dos riscos pode, no futuro, inviabilizar o projeto.

O principal problema é definir quais riscos são esses e de que maneira tal repartição será feita. Essa preocupação já foi demonstrada, inclusive, pela Comissão Européia, que, em março de 2003, publicou importante trabalho denominado “Diretrizes para parcerias público-privadas bem sucedidas”1. A mesma preocupação deve ser compartilhada no modelo de PPP brasileiro.

Na Lei das PPPs os artigos que tratam da divisão de riscos entre os parceiros são o artigo 4º, inciso VI2 e o artigo 5º, inciso III. Este último determina que os contratos de parcerias público-privadas devem prever cláusulas que estabeleçam: “a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária”.

Para que se possa compreender e interpretar corretamente tal dispositivo é preciso, em primeiro lugar, analisar os riscos existentes em uma PPP. Para o presente artigo, optamos por dividí-los em dois tipos, quais sejam: (i) os operacionais; e (ii) os extraordinários.

Por riscos operacionais pode-se entender todos aqueles inerentes ao projeto a ser executado. Riscos com a implementação do projeto básico, entrega da obra, formas de pagamento, inadimplência dos usuários, entre outros3.

Por outro lado, os riscos extraordinários são aqueles cujos efeitos e conseqüências dificilmente podem ser previstos e que, quando ocorrem, encarecem a obra ou operação de tal forma que podem torná-la economicamente inviável. Esses riscos decorrem de diversas situações, tais como catástrofes naturais ou alterações econômicas drásticas, aí entendidas, por exemplo, a maxi-desvalorização da moeda nacional ou a imposição de barreiras alfandegárias à importação de insumos. Normalmente, esses eventos são classificados pela lei como caso fortuito, força maior, fato do príncipe e área econômica extraordinária.

Nas concessões comuns regidas pela Lei 8.987/95, os riscos operacionais são de responsabilidade do particular concessionário, uma vez que cabe a ele a administração do projeto. Já os riscos extraordinários são gerenciados pelo Poder Público por meio da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das contratações públicas. Esse mecanismo assegura que as condições econômicas e financeiras sobre as quais as partes se basearam para firmar o contrato serão mantidas até a sua expiração.

A manutenção desse equilíbrio não é uma mera garantia ao particular, mas também uma maneira de assegurar o interesse público. Se o particular tivesse que arcar com o ônus de um evento imprevisível ou de alterações unilaterais dos contratos por parte da Administração, poderia ter que suspender os serviços ou obras públicas por falta de condições financeiras e econômicas de continuá-las. A outra alternativa seria contratar seguros que cobrissem eventos de conseqüências incalculáveis, encarecendo enormemente a obra. É evidente que a interrupção de uma obra ou o aumento de seu preço são contrários aos interesses e aos cofres públicos.

Na Lei das PPPs, porém, a aplicação do conceito de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro não está clara. Como o artigo 5º, inciso III, determinou que tanto os riscos extraordinários, quanto os operacionais devem ser repartidos, o parceiro privado ao ingressar em uma PPP, em tese, não terá condições de mensurar completamente as contingências caso tenha que concorrer nos riscos extraordinários.

Assim, se não houver um mecanismo regulamentar ou contratual que permita a previsão e, eventualmente, limitação de riscos extraordinários, o parceiro particular pode ser obrigado a incluir em sua proposta custos elevados com seguro e garantias, encarecendo demasiadamente a obra. Caso contrário é grande a possibilidade de interrupção do projeto por incapacidade econômica e financeira do particular4.

Portanto, o Poder Público, por meio de regulamentos, ou os próprios parceiros, quando da negociação dos contratos de PPP, devem definir com clareza e na proporção das respectivas capacidades, tanto os riscos operacionais quanto os riscos extraordinários que pretendem assumir. É conveniente que os riscos extraordinários, quando suportados também pelo particular, sejam limitados, evitando, assim, ônus excessivos que possam obrigá-lo a suspender suas atividades, o que iria contrariar, em última análise, o próprio interesse público.
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1Naquele estudo a Comissão Européia concluiu que: “Há controvérsias sobre qual volume de riscos deveria ser transferido do setor público para o privado. De forma geral, quanto mais riscos forem transferidos para o parceiro do setor privado, maior será a recompensa financeira que ele demandará. Os riscos devem ser alocados à parte mais capacitada a assumi-los da forma mais econômica possível.” (https://europa.eu.int/comm/regional_policy/sources/docgener/guides/PPPguide.htm, pág. 86)
2Art. 4º Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes: (...) VI – repartição objetiva de riscos entre as partes.
3Por exemplo, em uma concessão de rodovias, a simples diminuição do fluxo de carros que utilizam a rodovia, em princípio, é um risco operacional inerente ao negócio.
4A título de conhecimento, vale notar que no intuito de evitar os riscos de interrupção da parceria a legislação portuguesa (Decreto-Lei nº 86/2003), por exemplo, reconhece que os riscos extraordinários não devem ser arcados pelo particular: “Art. 7º A partilha de riscos entre as entidades públicas e privadas deve estar claramente identificada contratualmente e obedece aos seguintes princípios: (...) d) O risco de insustentabilidade financeira da parceria, por causa não imputável a incumprimento ou modificação unilateral do contrato pelo parceiro público, ou a situação de força maior, deve ser, tanto quanto possível, transferido para o parceiro privado.
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Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2005. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS










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