Comitê de Credores e Recuperação Judicial correm perigo
Diferentes motivos afugentam credores das Recuperações Judiciais e Falências comprometendo o êxito das mesmas, fator crítico na atual Crise Mundial
Jorge Queiroz*
Efetivamente a mais novel e importante deliberação do legislador foi a criação da Assembléia Geral de Credores, órgão máximo nos procedimentos concursais, e do Comitê de Credores, sendo que a AGC somente deve ser convocada para assuntos de grande relevância em razão dos elevados custos na realização da mesma. Sem duvida, as mais poderosas faculdades conferidas ao universo de credores, anteriormente restritas ao Juízo.
Dentre os novos dispositivos introduzidos pelo novo diploma falimentar, observamos que o Comitê de Credores tem lamentavelmente sido muito pouco utilizado a despeito de tratar-se de órgão imprescindível para o sucesso dos processos de recuperação e de falências. Fato alarmante pelas razões que passaremos a expor.
A título de exemplo podemos citar dois casos conhecidos, sendo o primeiro de irrefutável sucesso e o segundo de um imenso fracasso.
O primeiro trata da vultosa e intrincada falência do Banco Santos onde a AGC deliberou pela formação de um Comitê de Credores profissionalizado, fato que provou ser determinante para o histórico índice de recuperação de ativos superior a 20%, alcançando até o momento cerca de R$ 550 milhões, com rateio inicial já aprovado pelo Juízo.
De forma diametralmente oposta, temos o malfadado caso Varig, onde, entre outras questões, a não criação tempestiva do Comitê de Credores gerou um grande desequilíbrio nas funções dos órgãos envolvidos, impondo pesado ônus ao Juízo e ao administrador judicial sobrecarregando-os com atividades não inerentes aos seus ofícios, além de altamente complexos para seus limites e capacidades. Os resultados foram os piores possíveis.
Com efeito, é cediço que apenas o Comitê de Credores têm real legitimidade para proporcionar soluções ágeis perante a comunhão de credores para o sucesso da recuperação ou falência e conseqüente recuperação de seus créditos, assim como suscitar questionamentos relacionados aos atos de administração de Massa Falida consoante a eficiência idealizada pelo legislador, alinhando suas iniciativas a uma eficácia econômica pautada pela agilidade e maximização dos ganhos em cada situação, seja para a massa ou para os participantes de uma recuperação.
Só o Comitê de Credores dá a transparência, segurança, confiança, eficiência e celeridade desejada pelos credores. Sem a figura do Comitê, o sucesso da recuperação ou falência torna-se remoto. Além disso, os credores acabam, isoladamente, levando seus questionamentos ao juízo, apenas tumultuando e atrasando seu processamento, pois geram discussões infindáveis através de petições acostadas aos autos, vez que não representam a vontade da maioria dos credores.
É fato inconteste que 'a vaca só engorda com o olho do dono' e que nenhum órgão, por mais competente que seja, pode substituir a força, determinação e legitimidade que só os credores detém coletivamente via Comitê.
Onde está então a origem, a essência, que causa a inibição dos credores em participar ativamente dos processos recuperatórios e falimentares através do Comitê de Credores e que deve ser sanada para permitir que o espírito do disposto na lei falimentar seja alcançado?
Nosso acompanhamento e análise realizados desde a entrada em vigor do novo diploma falimentar levaram-nos a identificar a origem dessa gravíssima disfunção sistêmica:
(i) falta de credibilidade e confiança do devedor em razão de atos praticados pré-pedido de recuperação;
(ii) tarde demais - devedor já tecnicamente falido no ato do pedido de recuperação;
(iii) insegurança jurídico-financeira – as intrincadas nuances ainda existentes na lei, controvérsias e conflitos de competência que ocorrem pós-pedido e até mesmo irregularidades jurídicas, administrativas e financeiras praticadas pelo devedor pré-pedido de homologação pelo Juízo, tais como falta de transparência, balanços maquiados, fraudes, ocultação e desvio de ativos, contribuíram para que os credores ficassem arredios a assumir qualquer risco adicional;
(iv) incidência de planos mal concebidos;
(v) observância de processos não conduzidos por experientes especialistas em gestão de crises e recuperação de empresas;
(vi) morosidade do processo recuperatório e falimentar em razão de medidas protelatórias tomadas por diferentes partes interessadas assim como a necessidade de atendimento às disposições impostas pelo CPC (clique aqui);
(vii) regulamentação e fiscalização do Banco Central, classificação de risco, convenção da Basiléia, entre outros que impõem restrições a concessão de novos créditos ao devedor;
(viii) deveres fiduciários dos credores junto aos correntistas e detentores de seus títulos;
(ix) receio de que eventuais prejuízos venham a ser indevidamente imputados e arbitrados contra seus membros pelo juízo responsável de forma monocrática;
(x) necessidade de arcar com todos os custos adicionais, inclusive assembleares e de remuneração de seus membros alocados ao Comitê de Credores, contrário ao que ocorre nos EUA e outros países.
E ainda, porém já totalmente fora da esfera de atuação e controle dos órgãos concursais e cíveis, e lamentavelmente, a impunidade e corrupção sistêmicas nacional relacionadas aos crimes empresariais.
Essa analise é corroborada não apenas pelos casos acima, mas muitos outros como, Agrenco, Grupo Arantes, Cory, Petroforte e Vasp, apenas para citar alguns casos concretos.
Urge que essas questões críticas e vitais sejam corrigidas tempestivamente pelos órgãos responsáveis a fim de permitir o efetivo engajamento dos credores através de seu Comitê nos processos recuperatórios e falenciais, vez que as conseqüências econômico-sociais são as mais devastadoras possíveis. Mormente nesse momento em que atravessamos a mais tenebrosa crise mundial da história, no qual a inação pode inviabilizar a recuperação da maioria das empresas, assim como de ativos daquelas em liquidação, em razão da impossibilidade de participação dos credores no processo pelos motivos acima elencados.
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*Especialista em gestão e solução de crises empresariais
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