Problemas à vista com o “pseudo-diagnóstico” do poder Judiciário
Erik Frederico Gramstrup*
O objetivo deste artigo é advertir os leitores para que guardem extrema prudência na apreciação e manipulação dos referidos dados, principalmente dos relativos à Justiça Federal.
O Ministério da Justiça, através da Secretaria de Reforma do Judiciário, efetuou o lançamento público dos números com grandiloquência, dando a entender que serviriam como suporte para análise e decisões envolvendo a reforma das leis processuais e administração da Justiça.
Todavia – e é com grande pena que venho apontá-lo em público, porque se trata de um desperdício – o relatório está repleto de omissões, dados simplesmente fantasiosos, erros aritméticos e metodologia não transparente. Uma perda de esforços e de oportunidade! E – o que é pior – por corolário, tendente a (des)orientar políticas públicas completamente equivocadas, no que diz respeito à reforma da Justiça.
Julguei que o assunto era suficientemente sério para dar a devida notícia aos leitores de “Migalhas”, principalmente após a manifestação das entidades de classe da magistratura e do ministério público, bem como do Presidente do Supremo Tribunal Federal, asseverando que os dados, bastante falhos, não lograriam auxiliar os propósitos mencionados. O próprio Ministério da Justiça está começando a reconhecer parte dos equívocos, embora tergiverse a respeito dos mais grosseiros, como facilmente se compreende.
A seguir dou alguns exemplos, fruto de uma análise preliminar feita pelos juízes federais e, particulamente, por meio de sua associação nacional, a AJUFE:
1) ERRO RELATIVO ÀS ESTATÍTICAS DE PRODUÇÃO: na avaliação de produtividade dos magistrados federais, foram simplesmente descartadas as sentenças proferidas pelos juizados especiais federais (por que o Ministério não gosta dos juizados?). Esta omissão já foi objeto de reconhecimento pelo MJ;
2) ERRO REFERENTE AO CUSTO RELATIVO DA JUSTIÇA: para efeito de determinar o peso da Justiça nos gastos públicos, foram “expurgadas”, sem motivo plausível, as despesas relativas à dívida externa, chegando-se a uma participação relativa bastante distorcida, em que a Justiça Brasileira aparece como uma das mais onerosas do Mundo. Não bastasse isto, entram no cálculo do custo da Justiça valores que não lhe pertencem, como os respeitantes ao pagamento de precatórios que, como se sabe, são destinados aos credores do Estado e não para custeio do Poder Judiciário. E mais: do lado da receita, não foi considerada corretamente a arrecadação promovida pela Justiça Federal e do Trabalho;
3) ERRO RELATIVO À PRODUTIVIDADE INDIVIDUAL DOS JUÍZES FEDERAIS: o método grosseiro de cálculo envolveu a divisão do número de sentenças pelo de cargos, sem levar em consideração que muitos estão vagos, à espera da realização de concursos! Quer dizer, o Ministério da Justiça acredita na existência de fantasmas! No caso da Justiça Federal Comum, há mais de duzentos cargos vagos, sem que isto fosse levado em consideração para efeito do dividendo.
4) ERRO RELATIVO À COMPARAÇÃO DE VENCIMENTOS: para comparar os vencimentos dos juízes brasileiros com os estrangeiros, o governo não confiou nos seus próprios dados. Valeu-se daqueles divulgados pelo Banco Mundial e, o que é pior, na avaliação do poder de compra, assumiu, sem qualquer justificativa, que no período de comparação um real equivalia a dois dólares norte-americanos!!
5) “VARAS FANTASMAS”: prosseguindo na divulgação de suas crenças sobrenaturais, o Ministério da Justiça informou a criação de 500 (quinhentas) Varas Federais em 2003, quando em realidade só o foram 183, das quais muitas apenas no papel!
6) ERROS DIVERSOS: outros dados simplemente não se coadunam com as estatíticas oficiais de distribuição do Poder Judiciário. A isto, respondeu o MJ que os teria obtido na internet! Por que uma pesquisa tão relevante é feita com métodos amadorísticos e sem a participação dos profissionais diretamente envolvidos?
Por estas e outras erronias, que estão diariamente sendo descobertas, o Ministro Nelson Jobim, Presidente do STF, já declarou publicamente que o levantamento do MJ simplesmente não serve para planejar as atividades do Judiciário. Todo o nosso apoio, portanto, vai para a idéia de que novo estudo – e desta vez com métodos e propósitos sérios – seja realizado com o aval da Suprema Corte e a participação de juízes, advogados, membros do MP e suas respectivas entidades
___________________
*Juiz Federal, Vice-Presidente da Associação dos Juízes Federais em SP e MS e Professor da Faculdade de Direito da PUC/SP
___________________