Fazenda do Estado de São Paulo avança na questão do crédito acumulado de ICMS, mas restrições persistem
Renato Henrique Caumo*
William Roberto Crestani*
Fruto da Lei Kandir (LC 87/96 - clique aqui) editada nos anos 90 com o intuito, entre outros, de desonerar do ICMS os produtos e serviços destinados à exportação, tal crédito acumulado tem se sujeitado ao longo dos anos a inúmeras restrições impostas pelos governos estaduais na sua apropriação e fruição, sobretudo em vista do componente político que envolve a questão, causado pela perda de arrecadação que seria compensada pela União Federal.
É nesse ambiente que a Fazenda do Estado de São Paulo recentemente criou uma alternativa à favor dos contribuintes que visa mitigar o problema, mas que sob uma análise mais cuidadosa ajuda a revelar, como veremos, que o caminho até os créditos continua tortuoso.
Conforme a mencionada portaria, a Fazenda paulista poderá conceder um regime especial que permita ao contribuinte a apropriação, a título precário, de até 50% do valor do crédito acumulado de ICMS resultante da ocorrência de operação de exportação direta a que teria direito, após a verificação da sua legitimidade pelas autoridades fiscais.
A vantagem é que, como tal apropriação se dará a título precário, ela ocorrerá antes da homologação do chamado Demonstrativo de Crédito Acumulado - DCA, que é o documento que atesta que o crédito foi periciado e autorizado pela Fazenda Estadual, e cujo prazo de expedição tem sido um dos maiores obstáculos para a sua efetiva fruição.
O problema ressurge, porém, quando examinamos as limitações e condições para a utilização do regime especial. Logo de início, a portaria limita o valor da autorização ao menor saldo credor apurado desde o mês da geração até o da apropriação e deixa claro que tal valor não pode superar o equivalente a 80.000 UFESPs (R$ 1.268.000,00 em 2009).
Além disso, o crédito apropriado a título precário não poderá ser utilizado para a liquidação de débito fiscal, e a concessão do regime especial está condicionada a uma série de requisitos, entre eles os seguintes:
(i) o contribuinte não pode possuir auto de infração pendente de liquidação e deve estar em dia com suas obrigações principais e acessórias;
(ii) todos os estabelecimentos paulistas do contribuinte devem ser usuários de sistema eletrônico de controle fiscal; e
(iii) não pode haver o aproveitamento de crédito de ICMS, no período relativo ao pedido de apropriação, com base em incentivos fiscais concedidos pelo Estado de origem da mercadoria sem autorização do CONFAZ.
Ou seja, a iniciativa da Fazenda Estadual, embora positiva, já nasce com a maior parte das restrições que são experimentadas atualmente para a obtenção da autorização definitiva para a apropriação do crédito acumulado.
No entanto, não deve o contribuinte se sentir acuado diante das restrições às quais é obrigado a se sujeitar, cuja legalidade e constitucionalidade são questionáveis.
Basta relembrarmos que a CF (clique aqui) é clara no sentido de que as operações de exportação são imunes ao ICMS (artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea 'a') e que a LC 87/96 garante o aproveitamento do crédito acumulado nessa hipótese (artigo 25, parágrafo 1º).
Destaque-se, ainda, que especificamente no caso do crédito acumulado gerado por operações de exportação, a lei complementar não dá ao legislador ou às autoridades estaduais a possibilidade de imposição de quaisquer restrições, cabendo às autoridades fiscais tão somente fiscalizar e reconhecer (por mero ato formal) a efetiva realização das exportações que originaram o crédito, de modo a coibir fraudes.
Lembramos, por fim, que já existem decisões judiciais que consideram ilegal a adoção de políticas de restrição a apropriação, aproveitamento e transferência do crédito acumulado de ICMS, razão pela qual deve o contribuinte ficar atento à possibilidade de questionar judicialmente, com bons argumentos, eventuais limitações que possa estar sofrendo em relação ao crédito acumulado de ICMS na exportação a que tenha direito.
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*Associados da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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