Origem dos Juizados especiais
Antonio Pessoa Cardoso*
Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais originaram-se de experiência extralegal, iniciada por juizes gaúchos, seguidos pelos magistrados paranaenses e baianos, com a criação dos Conselhos de Conciliação e Arbitramento, no ano de 1982. Os Conselhos eram compostos por pessoas idôneas da comunidade, de preferência escolhidos entre advogados, juizes e promotores aposentados, juiz de paz, professores, etc. Inicialmente, a reunião dessas pessoas acontecia, à noite, no curso da semana e buscava-se solucionar, através da conciliação, desentendimentos entre vizinhos. Eram as pequenas causas que nunca chegavam ao Judiciário: a litigiosidade contida. O grande problema residia na falta de recursos para resolver as demandas não conciliadas.
Assim mesmo foi-se em frente!
A necessidade de um papel para traçar o procedimento a ser seguido pelos conciliadores provocou a edição de um documento, denominado de Regulamento, composto de 18 (dezoito) artigos.
A reclamação nos Conselhos tinha a seguinte movimentação: o cidadão prestava queixa a um funcionário que anotava em uma ficha os tópicos do pedido; no mesmo instante era designada audiência com chamamento das duas partes e testemunhas, se tivessem, para serem ouvidas. O próprio reclamante ou terceiro de sua confiança, fazia chegar ao reclamado a citação; muito raramente se servia de outros meios: correio, oficial de justiça, etc. Grande era o volume de causas, relativas à família, solucionadas pelos Conselhos, a exemplo de pensão alimentícia, desentendimentos entre marido e esposa, etc. Aliás, mesmo depois da criação dos Juizados Especiais de Pequenas Causas a pensão alimentícia era o tipo de causa mais comum.
Obtido êxito com a conciliação, expedia-se um documento com as cláusulas do acordo celebrado entre as partes; se não houvesse acordo, o Regulamento previa outra solução para a demanda; as partes indicavam um árbitro e este solucionava o desentendimento.
O STF chegou a ser solicitado para dirimir desentendimentos sobre o funcionamento destes Juizados Informais, outra denominação dos Conselhos:
"O chamado Juizado Informal de Conciliação, constituído à margem da Lei n°. 7.244/84 (clique aqui), não tem natureza pública. Os acordos, aí concluídos, valem como títulos extrajudiciais, só podendo ter força executiva nos casos previstos em lei, como na hipótese de corresponderem ao disposto no art. n°. 585, inc. II, do CPC (clique aqui). Poderão adquirir natureza de título judicial, se homologados pelo juiz competente (Lei n°. 7.244, art. n°. 55), o que não se verificou na hipótese em julgamento". STF. 3ª. Turma. RE n°. 6.019, Rel. ministro Eduardo Ribeiro.
O juiz, como no futebol o árbitro, nunca foi o personagem mais importante dos Conselhos, dos Juizados Informais ou dos Juizados Especiais de Pequenas Causas. Sua interferência dava-se em apenas dois momentos: antes da instalação da audiência, quando convocava todos os presentes para explicar sobre o funcionamento e objetivos do Juizado Informal e num outro momento para homologar a vontade das partes e tornar título extrajudicial o acordo celebrado.
A imprensa acompanhava a movimentação imprimida pela "justiça paralela", resolvendo os desentendimentos com rapidez, sem solenidade e sem despesa alguma para as partes. O funcionamento dos Conselhos despertou a atenção do Programa Nacional de Desburocratização, através do ministro Hélio Beltrão e seu fiel secretário, João Geraldo Piquet Carneiro. As observações e estudos promovidos geraram o Projeto de Lei n°. 1.950/83, mais tarde Lei n°. 7.244/84. O Programa buscou subsídios <_st13a_personname w:st="on" productid="em Nova Iorque">em Nova Iorque, onde funcionava a Small Claim Court desde o ano de 1934.
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou referido Projeto, e rejeitou emenda que exigia advogado para acompanhar as partes, tomando esta proposta como afronta à essência do sistema.
Juristas e importantes processualistas insurgiram-se contra a Lei n°. 7.244/84, publicada no dia 18.10.1984: Edgard Silveira Bueno Filho taxou-a de inconstitucional; Alir Ratacheski clamou pelo procedimento sumaríssimo ao invés dos Juizados; a Associação dos Advogados de São Paulo considerou o "anteprojeto dos Juizados Especiais sinal vivo de decadência do direito e da abolição da Justiça".
Em meio à discussão, o desembargador gaúcho, Luiz Melíbio Machado disse, muito apropriadamente:
"A maioria das pessoas passa a vida sem ter uma grande causa, mas não passa um dia sem enfrentar mil contrariedades".
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*Desembargador do TJ/BA