A dieta de fachada do Leão
O mais impressionante é que a voracidade do Fisco não se contenta com a sangria do IR nos ganhos dos contribuintes. As mexidas recentes no PIS/Cofins geraram um ganho adicional de R$ 55 bilhões, não previstos, para os cofres federais. O valor é mais do que suficiente para ensejar uma revisão profunda da estrutura de tributos do país, de forma a desonerar a produção e incentivar a oferta de empregos.
Repetida como um mantra, existe uma expressão consagrada pelo uso para expressar essa mudança urgente: reforma tributária. No entanto, o apetite insaciável do fisco faz com que, sob o argumento da reforma tributária, avie-se - sempre no finalzinho do ano - aumento de impostos para os contribuintes. É só abrir o Diário Oficial dos dias 30 e 31 de dezembro de 2004: está lá mais de uma dezena de leis e normas visando aumentar a tributação dos contribuintes brasileiros. A reforma nunca se dá para cortar despesas do Estado.
A atualização monetária da tabela de descontos é indispensável e urgente. Sem a correção, quaisquer aumentos salariais ou de renda, mesmo que inferiores à inflação acumulada no período, resultam em elevação da carga. O que é uma forma disfarçada de fazer os contribuintes pagarem mais impostos, sem que o governo passe pelo desgaste de uma discussão no Congresso, nem pelo risco de uma derrota movida pela revolta crescente da opinião pública contra a verdadeira derrama que elevou a carga tributária no país para 40% do Produto Interno Bruto (PIB).
Tão grave quando a elevada carga tributária brasileira, portanto, é o fato de a maior parte de sua estrutura ser regressiva, ignorando as diferenças de renda. A concentração nos tributos indiretos, cobrados no consumo e na produção independentemente da faixa de renda de quem exerça a transação, desestimula investimentos e prejudica as exportações.
Igualmente preocupante, diante deste quadro, é o fato de autoridades da influência e do peso do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, minimizarem de público a gravidade do problema. Ao dizer que o imposto no Brasil não é alto nem é injusto, o ministro mostra um erro de diagnóstico capaz de causar sobressaltos em quem, como os cidadãos do país, somos pacientes de suas receitas.
Tem o mérito, talvez involuntário, de alertar para a dimensão do desafio que se impõe aos contribuintes, sejam empresas ou pessoas físicas, na tentativa de impor limites à gula pantagruélica do Fisco. Os homens encarregados de domar o Leão não sabem ou não querem ver que seu apetite fugiu do controle. Daí tomam migalhas como a correção da tabela como banquetes para terceiros, e atiram-se desesperados contra as tentativas judiciais de restituir os direitos constitucionais dos contribuintes. O caso do crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), em que duas centenas de sentenças judiciais de primeira instância e sucessivas manifestações das cortes superiores não inibiram o uso desavergonhado de expedientes protelatórios pela União, ilustra bem este fato.
Prevendo que o Poder Judiciário irá julgar o caso em favor dos contribuintes, o Fisco - no apagar das luzes de 2004 - editou a Lei n. 11.051, de 31.12.2004, onde pretende vedar o ressarcimento desse incentivo pela via da compensação. Desse modo o Governo nunca perde, pois mesmo após longos anos de disputas, quando o contribuinte ganha a causa, não recebe o valor que lhe é devido. Só a reafirmação soberana da independência do Judiciário, despertada por ações bem fundamentadas de um número crescente de companhias, será capaz de deter a voracidade do Fisco.
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*Advogado do escritório Caregnato Advogados
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