Lei de Estágio
Alessandra Siniscalchi*
(i) A lei trata, em seu art. 10, sobre a jornada da atividade do estagiário, de modo que possa ser compatível com as atividades escolares, ou seja, cumprir a função precípua do estágio que é agregar conhecimento sem interferir no aprendizado acadêmico, razão pela qual instituiu algumas jornadas diferenciadas, como a de 4 horas, para estudantes do ensino fundamental, e 6 a de horas para estudantes do ensino superior;
(ii) Contudo, o § 1º do mesmo artigo determina que:
"§1º O estágio relativo a cursos que alternam teoria e prática, nos períodos em que não estão programadas aulas presenciais, poderá ter jornada de até 40 horas semanais, desde que isso esteja previsto no projeto pedagógico do curso e da instituição de ensino."
O Conselho Nacional de Educação, órgão colegiado integrante do Ministério da Educação, e que tem, dentre suas atribuições, que velar pelo cumprimento da legislação educacional, institui diretrizes curriculares para os cursos de graduação, em resoluções específicas para cada curso.
Nos casos dos cursos de Direito e Administração, por exemplo, o Art. 2º, §1º, inciso V, das respectivas resoluções, estabelece que:
Art.2º (...)
§1º O Projeto Pedagógico do curso, além da clara concepção do curso de graduação (em Direito ou Administração), com suas peculiaridades, seu currículo pleno e sua operacionalização, abrangerá, sem prejuízo de outros, os seguintes elementos estruturais:
(...)
V. modos de integração entre teoria e prática.
Para mim resta claro que, nos cursos de Administração e Direito, por exemplo, há expressa determinação para que haja integração entre teoria e prática, contemplada no projeto pedagógico de cada um. Nestes casos, por exemplo, o estudante não consegue alcançar a graduação se não exercer o estágio prático, de forma que estaria ele enquadrado na exceção do parágrafo primeiro do art. 10 da nova lei. Será?
Parece que a lei fechou os olhos sobre o que dispõe o Conselho Nacional de Educação, quanto à necessidade de exercício prático cumulado com o aprendizado teórico. Preocupou-se, tão-somente e de forma bastante precária, em coibir eventuais abusos, o que, na prática continuará acontecendo.
A despeito das questões legiferantes ou pedagógicas envolvidas, questiono a posição de muitos estagiários que precisam da bolsa-auxílio para arcar com os custos da faculdade, e que podem estar forçados, do dia para a noite, a deixar o estágio e procurar um trabalho do qual possam subsistir. Ou seja, diante da eventual obrigatoriedade de redução da jornada, com a conseqüente redução da bolsa-auxílio, a lei, que procurou "proteger" os interesses dos estagiários, e que objetiva o "desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho", pode acabar ensejando o "não-desenvolvimento" do educando e sua direta inserção (ou lançamento) no mercado de trabalho, em qualquer área de atuação que lhe proporcione recursos, atropelando sua vida acadêmica, seu interesse profissional, sua vocação. Parece que a "cidadania", mais uma vez, restringiu-se ao texto da lei.
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*Advogada Trabalhista da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo
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