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Projeto de Lei nº 3.253/04

As mudanças ocorridas na legislação processual civil na última década, refletem a preocupação dos juristas em relação à efetividade do processo, sem deixar de lado a não menos preocupante questão da segurança jurídica, a qual deve, igualmente, ser observada e assegurada, a fim de não desprezar os princípios básicos do direito, tal como o devido processo legal.

19/7/2004

Projeto de Lei nº 3.253/04 

 

Novas regras para a execução de sentenças


Júlio César Bueno,

Alexandre Luiz Lucco*

As mudanças ocorridas na legislação processual civil na última década, refletem a preocupação dos juristas em relação à efetividade do processo, sem deixar de lado a não menos preocupante questão da segurança jurídica, a qual deve, igualmente, ser observada e assegurada, a fim de não desprezar os princípios básicos do direito, tal como o devido processo legal.

Dentre as mudanças que buscam simplificar e agilizar o processo, destacam-se as estabelecidas pelo artigo 273 do Código de Processo Civil, que trata da antecipação de tutela, bem como as dos artigos 461 e 461-A do mesmo Diploma Processual, que dispõem, respectivamente, sobre tutela específica para as obrigações de fazer ou não fazer e para as obrigações de entregar coisa certa.

Seguindo a linha da efetividade processual, chega-se ao Projeto de Lei nº 3.253/2004, que propõe o fim do processo de execução autônomo de título executivo judicial. Esse Projeto recebeu recentemente parecer favorável da Comissão Especial da Câmara para a Reforma do Poder Judiciário, sendo certo que, se for aprovado pelo Congresso, agilizará sobremaneira o trâmite para o cumprimento das decisões judiciais, que não mais estarão sujeitas a novo e demorado processo para que sejam cumpridas.

Esse Projeto foi apresentado na Câmara dos Deputados pelo Poder Executivo em 29 de março deste ano, e integra um conjunto de propostas do Governo para a Reforma do Poder Judiciário, visando prioritariamente a celeridade processual.

No atual sistema processual brasileiro, inspirado na teoria desenvolvida por Enrico Tullio Liebman, embora a sentença condenatória possua eficácia desde o seu trânsito em julgado, ela depende da propositura de uma nova ação para seu efetivo cumprimento, haja vista que o processo de conhecimento apenas confere ao credor um título executivo para que seja posteriormente executado.

Uma vez proposta a ação de execução, deve haver a obrigatória citação pessoal do devedor para que pague o devido em 24 horas, ou para que nomeie bens à penhora. Ocorrida a intimação da penhora de seus bens, o devedor está autorizado a opor embargos à execução, que terá o condão de suspendê-la até que seja proferida sentença.

A sentença proferida nos embargos à execução, por seu turno, também não garante que a decisão proferida no processo de cognição seja finalmente cumprida pelo devedor, vez que estará sujeita a recurso ainda que somente no efeito devolutivo, e não suspensivo. Nesse caso, restará ao credor executar o devedor em caráter provisório, até que os embargos transitem em julgado.

Ao contrário desse modelo, o procedimento a ser introduzido com a sanção do Projeto adota o sistema vigente para as obrigações de fazer ou não fazer e entregar coisa certa (artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil). Nesses casos, o Juiz, na própria sentença, fixa o prazo para que a obrigação seja cumprida, sob pena de multa diária (astreinte)1.

Assim como na tutela específica prevista nos artigos 461 e 461-A, a sentença deverá ser cumprida independente de provocação do credor (propositura de ação executiva autônoma), não necessitando, portanto, de nova citação do devedor, bastando a intimação de seu advogado. De acordo com o Projeto, após a intimação, o devedor terá prazo de quinze dias para efetuar o pagamento do débito e, caso não o faça, a esse valor incidirá multa de 10% (dez por cento) do montante devido. Além disso, será expedido de imediato mandado para a penhora de seus bens.

Vale ressaltar que a sentença proferida no processo de conhecimento, mesmo que pendente de apelação, poderá ser executada provisoriamente. Contudo, na execução provisória, permanece a exigência de “caução suficiente e idônea” para que o credor possa efetuar o “levantamento de depósito em dinheiro, e a prática de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais possa resultar grave dano ao executado”2

O Projeto também pretende extinguir os embargos à execução, que serão substituídos por impugnação3, a ser apresentada no prazo de quinze dias contados da intimação da penhora. Os temas que poderão ser suscitados na impugnação são basicamente os mesmos dos embargos à execução4. No entanto, a relevante diferença entre a impugnação e os embargos é o fato de que a impugnação não suspenderá a execução, tal como ocorre atualmente, podendo o efeito suspensivo ser atribuído pelo Juiz apenas em caráter excepcional5. Contra a decisão que julgar a impugnação, caberá agravo de instrumento, a menos que importe extinção da execução, caso em que caberá apelação.

Com efeito, vale citar as emendas propostas pelo Deputado Ibrahim Abi-Ackel, do Partido Progressista (PP) de Minas Gerais, ambas acolhidas pela Comissão Especial da Câmara para a Reforma do Poder Judiciário. A primeira determina que o devedor deposite em Juízo o valor incontroverso da ação, caso interponha recurso. A segunda, permite ao credor que comprovar sua situação de necessidade, acesso ao montante depositado em Juízo, antes do término do caso.

Com a sanção desse Projeto, todos os dispositivos do Código de Processo Civil relacionados à execução de título judicial serão revogados e reunidos em um único capítulo que será introduzido no “Livro I – Do Processo de Conhecimento”, o denominado “Capítulo X – Do Cumprimento da Sentença”. Da mesma forma, os dispositivos relativos à liquidação de sentença que atualmente encontram-se dispostos na sessão do Código referente ao processo de execução, com o Projeto, também passarão a integrar o “Livro I”, sob o nome de “Capítulo IX – Da Liquidação de Sentença”.

Conforme exposto, o Projeto regulará somente os títulos executivos judiciais, isto é, aqueles decorrentes de sentenças proferidas em ações de conhecimento, cujo pedido é de condenação – ações de indenização por danos morais e materiais, créditos provenientes de pensões alimentícias, acidentes de trânsito, ações de cobrança em geral, dentre outros casos. Por ora, excluem-se os títulos executivos extrajudiciais – notas promissórias, cheques, duplicatas, etc. – que, todavia, são objeto de outros Projetos que estão sendo elaborados pelo Poder Executivo.

Após parecer favorável da Comissão Especial da Câmara para a Reforma do Poder Judiciário, o Projeto foi encaminhado à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), tendo sido designado como Relator o Deputado Inaldo Leitão, do Partido dos Trabalhadores (PT) do Estado da Bahia. Posteriormente, o Projeto deverá seguir para votação no plenário da Câmara e, em seguida, tramitará no Senado para que possa, enfim, ser levado para sanção presidencial.

Acreditamos que a iniciativa de mudança do atual modelo de execução de sentença, que tem se revelado apenas como um entrave que o credor deve superar para a satisfação de seu direito, é necessária e consubstancia verdadeira evolução no processo civil visando a almejada efetividade.
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1 Artigo 3º do Projeto que institui o artigo 475-I. do Código do Processo Civil “O cumprimento da sentença far-se-á conforme os artigos 461 e 461-A ou, tratando-se de obrigação por quantia certa, por execução, nos termos dos demais artigos deste Capítulo.”
2 Artigo 3º do Projeto que institui o artigo 475-O do Código do Processo Civil.
3 Artigo 3º do Projeto que institui o artigo 475-J do Código do Processo Civil: “(...) § 1º. Do auto de penhora e avaliação será de imediato intimado o executado na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na falta deste, do seu representante legal ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias.”
4 Artigo 3º do Projeto que institui o artigo 475-L do Código do Processo Civil: “A impugnação somente poderá versar sobre:
I. - falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia;

II. - inexigibilidade do título;

III. - penhora incorreta ou avaliação errônea;

IV. - ilegitimidade das partes;

V. - excesso de execução;

VI. - qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença;

§1º - Para efeito do disposto no inciso II deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal pelo Supremo Tribunal Federal.

§2º - Quando o executado alegar que o exeqüente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante da sentença, cumprir-lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de rejeição liminar dessa impugnação.

5 Artigo 3º do Projeto que institui o artigo 475-M do Código do Processo Civil: “A impugnação não terá efeito suspensivo, podendo o juiz atribuir-lhe tal efeito desde que relevantes seus fundamentos e o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação.”
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*Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2004. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS











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