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Alteração da Súmula nº. 228 do TST. Um sério equívoco

O Tribunal Superior do Trabalho, em sessão da sua composição plena realizada na última quinta-feira, dia 26 de junho de 2008, entendeu por definir, sob a sua ótica, a base de cálculo do adicional de insalubridade, considerando a interpretação que fez da Súmula nº.4 do Supremo Tribunal Federal (clique aqui)

2/7/2008


Alteração da Súmula nº. 228 do TST. Um sério equívoco

Marco Antonio Aparecido de Lima*

O Tribunal Superior do Trabalho, em sessão da sua composição plena realizada na última quinta-feira, dia 26 de junho de 2008, entendeu por definir, sob a sua ótica, a base de cálculo do adicional de insalubridade, considerando a interpretação que fez da Súmula nº.4 do Supremo Tribunal Federal (clique aqui).

Para tanto, numa só penada, o TST cancelou a Súmula nº. 17 (clique aqui), que estabelecia o salário profissional normativo como base de cálculo e alterou a Súmula nº. 228, aplicando por analogia, ao adicional de insalubridade, o mesmo critério utilizado cálculo do valor do adicional de periculosidade, tudo para estabelecer que a base de cálculo do adicional de insalubridade é agora o salário básico do trabalhador.

Com todo o respeito que a mais alta corte trabalhista do país merece, foi uma inadequada, equivocada e onerosa decisão, além de enfraquecer seriamente a teia da segurança jurídica nacional.

Inadequada, porque subverte o princípio da competência dos poderes, convertendo a Justiça do Trabalho, integrante do Poder Judiciário, em Poder Legislativo; equivocada, porque interpreta, incorretamente, o que a própria Súmula Normativa nº.4, já que esta estabeleceu, expressamente, que o salário mínimo não poderia ser substituído como indexador, por decisão judicial; onerosa, porque a nova orientação do TST significa, na prática, aumentar os salários em percentuais astronômicos para boa parcela de trabalhadores que tem direito a receber o adicional de insalubridade.

Aliás, tudo indica que, ao assim decidir, o Colendo TST não se preocupou, em fazer contas.

Vamos tomar como exemplo a categoria profissional dos metalúrgicos, que tem uma remuneração média por volta de R$ 1.670,00. O trabalhador integrante dessa categoria profissional, que percebe hoje adicional de insalubridade em grau máximo, recebe um sobre-salário relativo ao adicional de insalubridade de R$ 166,00 (40% do valor do salário mínimo nacional que é de R$ 415,00). Esse valor corresponde a aproximadamente 10% do salário básico. Com essa pretendida nova orientação do TST, esse mesmo trabalhador passaria a receber agora adicional de insalubridade no valor de R$ 688,00, o que corresponde a um aumento de R$ 502,00, ou seja, um acréscimo mensal de 30% nos salários do empregado! E isto sem contar eventuais efeitos retroativos, se aplicada a orientação de forma a atingir situações passadas!

Além disso, a atitude vai gerar enorme insegurança na área trabalhista, e, sem dúvida, reabrir uma grande discussão nacional, inúmeras demandas trabalhistas patrocinadas por sindicatos de trabalhadores, desfigurando, assim, a natureza pacificadora das Súmulas, colocando em pé de guerra empregadores e empregados.

Ora, reza a Súmula Vinculante nº. 4 do Supremo Tribunal Federal:

"Salvo os casos previstos na Constituição Federal, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial."

O que fez o Tribunal Superior do Trabalho, em desrespeito ao Supremo Tribunal Federal? Simplesmente, ignorou o sentido correto da parte final da referida Súmula Vinculante da Corte Constitucional, para estabelecer um indexador aplicável para substituir o salário mínimo. Ocorre que a edição de Súmula não deixa de ser um ato manifestamente judicial, uma vez que as Súmulas do Tribunal Superior do Trabalho, não são nada mais, nada menos, que a própria cristalização de reiteradas decisões sobre um mesmo tema; mesmo se considerada a hipótese de o TST estar apenas interpretando matéria constitucional através de Súmula, nesse caso, arvorou-se em Corte Constitucional, pois se trata de matéria já apreciada pelo STF e convertida em Súmula de caráter vinculativo e que contém orientação diversa daquela agora adotada.

Aliás, acreditava-se que com a edição da Súmula Vinculante nº. 4 do STF estar-se-ia clareando esse tormentoso tema, que há muito vinha causando séria insegurança jurídica e intensa preocupação junto à área de recursos humanos das empresas pelas conseqüências financeiras que o tema contém.

Para nós, com a edição da Súmula Vinculante nº. 4, o Excelso Supremo Tribunal Federal adotou o princípio de que a Constituição Federal, embora iniba a "vinculação" ao salário mínimo para qualquer fim, o faz apenas como indexador de cálculo de vantagens salariais. Significa dizer, portanto, que não haveria proibição legal quanto à adoção do referido valor como simples base de cálculo inicial de fixação do adicional de insalubridade, cingindo-se a vedação constitucional, portanto, à indexação do adicional com base na evolução do valor do salário mínimo, durante o contrato de trabalho.

Restara claro, para nós, que a Súmula Vinculante nº. 4 afastara, expressamente, a possibilidade de, por decisão judicial, o salário mínimo ser substituído por outro indexador, esclarecendo o STF no referido verbete vinculante que cabe apenas à lei ordinária essa tarefa, não ao Judiciário. Nesse passo, apontou o STF o caminho de os empregadores fixarem o adicional de insalubridade sobre o salário mínimo (10%, 20% ou 40%, de acordo com o grau de insalubridade), convertendo dito valor em reais, aguardando nova ordem legal que apontasse um novo indexador aplicável.

O TST, agora, viola essa lógica com a iminente edição da nova Súmula 228, já anunciada, mas ainda não publicada.

Ademais, está tecnicamente incorreta essa nova orientação do TST, pois embora, aparentemente, se apóie na inconstitucionalidade do artigo 192 da CLT, preserva os graus de insalubridade nele contidos, para efeito de fixação do percentual, quais sejam 10%, 20% ou 40%.

Ora, ao agir assim, mantendo ditos percentuais, mas determinando sua aplicação sobre o salário básico e não sobre o mínimo nacional, o TST adota o caminho da inconstitucionalidade parcial da norma, o que fere a técnica jurídica, pois se inconstitucional a regra que estabelece base de cálculo da vantagem, nenhuma parte de seu conteúdo deveria ser considerada, suspendendo-se a sua aplicação, até que a lei viesse a estabelecer a base de cálculo e os próprios percentuais incidentes, pois são elementos indissociáveis.

Tão equivocada é a posição do TST que, embora o legislador na origem tenha determinado o pagamento do adicional de insalubridade considerando uma base única (salário mínimo nacional), numa provável adoção do princípio isonômico de que todos os trabalhadores devem ter sua saúde valorada de uma única forma, criou agora o TST, arvorando-se mais uma vez em legislador, valores diferentes do adicional de insalubridade, mesmo para trabalhadores que trabalham lado a lado, desfigurando totalmente o princípio isonômico adotado pelo legislador.

Finalmente, para arrematar o rol de inconsistências da nova Súmula nº. 228, sequer se poderia sustentar que ela é justa, pois, se considerado o percentual do adicional de insalubridade em grau máximo, portanto de 40% sobre o salário básico, este será superior ao próprio adicional de periculosidade que não ultrapassará 30% do salário do empregado; ou seja, o risco à saúde passa ser onerado com adicional superior ao do próprio risco de vida!

A Constituição Federal de 1988 (clique aqui) dispõe sobre o processo e julgamento da chamada "ação de reclamação", cuja competência é originária do Supremo Tribunal Federal, para a preservação da sua competência e para a garantia da autoridade de suas decisões. Antes que seja tarde e se instale o caos, é salutar seja utilizado esse remédio por quem detém a legitimidade ativa, visando a que o Supremo Tribunal imponha a sua competência nitidamente usurpada pelo Tribunal Superior do Trabalho que, com a nova redação da indigitada Súmula nº. 228 desautoriza a aplicação do verbete vinculante da Corte Constitucional.

Por outro lado, espera-se que a Justiça do Trabalho reveja rapidamente essa posição; enquanto isso não acontece, espera-se que os juízes de primeiro grau e dos Tribunais Regionais deixem de aplicar, como lhes é permitido, essa equivocada orientação do TST, lembrando que as Súmulas do TST não possuem efeito vinculante.

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*Advogado titular do escritório Lima Advogados Associados - Assessoria e Consultoria Jurídica











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