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Sustentabilidade não se estimula por decreto

O conceito de sustentabilidade está cada vez mais presente em todos os níveis da sociedade, incluindo empresas e as três esferas de governo, para não falar das organizações não-governamentais. A adoção de uma nova postura por parte da administração federal é, sem dúvida, imprescindível, na medida em que já não se tolera que o fornecimento de bens e a execução de serviços ocorram desacompanhados da preocupação com a preservação do meio ambiente.

14/8/2008


Sustentabilidade não se estimula por decreto

Márcia Heloisa Pereira da Silva Buccolo*

O conceito de sustentabilidade está cada vez mais presente em todos os níveis da sociedade, incluindo empresas e as três esferas de governo, para não falar das organizações não-governamentais. A adoção de uma nova postura por parte da administração federal é, sem dúvida, imprescindível, na medida em que já não se tolera que o fornecimento de bens e a execução de serviços ocorram desacompanhados da preocupação com a preservação do meio ambiente.

Nesse sentido, medidas efetivas precisam ser adotadas para que a iniciativa governamental não fique apenas no papel. É preciso uma mudança de postura, a fim de coadunar as atividades econômicas com a preservação do meio ambiente e assegurar que ocorra de forma legítima e eficaz. Para tanto, são necessárias alterações nas normas de licitação vigentes. Isso deve ocorrer via modificação da Lei de Licitações - a Lei nº 8.666, de 1993 (clique aqui), para que passe a contemplar o conceito de licitação sustentável.

Considerando-se que o objetivo primordial da licitação é a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, há que ser adotado um novo conceito que contemple outros elementos que favoreçam a "licitação sustentável". Esse conceito, além do preço e da qualidade técnica, deverá incorporar outros valores, tais como a satisfação do usuário, a satisfação das necessidades de interesse público e a adoção de práticas que neutralizem ou minimizem o impacto ambiental e social adversos.

Para que não haja problemas jurídicos de interpretação, a redefinição poderá ser introduzida através da inclusão de um parágrafo no artigo 3º da Lei nº 8.666, que estabelece os objetivos da licitação. A redefinição do conceito legal representa uma providência salutar, tendo em vista que o cumprimento de tais condições traz, geralmente, alguns efeitos colaterais, como o aumento de custos para os interessados nas contratações, sendo, portanto, recomendável cautela nas providências de caráter jurídico para que sejam efetivamente exigíveis e não tenham sua viabilização frustrada futuramente.

É preciso uma mudança de postura via alteração da Lei de Licitações, para que passe a contemplar a licitação sustentável

O que se verifica, em larga escala, é que, à míngua de critérios mais objetivos, tem sido consagrado, ao longo do tempo, que a proposta mais vantajosa é a de menor preço. Nesse sentido, alguns projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional tratam, por exemplo, da alteração do parágrafo 2º do artigo 3º da Lei nº 8.666, a fim de estabelecer que, quando houver propostas em idênticas condições, como critério de desempate será assegurada a preferência por bens e serviços produzidos ou prestados por empresas que divulguem, periodicamente, um demonstrativo de suas atividades de natureza social e ambiental, ou que possuam certificado ambiental ou, ainda, que comprovem a procedência dos materiais e matérias-primas utilizados nos produtos como decorrentes do manejo sustentável e responsável sob o ponto de vista ambiental. Outra modificação interessante poderá ser introduzida a fim de permitir a exigência de um certificado ambiental, para efeito de habilitação das empresas interessadas em participar das licitações públicas.

Seria interessante ainda que, na Lei de Licitações, além das exigências de praxe, seja introduzida a necessidade de comprovação da qualificação ambiental, através da apresentação de certidão de regularidade ambiental. Outra possibilidade será a de assegurar à administração o direito de exigir dos licitantes a apresentação da metodologia de execução, contemplando o planejamento ambiental.

É oportuno destacar que interessantes ações têm sido adotadas, isoladamente, como as levadas a efeito pelo Estado e pelo município de São Paulo e por Minas Gerais. São Paulo, por exemplo, estabeleceu como critério para a aquisição de veículos que sejam movidos a álcool, proibiu a aquisição de produtos ou equipamentos que contenham substâncias prejudiciais à camada de ozônio e restringe a aquisição de lâmpadas àquelas que possuam alto rendimento energético e contenham baixo teor de mercúrio. Já na capital paulista estão sendo desenvolvidos projetos de iluminação pública que têm como meta a substituição de todas as lâmpadas hoje existentes por lâmpadas de vapor de sódio, ecologicamente mais adequadas. Estão sendo desenvolvidas, também, iniciativas e programas voltados para a construção civil, com requisitos de eco-eficiência nas compras municipais e de controle no uso de madeira em obras públicas, com o propósito de evitar a exploração de madeira ilegal da Amazônia.

São desafiadores os obstáculos a serem transpostos para a implementação da licitação sustentável no Brasil. O mais desafiador reside no convencimento dos tomadores de decisão da importância e dos impactos positivos que essas ações podem trazer. Não vale a pena perder essa excelente oportunidade, com previsíveis discussões judiciais acerca da constitucionalidade. Este é o momento para que a sociedade se una, juntamente com seus governantes, e requeira que as medidas necessárias sejam tomadas o quanto antes.

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*Advogada, sócia do escritório Edgard Leite Advogados Associados

 

 

 

 

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