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O petróleo ainda é nosso

Às vésperas da Sexta Rodada de Licitação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), realizada em agosto, o governador do Paraná propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) pela qual pretende ver declarados inconstitucionais diversos dispositivos da Lei n° 9.478/97, a Lei do Petróleo, em vigor há sete anos.

18/11/2004

O petróleo ainda é nosso


Luiz Antonio Maia Espínola de Lemos

Luis Antonio Menezes da Silva*

Às vésperas da Sexta Rodada de Licitação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), realizada em agosto, o governador do Paraná propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) pela qual pretende ver declarados inconstitucionais diversos dispositivos da Lei n° 9.478/97, a Lei do Petróleo, em vigor há sete anos.

O governador do Paraná sustenta que a Lei do Petróleo fere o princípio constitucional da soberania da União e da garantia do desenvolvimento nacional. De acordo com a ação, a lei encoraja a exportação sem levar em conta a demanda interna da produção. Também é alegada na ação direta de inconstitucionalidade que as áreas de exploração são parte do patrimônio público não renovável, e seriam entregues às multinacionais, deixando o país correr o risco de ficar sem reservas de petróleo.

Certamente, essa não foi a vontade dos legisladores quando da criação da Lei do Petróleo, e tampouco é o desejo da nação. Acreditamos que há um equívoco nas alegações da Adin e, para esclarecê-lo, torna-se necessária uma reflexão sobre os estoques estratégicos de combustíveis, uma questão que não é nova para os Estados e para os agentes do setor. O tema ganhou relevância internacional a partir do primeiro choque do petróleo, em 1973. No ano seguinte, foi criada, por um grupo de países integrantes da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a Agência Internacional de Energia (AIE).

A Agência Internacional de Energia definiu como estoque estratégico a reserva mínima equivalente a 90 dias de importações líquidas de petróleo e derivados de cada país-membro que tenham sido verificadas no ano anterior. Ficou também estabelecido que, quando a oferta de petróleo de um determinado país fosse inferior a 7% do valor observado no mesmo período do ano anterior, a reserva estratégica poderia ser gradativamente liberada para consumo interno daquele país.

A responsabilidade sobre a reserva estratégica, inicialmente, recaía integralmente sobre as empresas de petróleo. Posteriormente, com o objetivo de se ampliar o controle sobre as reservas em momentos de contingências, verificou-se a entrada dos Estados, através da constituição de estoques próprios ou em sociedade com as companhias de petróleo.

No Brasil, foi instituído em 1991 o Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis (Sinec), que compreende a reserva estratégica, destinada a assegurar o suprimento de petróleo bruto e de álcool para fins carburantes quando do surgimento de contingências que afetem de forma grave a oferta interna ou externa desses produtos; e os estoques de operação, destinados a garantir a normalidade do abastecimento interno de combustíveis derivados de petróleo, bem assim de álcool etílico, anidro e hidratado e outros combustíveis líquidos carburantes, em face de ocorrências que ocasionarem interrupção nos fluxos de suprimento e escoamento dos referidos combustíveis. Os produtos destinados à reserva estratégica serão adquiridos e mantidos pela União e utilizados mediante prévia autorização do presidente da República.

A Emenda Constitucional nº 9, do ano de 1995, passou a permitir que as atividades da indústria do petróleo, até então desenvolvidas com exclusividade pela Petrobras, pudessem ser realizadas por empresas estatais e privadas. Foi instituída a Agência Nacional do Petróleo, que tem, entre outras, a atribuição de assegurar o adequado funcionamento do Sinec e, com isso, atender às necessidades de consumo interno de petróleo, seus derivados e gás natural.

À ANP cabe a regulação, contratação e fiscalização das atividades integrantes da indústria do petróleo, especificamente no que tange à exploração e produção de áreas, e aos procedimentos licitatórios promovidos pela agência. A ANP deverá sempre estabelecer a relação ideal entre as reservas e a produção de petróleo e gás natural, para que, assim, possa dimensionar e priorizar a oferta de áreas de exploração.

É assim que, com a finalidade de preservar o interesse nacional e, desse modo, assegurar a normalidade do abastecimento de petróleo e seus combustíveis derivados em todo o território brasileiro, a ANP, em todos os contratos de concessão - inclusive os da sexta rodada de licitação - , fez prever que, em caso de emergência nacional, declarada pelo presidente da República, se houver a necessidade de limitar exportações de petróleo ou gás natural, poderá determinar que o concessionário atenda, com petróleo e gás natural por ele produzidos, às necessidades do mercado interno ou de composição dos estoques estratégicos do país. Além disso, a Lei do Petróleo autorizou a ANP, ainda em caso de emergência nacional, a determinar que o concessionário limite as exportações.

Como se pode observar, todas as normas que tratam de atividades da indústria do petróleo procuram preservar o interesse nacional e assegurar a normalidade do abastecimento interno.

O poder da ANP para determinar a limitação de exportação não é discricionário, pois depende da declaração de emergência nacional pelo presidente da República e, também, deve se ater à proporção da participação do concessionário na produção nacional de petróleo e gás. Podemos entender como emergência nacional qualquer situação iminente que possa afetar a oferta interna ou externa de petróleo, seus derivados e gás natural.

Esperamos que, com esses esclarecimentos, se torne mais evidente o equívoco apontado na Adin quanto à possibilidade de estarmos entregando as nossas jazidas às multinacionais, pois o petróleo continua sendo nosso!
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* Advogados do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados









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