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Juizados especiais sem recurso

Hélio Beltrão no comando do Ministério da Desburocratização, na década de 80, tentou simplificar a vida do brasileiro, quando revogou leis, decretos e portarias, acabou com filas, com o reconhecimento de firmas em montanhas de documentos; criou os Juizados Especiais de Pequenas Causas, simplificou os serviços das Juntas Comerciais ou quando criou o Estatuto da micro-empresa.

20/11/2008


Juizados especiais sem recurso

Antonio Pessoa Cardoso*

Hélio Beltrão no comando do Ministério da Desburocratização, na década de 80, tentou simplificar a vida do brasileiro, quando revogou leis, decretos e portarias, acabou com filas, com o reconhecimento de firmas em montanhas de documentos; criou os Juizados Especiais de Pequenas Causas, simplificou os serviços das Juntas Comerciais ou quando criou o Estatuto da micro-empresa.

O sistema informal de fazer justiça não contemplava recurso algum das decisões proferidas pelos juízes. Estava assim redigido o parágrafo 2 do art. 38:

"Parágrafo 2 - Em qualquer caso a sentença será irrecorrível".

Nos debates travados, venceu a tese de que a índole do povo brasileiro ainda não estava afeiçoada com o sistema de julgamento em uma só instância; assim, a luta para quebra de um paradigma não obteve êxito. A Lei 7.244, publicada no dia 18/10/1984 (clique aqui), com apenas 59 artigos, não vigorou por muito tempo, porque revogada, pouco tempo depois, pela atual Lei 9.099/95 (clique aqui), que conta com 97 artigos. Promoveram-se alterações substanciais: o sistema recebeu competência também para matéria criminal; o valor da causa subiu de 20 para 40 salários mínimos; exigiu-se advogado nas reclamações superiores a 20 salários mínimos; ampliou-se a competência dos Juizados Especiais Cíveis. No que se refere ao reexame das decisões, enumerou-se, como antes, dois recursos: um chamado de inominado e outro os embargos de declaração.

Os juristas e os operadores do direito tentaram incluir o agravo de instrumento, a ação rescisória, os embargos infringentes, mas as tentativas foram infrutíferas.

A vulgarização do sistema informal não aconteceu em face dos recursos, mas deu-se por outras motivações, a exemplo da enxurrada de causas direcionadas para os Juizados, art. 3º Lei 9.099/95 e legislação esparsa; a exigência de advogado para acompanhar a parte, art. 9º; a fuga ao rito sumaríssimo, porque não instalaram o juízo arbitral, art. 24, nem os juízes leigos, art. 21; porque não se prolata a sentença imediatamente após a instrução, art. 28 ou porque se burocratiza o sistema, com violação expressa ao disposto nos arts. 13, 16, 19 e outros, através de procedimentos incompatíveis com a oralidade, a simplicidade, a informalidade, a economia processual e a celeridade, anunciadas no art. 2º.

O espírito da nova forma de dizer o direito, nos Juizados Especiais, direcionou-se para combater e substituir o papel desempenhado pela Justiça paralela, inoficial, consistente nos justiceiros ou nos esquadrões da morte, plantados nas favelas e entre as camadas mais pobres da população, onde as leis e procedimentos violam o ordenamento jurídico estatal. O sistema revolucionário não surgiu para suprir as mazelas da justiça comum, mas buscou evitar a litigiosidade contida, fundamentalmente entre a camada pobre da sociedade.

O legislador não se cansa de buscar inovações para os Juizados Especiais, através de projetos de leis que tramitam no Congresso Nacional:

O PL n. 3.633/2008, que "desobriga as partes de comparecerem às audiências nos Juizados Especiais, podendo os advogados representá-las";

PL n. 3.668/2008 que permite ao incapaz ajuizar ação no Juizado;

PL n. 145/2007 e 1.491/2007 (clique aqui) que incluem como matérias de competência dos Juizados as ações de natureza fiscal e de interesse da Fazendo Pública, as relativas ao Direito de Família e aumenta o valor das causas para 60 salários mínimos;

PL n. 1.675/2007 (clique aqui), que permite às microempresas propor ações perante os Juizados.

De relevo e para beneficiar o sistema merece aplausos a Proposta n. 4.095/2008 (clique aqui) de autoria do deputado Marco Aurélio Ubiali, PSB/SP, estabelecendo competência dos Juizados Especiais para demandas com valor até 20 salários mínimos, como era na lei original, n. 7.244/84, além de não admitir recursos das decisões dos Juizados.

A vigência por onze anos da lei de 1984 mostrou agilidade nos julgamentos; afinal, quem é vítima, por ter comprado uma geladeira com defeito, quem não recebe atendimento do plano de saúde que se recusa na prestação do serviço, quem tem seu nome negativado, em desacordo com a lei, não pode esperar pela burocracia judicial para receber o que é seu. São reclamações típicas dos Juizados Especiais, problemas do dia-a-dia que não devem nem podem seguir os ritos burocráticos traçados pelo Código de Processo Civil (clique aqui).

Os legisladores, juntamente com os operadores do direito burocratizaram a lei especial, inviabilizando a informalidade da justiça do povo; hoje os Juizados Especiais possuem os mesmos vícios da justiça comum. O acúmulo dos processos nas secretarias, os mutirões mostram a face real da "justiça dos pobres". Os julgadores freqüentemente nem invocam a lei especial, porque preferem o uso do Código de Processo Civil.

A Lei 9.099/95, como a anterior, não admite reexame da sentença homologatória de conciliação, nem do laudo arbitral, art. 41; no sistema não é cobrado custas de preparo, porque se objetiva dificultar o uso do recurso; a lei pune o recorrente com a obrigação de pagar todas as despesas do que foi feito, o processo inicial que é gratuito, e do que se fará, apreciação do recurso, arts. 42 e 54. Além das despesas, o recorrente se obriga a contratar advogado, pois não se admite recurso sem assistência do profissional, art. 41. Nos embargos de declaração, recurso destinado a corrigir eventuais erros, não se exige a participação do advogado, desde que a causa não ultrapasse a 20 salários mínimos.

A aprovação do PL n. 4.095/2008 certamente contribuirá para fortalecer os princípios basilares do sistema informal dos Juizados Especiais, pois como já se dizia, "o pior julgamento é aquele que não acontece".

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*Desembargador do TJ/BA





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