A expulsão dos doentes pelos planos de saúde
Arthur Rollo*
O último expediente lamentável que vimos, por parte dos planos de saúde, consiste na expulsão do segurado doente, beneficiário de plano coletivo.
Muitos vêm optando por contratos coletivos, firmados entre a operadora e uma pessoa jurídica intermediária, que pode ser associação de classe, sindicato, empregador, etc, encarregada de estabelecer a relação direta com o consumidor, pelo menor preço que geralmente é cobrado e também porque as operadoras não estão mais oferecendo no mercado planos individuais.
O consumidor está desprotegido nesses contratos coletivos por uma série de razões. As duas principais, a nosso ver, são a possibilidade de rescisão unilateral do contrato coletivo pelas operadoras, bem como a aplicação de reajustes de sinistralidade, que visam recompor as perdas decorrentes da maior utilização do plano pelos seus beneficiários. Nos contratos individuais, firmados diretamente entre o consumidor e as operadoras, não pode haver a rescisão unilateral nem tampouco o reajuste de sinistralidade.
A lei 9.656/98 (clique aqui) e os contratos coletivos, firmados entre empresas e as operadoras, permitem a rescisão unilateral dos contratos. Ocorre que, em muitos casos, o consumidor está doente e terá que interromper o tratamento iniciado.
A lei deve ser interpretada no seu objetivo e não de forma literal, já que norteiam a compreensão de qualquer contrato princípios que se sobrepõem às próprias normas e à vontade das partes, como o da função social do contrato e da empresa e da boa-fé.
Quem tem plano de saúde tem a expectativa legítima de usá-lo em caso de doença. Paga durante a saúde para o caso de uma eventualidade. Justamente por isso, é inaceitável que as operadoras rescindam os contratos com as pessoas jurídicas intermediárias, prejudicando os doentes a estas vinculados. Quem tem a doença diagnosticada no curso de um contrato de plano de saúde, ainda que coletivo, tem o direito de concluir o tratamento nas mesmas condições iniciadas e as operadoras estão obrigadas a aceitar isso, porque a doença integra o risco da sua atividade.
Se a empresa lucrou durante a saúde do consumidor, deve ter a altivez de suportar os ônus da sua doença. O que se espera de uma empresa que lida com a saúde das pessoas é que tenha a sensibilidade de preservar os contratos de pessoas sob tratamento, sobrepondo a preservação da saúde do próximo aos seus próprios interesses econômicos.
Assim como as operadoras têm o direito de ressalvar em contrato as doenças preexistentes, os consumidores têm direito à cobertura das doenças diagnosticadas no curso do contrato.
Nesse sentido existem inúmeros precedentes judiciais, afirmando que: "Diante dos conflitos de valores (autonomia da vontade dos contratantes e interpretação literal da lei versus a saúde e a vida da paciente) impõe-se a mitigação da norma que permite a rescisão unilateral do contrato.", dentre os quais o julgamento pelo TJ/SP da Apelação Cível n° 209.046-4/8, de 28/4/09, Relator Antonio Vilenilson.
Os consumidores doentes, expulsos pelos planos de saúde de contratos coletivos no curso do tratamento, têm direito à manutenção do contrato, sobrepondo-se o direito básico do consumidor à saúde, à autonomia contratual.
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*Advogado e professor da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo
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