Migalhas de Peso

Por quem dobram os sinos da crise dos subprimes e companhia?

Foram tantos os apelos dos leitores sobre o artigo publicado por nosso querido “Migalhas”, sobre a crise norte-americana dos subprimes, que o escriba interrompeu suas pesquisas sobre o meio-ambiente para sua atenção voltar-se sobre o tema anterior, dando-lhe novas facetas ou tentando desenhá-las.

9/7/2008


Por quem dobram os sinos da crise dos subprimes e companhia?

Jayme Vita Roso*

I – Esclarecer, é preciso.

Foram tantos os apelos dos leitores sobre o artigo publicado por nosso querido "Migalhas" (1.925 - 25/6/08 - "Crise norte-americana - Subprimes" - clique aqui), sobre a crise norte-americana dos subprimes, que o escriba interrompeu suas pesquisas sobre o meio-ambiente para sua atenção voltar-se sobre o tema anterior, dando-lhe novas facetas ou tentando desenhá-las.

Antes foram os fatos concretos, a partir das providências que o senhor Cuomo está procedendo <_st13a_personname productid="em Nova York" w:st="on">em Nova York, para apurar responsabilidades civis ou criminais dos que se valeram das facilidades que o capitalismo financeiro proporcionou a um exagerado número de espertalhões, provocando uma fissura no cambaleante sistema financeiro norte-americano. Agora, serão esboçadas idéias, já expressas, que estão efervescendo os caldeirões da opinião pública.

Quais as causas desse maremoto? Por que ocorreu? Por que não houve intervenção dos órgãos reguladores, a tempo para evitá-lo ou para reduzir os efeitos letais em milhões de pessoas nos Estados Unidos e na Europa?

É o que se buscará, contando com a compreensão dos leitores para a esgarçadura dos pensamentos, embora se tente dar, a esses pensamentos, certa unidade expositiva.

II – O pensamento de George Soros sobre a crise financeira.

O decantado mega-investidor George Soros é conhecido, em nossos dias, como o mais polêmico dos financistas americanos. Há tonalidades culturais nele, que o distingue dos demais. Assumiu, como homem de negócios, posições de vanguarda, não se recolhendo em seu gabinete, mas participando, para que sua pátria de adoção possa navegar em mares plácidos, livrando-a dos mal-estares que a vem acompanhando há vários anos, pela corrosão dos princípios e dos ideais mais puros, que encantaram gerações e a plasmaram como legítima porta-estandarte da democracia.

George Soros, atualmente, é o chairman do Soros Fund Management, que resistiu ao vendaval financeiro, pelo menos até agora, como administrador desse fundo de hedge.

De sua autoria, um livro impecável, que cuida dessa crise, quiçá a maior desde a Grande Depressão, buscando as origens dela e, como não poderia deixar escapar, os reflexos para o futuro1.

A obra de Soros, como confessa na Introdução, repete muitas das suas idéias e das suas assertivas antes reproduzidas em trabalhos, escritos, conferências, palestras, entrevistas de anos não tão distantes.

Dotado de sólida formação cultural, adquirida desde os bancos escolares, na Hungria, até o brilhante curso que completou na lendária London School of Economics, Soros se tornou vitorioso participante ativo do mercado.

Produto do capitalismo financeiro, no qual chegou a ser ungido como o maior dentre os maiores atuantes, Soros nunca criticou o sistema, porque sempre viveu dele e se aproveitou de suas debilidades para amealhar sua fortuna, estimada, segundo fontes não oficiais, em 6 bilhões de dólares norte-americanos.

E, nesse livro, dizendo-se influenciado por Karl Popper, propõe um novo paradigma para o capitalismo, contrapondo-se ao modelo contemporâneo, no qual os mercados financeiros tendem em direção ao equilíbrio, açoitando-o de falso e de enganador.

Com didática, ainda na Introdução, sugere que "o novo paradigma, que estou propondo, não está confinado nos mercados financeiros". Esse paradigma trata da relação entre pensamento e realidade, sustentando que equívocos conceituais e falsas interpretações desempenham papel relevante nos cursos históricos. Por isso, critica a teoria da competição perfeita que é escorada na presunção de um conhecimento perfeito das regras do mercado financeiro. A partir daí elabora críticas às situações que geraram a crise atual, propondo uma forma de interpretar o fenômeno, que chama de teoria da reflexividade, e mostrando como ela se aplica ao momento atual.

Retorna vinte e cinco anos, para sustentar que a criação de bolhas resultou no fato de que cada bolha "consists of a trend and a misconception that interact in a reflexive manner". E assim por diante, quando se visualiza que cada bolha gera uma crise e esta produz outra, chegando a uma super-bolha. Encerrando, "the previous crises served as successful tests which reinforced the prevailing trend and the prevailing misconception. The current crisis constitutes the turning point when both the trend and the misconception have become unsustainable".

Articulistas, como John Authers do Financial Times de Londres, apanharam com argúcia a proposta de Soros para mudança de paradigma para a teoria da eficiência dos mercados, proposta essa que foi elaborada com o emprego de teorias alternativas, que o escriba prefere chamar de multidisciplinares, porque recolhe subsídios da psicologia experimental, da matemática avançada e da biologia evolucionista na experiência de mercados. Não se deixará de levar em boa conta que a teoria reflexiva de Soros, completando décadas, está agora ganhando adeptos, em razão de que ele é sempre buscado para interpretar crises e profetizar o futuro, este com êxito.

O The New York Review, de 15 de maio último, publicou a longa entrevista que Soros dera à TV Bloomberg, no dia 4 de abril, para Juddy Woodruff2.

Palavras ponderadas, porém, na realidade, com duras críticas ao Federal Reserve e ao Tesouro, destacando-se estes trechos:

Se as coisas estavam erradas, por que não foram reconhecidas? Soros respondeu: "One Fed governor, Edward Gramlich, warned of a coming crisis in subprime mortgages in a speech published in 2004 and a book published in 2007, among other statements. So a member of people could see it coming. And somehow, the authorities didn't want to see it coming. So it came as a surprise".

Quanto vai durar? Soros argüiu: "Well, it depends on when the authorities wake up, because you need to reduce the number of foreclosures", e "you need to prevent human suffering and social disruption, because it's going to be very, very severe".

Onde vai parar o dólar? A resposta de Soros: "Well, that I don't know. I can see the trend, but I don't know its extent, and I don't know when something might happen to turn it around. Once the economy stabilizes, probably the overshoot on the currencies would also be connected".

George Soros justificou, ainda, que o preço do ouro ainda não atingiu seu mais alto patamar; a China, crescendo, é a maior beneficiária da globalização, sobretudo porque mantém sua moeda desvalorizada; esclareceu que o "rule of law" é mais confiável na China do que na Rússia; apoiará Barak Obama, porque tem carisma e visão para reorientar a América no mundo, sendo falsa e preconceituosa a crítica de que lhe falta experiência para ser presidente, porque terá os mesmos conselheiros de Hillary Clinton e a escolha deles tem critério pessoal. Por fim, criticou as regulamentações do mercado, porque são imperfeitas e, sobretudo, piores porque manejadas por burocratas, bastando que "se tenham autoridades que mantenham o mercado em vigilância e algum grau de controle". Nada de exageros.

George Soros, mais pessimista, no dia 5 de junho, foi entrevistado pelo CBC News3 e, sintetizando, acredita existirem inúmeras bolhas se formando nos mercados financeiros, inclusive uma no do petróleo. Mudando um pouco de pensamento com relação à entrevista anterior, sugere que melhor regulamentação é necessária para manter os preços das commodities em níveis mais razoáveis.

III – O advogado Charles R.Morris apregoa a morte do liberalistmo e o caos financeiro.

Charles Morris, advogado bem sucedido, foi banqueiro anteriormente e escreveu cerca de dez livros. Este, que trazemos aos Migalheiros, é o mais recente, com título apolítico4.

Não há mais dúvida, como recordamos no artigo anterior, que a crise de crédito começou há três anos e ninguém a admitiu e nem a enfrentou com os meios e remédios para debelá-la.

É o que Morris sustenta, revelando que, na história desse cruento episódio, que enodoa o sistema financeiro, encontram-se vilões às dezenas, com sofredores aos milhões pelo mundo.

O jornalista inglês, Edward Chancellor, no Sunday Times Review analisou o livro de Morris e comparou-o com o de Soros, nas ideologias que orientaram as duas obras, apreciação que as fez em conjunto5.

Relevante é a conclusão da peça com ênfase em Soros: "Soros believes that the current crises exposes the limits of the free-market ideology that has held away since the early 1980s. Morris is like-minded. Both authors conclude that the crisis threatens to end the era of American financial supremacy, in which the dollar has served as the global reserve currency. Both see problems ahead as more corporate and commercial real estate loans go bad. It's time for a change in economic thinking, says Soros. The next generation of economists will have to understand financial bubbles, rather than ignore them, as Greenspan and his fellow central bankers have done. They would be well adviser to give Soro's theory of reflexivity consideration".

De Morris tomou emprestado o pragmatismo da sua exposição que mostra o jogo de empurra-empurra das "batatas quentes", ou seja, os créditos eram passados de mão em mão, até que ocorreram as inadimplências, generalizando-as, com "Frankenstein securities, which replicated real loans, when constructed out of credit insurance contracts. The supply of credit became infinit, utterly divorced from its traditional role of allocating scarce capital. Financial profits and banker's bonuses soared".

IV – Que fará Obama, caso eleito presidente?

John Cassidy é um talentoso jornalista do The New Yorker. Autor crítico das estripulias que vêm ocorrendo nos últimos anos no sistema financeiro do seu país, escreveu um valioso retrato da febre da era da internet, com o título "Dot.com: how America lost its mind and the money in the Internet era6".

Há pouco, debruçou-se sobre a mais recente obra de dois prolíficos autores 7 e, extraindo da opinião deles as apreciações sobre as idéias econômicas de Obama, naturalmente esboçando algumas linhas sobre a crise do subprime, concluiu com indícios de que o governo do senador de Illinois, se consagrado na eleição de novembro, terá feição diferente do vigente mandatário e, mais ainda, do candidato McCain, a quem nem lhe dão crédito os conservadores. Para Cassidy, Obama poderá sacudir as forças inerciais com mais sucesso que os Clintons em 1993 e 1994. E indaga: "But for what policy purposes are the masses to be mobilized? According to Obama's program, the answers include another middle-class tax cut; more tax credits for education and fuel-efficient cars; a bigger budget for the National Science Foundation; and the establishment of a National Infrastructure Reinvestment Bank with an annual budget of $ 6 billion. At best, these proposals would represent a useful start in redressing the inequities and shortcomings produced by twenty-five years of Republican domination. If the next Democratic president wants to leave a truly lasting legacy, he or she will have to do more than nudge the country in a different direction".

V – O arremate : a vingança santa do auditor jurídico.

Mostrando as facetas do escândalo do subprime e dos apêndices, esperamos com Fábio Konder Comparato: "Felizmente, em contraste com o desnorteamento e o caráter mundialmente predatório do capitalismo, assistimos à progressiva formação do conjunto dos direitos humanos como um sistema, no sentido de que esse conceito assume na biologia e nas ciências humanas8".

Seguramente, se regulamentada e praticada com primor e ética, a auditoria jurídica, com advogados probos a exercitá-la, os subprimes teriam sido abortados no início, em 2004, quando começaram a contaminar os mercados.

É a razão de tanta insistência com que é pregada a missionária atitude para termos mais um elegante campo de trabalho, em particular para os jovens advogados.

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1 SOROS, George. The new paradigm for financial markets: the credit crisis of 2008 and what it means. New York: Public Affairs, 2008. 162p.

2 WOODRUFF, Judy; SOROS, George. The Financial Crisis: an interview with George Soros. The New York Review of Books, <_st13a_state w:st="on"><_st13a_place w:st="on">New York, v. 55,n. 8, 15 maio 2008. p.8-10.

3 BOCHOVE, Danielle; SOROS, George. Bubbles building in financial markets: billionaire Soros. CBC News. 06 jun. 2008. Disponível em: (clique aqui) Acesso em 04 jul. 2008.

4 MORRIS, Charles R. The trillion dollar meltdown: easy money, high rollers, and the great credit crash. <_st13a_state w:st="on"><_st13a_place w:st="on">New York: Public Affairs, 2008. 194 p.

5 CHANCELLOR, Edward. The trillion dollar meltdown by Charles Morris and The new paradigm for financial markets: the credit crisis of 2008 and what it means by George Soros. Times Online, 25 maio 2008. Disponível em: (clique aqui) Acesso em 04 jul. 2008

6 CASSIDY, John. Dot.con: how <_st13a_country-region w:st="on"><_st13a_place w:st="on">America lost its mind and the money in the internet era. <_st13a_state w:st="on"><_st13a_place w:st="on">New York: Harper Perennial, 2003. 416 p.

7 CASSIDY, John. Economics: which way for Obama?. The <_st13a_state w:st="on">New York Review of Books, <_st13a_state w:st="on"><_st13a_place w:st="on">New York, v. 55, n. 10, 12 jun. 2008. p. 30-34. A propósito de, THALER, Richard H.; SUNSTEIN, Cass R. Nudge: improving decisions about health, wealth and happiness. <_st13a_city w:st="on">New Haven: <_st13a_place w:st="on"><_st13a_placename w:st="on">Yale <_st13a_placetype w:st="on">University, 2008. p. 293.

8 COMPARATO, Fábio Konder. Ética, direito, moral, religião no mundo moderno. <_st13a_city w:st="on"><_st13a_place w:st="on">São Paulo: Companhia das Letras, 2006. 720 p.

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*Advogado







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