Migalhas de Peso

Construção de uma ideologia estrutural da auditoria jurídica

Este trajeto em Migalhas não diferirá do escopo dos anteriores, quando à finalidade. A pretensão é dar-lhe novo formato. Terá aprofundamento das idéias marcadas ao longo do percorrer das meditações, das reflexões, das pesquisas, das criticas, das concordâncias, das indiferenças, enfim, do processo intelectivo a que me submeti, escrevendo para um público amplo Afinal, decidi reescrever a advocacia contemporânea no seu ontos, sem receio de ser apodado de cabotino.

11/3/2009


Construção de uma ideologia estrutural da auditoria jurídica

"Quando se diz a verdade, somos a maioria
mesmo se estivermos sozinhos" mesmo porque
"o pensamento não tem fronteiras: onde o coração
o conduz, ele vai".
(Chmouel Yossef Agnon)

I - Paráfrase para uma linguagem nova.

Este trajeto em Migalhas não diferirá do escopo dos anteriores, quando à finalidade. A pretensão é dar-lhe novo formato. Terá aprofundamento das ideias marcadas ao longo do percorrer das meditações, das reflexões, das pesquisas, das criticas, das concordâncias, das indiferenças, enfim, do processo intelectivo a que me submeti, escrevendo para um público amplo. Afinal, decidi reescrever a advocacia contemporânea no seu ontos, sem receio de ser apodado de cabotino.

O propósito está definido. O método usual dos livros da área jurídica é inócuo, quase acético. Proponho um outro. E, em paz comigo, no caminho dela "como fruto da justiça" (Is. 32,17), procuro-a em mim, antes de dar-lhe corpo e expressão verbal.

Confesso que, há anos, dezenas de anos, percebi no exercício da advocacia que a sensação de paz está a residir no amor com que ela é abraçada. Advém do amor a interação. Ocorreu-me. E, com Morris Ernest, o mesmo. Esse incrível advogado norte-americano não se curvou às ideias preconceituosas ou as preconcebidas, quando testemunhou que o amoroso não sente o simples sintoma, quer o aroma, quer vive-lo. Ele o externou. E fe-lo com as forças de verdadeira paixão em "A Love Affair with Law"1.

Deveria eleger: elegi Barthes como modelo e guia pela atualidade, pela dramaticidade "que renuncia aos exemplos e repousa sobre a única ação de uma linguagem primeira (não é metalinguagem). Então substituí na descrição dos discursos amorosos sua simulação e tornei esse discurso a sua pessoa fundamental, que é o eu, de maneira a colocar em cena um enunciado, não uma análise"2. E, sem temer qualquer crítica, alongo Barthes: "É um retrato, se se quiser, que é sugerido; mas esse retrato não é psicológico; é estrutural: na leitura dá lugar à palavra: um lugar em que qualquer um fala de si mesmo amorosamente, face ao outro (o objeto amado), que não fala"3.

Roland Barthes explica como construiu seus "fragmentos de um discurso amoroso", dando-lhe as características antes reproduzidas e, para cada situação, sugerindo figuras (no dis-curso, na linguagem, há figuras, por isso, as palavras não são entendidas no sentido retórico, como diz, "mais no sentido ginástico ou coreográfico"; em suma, representam o amoroso no seu comportamento. Cada figura não é lida por sua definição, mas por seu argumento = exposição, sumário, história inventada). A articulação tem, na retórica, um significado: o que diz o amoroso. E o que importa é conhecer o contexto do que ele empregou, não só as palavras isoladas, não só as frases, mas como usou nos gestos e na verbalização –, porque unicamente as palavras não verbalizam o que o amoroso quis dizer se não dentro de uma formalização sintática. As palavras, em si, não são loucas, diz Barthes, mas a articulação delas, com a gesticulização ou como são enunciadas, podem levar ao que Freud e Lacan cognominam "alucinação verbal".

Às figuras com o que Barthes enunciou e procurei resumir, seguem-lhe a ordem. Explicando: como as figuras surgem na cabeça do amoroso sem nenhuma ordem, cada vez que enunciadas dependem de um acaso (interior ou exterior)4. A ordem, na realidade, é entendida no seu contexto completo, pois "o discurso amoroso não é dialético; ele se movimenta como um calendário perpétuo, uma enciclopédia da cultura afetiva", não verdade: é um "discurso horizontal: nenhuma transcendência, nenhuma saudação, nenhum romance (mas muito de romântico)". Se assim é, ou ocorre, ou sucede com a ordem no dis-curso amoroso, Barthes instaura a história de amor como aventura: "é o tributo que o amoroso deve pagar ao mundo para se reconciliar com ele". Essa história de amor pode ser a história de um amor, uma ou outra segundo o caso se apresente ao leitor, ou ao interessado, ou ao próprio amoroso: é o que percebo, sem maiores elaborações ou perquirições.

Mas, a ordem das figuras nunca pode ser arbitrária, na dependência que se auto-submete na escolha de cada uma que seja adequada ao dis-curso e, por óbvio, seguir a ordem alfabética.

Por fim, Barthes não deixa soltas as figuras dentro da ordem, que propôs, daí cria referências. Por tais, num texto elegante, diz que "para compor este sujeito amoroso, elaborou trechos de origem diversa", desde o citadíssimo Werther de Goethe, passando pelo Banquete de Platão, ao Zen, à psicanálise, a alguns místicos, a Nietzche, aos contos tradicionais alemães, a conversas com amigos ou de ocorrências da sua própria vida.

Encerra sua ordem de ideias, explicando e justificando esse livro que se tornou símbolo de uma época e, para a ciência, um marco definitivo para buscas de outros caminhos da linguagem e da sua expressão: "...se o autor aqui empresta ao sujeito amoroso sua cultura", em troca, o sujeito amoroso passa-lhe a inocência do seu imaginário, indiferente aos bons usos do saber".

Os leitores de Migalhas, com certeza, já anteveem que o trabalho do escriba é uma séria proposta ao cumprimento de certas regras que se estabelecerão, para que o relacionamento com a auditoria jurídica não se limite ao uso e ao gozo do seu exercício, mas se assente na vocação predestinada ou eleita dos que a elegem conscientes dos seus valores transcendentais.

_____________________

1 Morris L. Ernst (188-1976), A Love Affair with the Law, The Macmillan Company, New York, 1968 (1ª edição). Ernest, em 1968 já escreveu solo, desde 1920, doze obras e, com co-autores de renome como J. Posner, Alan Schwartz, David Loth, Alexander Lindey, pare Lorentz e W. Seagle, a partir de 1928, mais treze títulos. Uma vida inteiramente dedicada à advocacia e abriu seu coração para mostrar como aprendeu com seus professores, com seus alunos e com seus clientes. Não se atemorizou em mostrar a relação com os clientes, escrevendo oito páginas para compor "A Bíblia do Advogado". E, quanto à prática, ofereceu propostas, na arte, quanto ao direito e a liberdade de pensamento, a família e o direito, as minorias e o direito, como os grandes problemas que surgem no dia-a-dia. Filho de imigrantes judeus, pai de origem checa, mãe da Alemanha, do Harlem, tornou o lema de Lawrence Groembaum, como disse: "sempre era um verdadeiro crente no direito como a arte para invenção social", na verdade, sua bússola. Por isso nunca pertenceu ao partido Democrata, embora tenha atingido o cume como assessor dos Presidentes Roosevelt e Kennedy. De personalidade controvertida, enquanto defendia princípios liberais, inclusive a liberdade de expressão quando contratado pela editora de James Joyce para defender a publicação do célebre romance Ulisses (1933), atacado por ser pornográfico, de outro lado, mais tarde (1954) aliava-se ao machartismo para apoiar a proibição de comunistas serem funcionários públicos. Entretanto, encerrando a obra comentada, escreveu, com toda emoção: "Como muitas vidas, a minha tem sido cheia de oportunidade e sorte. Tive muitas ofertas de emprego no serviço público governamental e também em empresas mas aceitar qualquer uma delas ou mesmo um posto como juiz eu teria que entender que não poderia mais me devotar a prática da advocacia. Por isso eu não fui sequer tentado a aceitar. Que melhor conclusão qualquer homem pode preferir"p. 174.

2 Roland Barthes (1915-1980), Fragments d'un discours amoureux, Seuil, Paris, 1978. Barthes, crítico e semiólogo francês. Após ter lido e sido influenciado por Marx, Sartre e Camus construiu uma hipótese de um tipo de escrita que possa ultrapassar os signos do estilo, e da literatura para chegar a uma espécie de escritura neutra. Figura significativa na vida literária francesa do século XX esboçou um novo método crítico, onde a psicanálise freudiana tem um grande papel. Praticamente reescreveu Balzac. As suas atuações e reflexões no campo da linguística levaram-no juntamente com Ferdinand Saussure a formular a linguagem estrutural, que foi um grande avanço no pensamento da expressão humana.

3 Fragments..., idem, p.7

4 Fragments..., idem, p.10

___________________



*Advogado e fundador do site Auditoria Jurídica


 

 

 

___________________

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024

O SCR - Sistema de Informações de Crédito e a negativação: Diferenciações fundamentais e repercussões no âmbito judicial

20/11/2024