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A aplicação de multas pela ANCINE na fiscalização da indústria cinematográfica e videofonográfica

No dia 6 de setembro de 2001, o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, assinou a Medida Provisória n° 2.228-1 (“MP 2.228-1”), que foi publicada no Diário Oficial da União no dia 10 setembro de 2001.

1/9/2004


A aplicação de multas pela ANCINE na fiscalização da indústria cinematográfica e videofonográfica

Marcos Saldanha Proença

Fernanda Souto Pacheco

Guilherme Fonseca Alcure*

No dia 6 de setembro de 2001, o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, assinou a Medida Provisória n° 2.228-1 (“MP 2.228-1”), que foi publicada no Diário Oficial da União no dia 10 setembro de 2001.

A MP 2.228-1 estabeleceu os princípios gerais da Política Nacional do Cinema, criou o Conselho Superior do Cinema e a Agência Nacional do Cinema - ANCINE, instituiu o Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema Nacional - PRODECINE, autorizou a criação de Fundos de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional - FUNCINES e alterou a legislação sobre a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional - CONDECINE.

Dentre as inovações trazidas pela MP 2.228-1 podemos destacar a criação da ANCINE, que é uma autarquia especial vinculada ao Ministério da Cultura, dotada de autonomia administrativa e financeira e que tem por objetivo fomentar, regular e fiscalizar a indústria cinematográfica e videofonográfica.

Com o intuito de alcançar os objetivos acima mencionados, a ANCINE tem como metas: (i) promover a cultura nacional e a língua portuguesa mediante o estímulo ao desenvolvimento da indústria cinematográfica e videofonográfica nacional em sua área de atuação; (ii) aumentar a competitividade da indústria cinematográfica e videofonográfica nacional por meio do fomento à produção, à distribuição e à exibição nos diversos segmentos de mercado; (iii) promover a auto-sustentabilidade da indústria cinematográfica nacional visando o aumento da produção e da exibição das obras cinematográficas brasileiras; (iv) estimular a universalização do acesso às obras cinematográficas e videofonográficas, em especial as nacionais; (v) estimular a capacitação dos recursos humanos e o desenvolvimento tecnológico da indústria cinematográfica e videofonográfica nacional; e (vi) zelar pelo respeito ao direito autoral sobre obras audiovisuais nacionais e estrangeiras; dentre outras.

Entretanto, até a edição do Decreto n.° 5.054, no dia 23 de abril de 2004 (“Decreto 5.054/04”), pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, uma das principais competências da ANCINE ainda não tinha sido regulamentada, qual seja, a aplicação de multas e sanções.

Apesar de a maioria das infrações descritas no Decreto 5.054/04 já encontrar previsão na MP 2.228-1, foi somente através desse Decreto que a ANCINE passou a dotar de mecanismos eficazes para fiscalizar a indústria cinematográfica e videofonográfica. Isto porque, o Decreto 5.054/04 regulou a aplicação de multas pela ANCINE que podem variar de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), no caso de descumprimento das obrigações previstas na MP 2.228-1 e no Decreto 5.054/04.

Nos termos do Decreto 5.054/04, a ação fiscalizadora da ANCINE busca acompanhar, controlar e orientar os empresários individuais e sociedades empresariais da indústria cinematográfica e videofonográfica e demais atividades a elas vinculadas.

De forma a realizar um controle mais efetivo da indústria cinematográfica e videofonográfica, a ANCINE contará com o Sistema de Informações e Monitoramento da Indústria Cinematográfica e Videofonográfica - SIM, que será de responsabilidade da própria ANCINE.

O SIM concentrará todas as informações referentes à produção, exibição, distribuição, veiculação e comercialização de obras cinematográficas e videofonográficas brasileiras e estrangeiras, em todos os segmentos de mercado. Tais informações deverão ser obrigatoriamente fornecidas pelas empresas das indústrias cinematográficas e videofonográficas.

Com a finalidade de desempenhar suas funções, a ANCINE poderá requisitar servidores de órgãos e entidades integrantes da administração pública direta, autárquica e fundacional, para auxiliá-la, bem como poderá contratar especialistas para a execução de trabalhos nas áreas técnica, administrativa, econômica e jurídica.

A ANCINE, direta ou indiretamente, poderá realizar a fiscalização de diversas formas: in loco, por amostragem, por denúncia, por meio de acompanhamento e controle das informações fornecidas pelo SIM ou ainda por outras formas definidas em regulamento.

As infrações constatadas pela ANCINE serão apuradas em procedimento administrativo, que deverá conter os elementos suficientes para determinar a natureza da infração e a individualização da penalidade, assegurado o direito à ampla defesa e ao contraditório.

De acordo com o Decreto 5.054/04, o infrator terá 20 (vinte) dias para apresentar defesa ou impugnação, contados da data de ciência da autuação, que uma vez apresentada, a autoridade competente terá 30 (trinta) dias para julgar o auto de infração.

Após proferida a decisão, o infrator terá 20 (vinte) dias para apresentar recurso e caso seja negado, terá mais 5 (cinco) dias para pagar a multa. Interessante observar que se todas as partes utilizarem os prazos em sua totalidade, o empresário poderá ter que pagar uma multa, que pode chegar ao valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), em apenas 75 dias depois de autuado.

O Decreto 5.054/04 classifica toda ação ou omissão em desconformidade com qualquer disposição legal ou regulamentar em três níveis, de acordo com a natureza de sua gravidade, são eles: leve, grave e gravíssima.

Como exemplo de infrações consideradas leves podemos citar: (i) deixar a empresa de exibição de emitir e encaminhar à ANCINE relatório enumerando as obras cinematográficas brasileiras e estrangeiras exibidas, no período, pelos cinemas ou salas de exibição de sua rede, número de dias exibidos, total de expectadores e renda de bilheteria, com indicação de quantidade, tipo e preço de ingressos, bem como dos tributos devidos; (ii) exibir ou comercializar obras cinematográficas e videofonográficas sem a marca indelével e irremovível no suporte material da cópia, contendo todas as informações que identifiquem o detentor do direito autoral no Brasil, conforme modelo aprovado pela ANCINE e pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda; e (iii) exibir ou comercializar obra cinematográfica ou videofonográfica brasileira sem o prévio registro do título na ANCINE e a emissão, quando for o caso, do Certificado de Produto Brasileiro - CPB, dentre outros.

Como infrações administrativas graves temos: (i) deixar a sala ou espaço de exibição destinado à exploração de obras cinematográficas sem qualquer suporte, deixar de utilizar sistema de controle de receitas de bilheteria, conforme normas expedidas pela ANCINE; e (ii) explorar comercialmente, no mercado brasileiro, obras cinematográficas e videofonográficas cujos serviços de copiagem ou reprodução das matrizes não tenham sido realizados em laboratórios instalados no País, dentre outros.

Já como casos de infrações gravíssimas, o Decreto 5.054/04 lista as seguintes hipóteses: (i) deixar a empresa proprietária, locatária, arrendatária ou programadora de salas, espaços ou locais de exibição pública comercial de exibir, anualmente, obras cinematográficas brasileiras de longa metragem pelo número de dias e na forma fixada em Decreto, ou seja, deixar de observar as conhecidas cotas de tela; (ii) comercializar, exibir ou veicular, em qualquer segmento do mercado brasileiro, obras cinematográficas e videofonográficas, sem prévia informação à ANCINE da contratação de direitos de exploração comercial, licenciamento, produção, co-produção, exibição, distribuição, comercialização, importação e exportação, bem como do pagamento da CONDECINE; e (iii) veicular cópia ou original de obra cinematográfica ou videofonográfica publicitária, sem que conste na claquete de identificação o número do respectivo registro do título na ANCINE; dentre outros.

As infrações cometidas pelas empresas das indústrias cinematográficas e videofonográficas poderão ser punidas administrativamente com uma das seguintes sanções: (i) advertência; (ii) multa, simples ou periódica; (iii) suspensão temporária, parcial ou total, da comercialização, exibição, veiculação ou transmissão da obra cinematográfica ou videofonográfica; e (iv) proibição da comercialização, exibição, veiculação ou transmissão da obra cinematográfica ou videofonográfica.

Para poder avaliar se a pena será leve, grave ou gravíssima, a autoridade administrativa também levará em conta as circunstâncias atenuantes e agravantes do caso em questão; a gravidade da infração; os antecedentes e a situação econômica do infrator.

O valor das multas também é relacionado no Decreto 5.054/04 e variam de acordo com a classificação das infrações. No caso das infrações consideradas leves as multas vão de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais); para as infrações graves de R$ 101.000,00 (cento e um mil reais) a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais); alguns casos de infrações gravíssimas são penalizadas com multas de R$ 1.000.001,00 (um milhão e um reais) a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), sendo que as infrações gravíssimas também podem ser penalizadas com multas correspondentes a cinco por cento da renda média diária da bilheteria, apurada no semestre anterior à infração, multiplicada pelo número de dias em que a obrigatoriedade não foi cumprida, ou pelo valor correspondente a três vezes o valor do contrato ou da veiculação, conforme o caso.

Por fim, cumpre ressaltar que a exigência contida no art 2º, §1º do Decreto 5.054/04, com relação ao registro obrigatório na ANCINE das empresas de produção, distribuição, comercialização, exibição e veiculação de obras audiovisuais nacionais e estrangeiras, bem como do título dessas obras - ainda que esta exigência esteja prevista no art. 22 da MP 2.228-1, com exceção do registro do título, que foi recentemente regulamentado pela Instrução Normativa nº 26, emitida pela ANCINE em 24.6.2004 - pode ter sua constitucionalidade questionada. Isto porque o art. 5º, IX da Constituição Federal consagra o princípio da liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação.

Nesse sentido, e considerando que as obras audiovisuais são expressões da atividade intelectual, a ANCINE deverá exercer a máxima cautela ao executar os procedimentos de controle e fiscalização, sob pena de se configurar limitação do direito constitucional à liberdade de expressão.

Com este Decreto a ANCINE passa a ter as ferramentas necessárias para controlar e incentivar o crescimento da nossa indústria cinematográfica e videofonográfica. A partir de agora, empresas como distribuidoras de vídeo e de filmes, emissoras de TV por assinatura, cinemas, agências de publicidade, dentre outras, terão que estar bastante atentas para as regras impostas pela ANCINE, de forma a evitar a aplicação de eventuais sanções.

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* Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2004. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS











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