O STJ enfrentará em breve uma questão de relevância social e jurídica: a cobertura obrigatória de terapias multidisciplinares para pacientes com transtornos globais do desenvolvimento, como o TEA - Transtorno do Espectro Autista. Dois processos foram “afetados” pelo tribunal, o que significa que eles servirão de base para a fixação de uma tese jurídica de caráter vinculante, aplicável a todos os casos similares em tramitação no país.
O STJ assumiu a responsabilidade de decidir sobre esse assunto, o que tem possibilidade de redefinir (ou dificultar) o acesso a tratamentos de saúde no Brasil para pacientes com transtornos globais do desenvolvimento. A decisão que será tomada não só uniformizará o entendimento legal, como também influenciará profundamente o acesso à saúde e o equilíbrio entre direitos dos consumidores e as obrigações das operadoras de planos de saúde.
É importante destacar que, até que o STJ julgue o REsp, os processos em instâncias inferiores seguem tramitando normalmente. Apenas o julgamento definitivo nas instâncias locais ficará paralisado, aguardando a conclusão da tese pelo Tribunal Superior. Essa técnica, conhecida como "afetação", é utilizada para evitar decisões conflitantes entre os tribunais e promover a uniformidade de entendimento em temas relevantes.
Com isso, o STJ dá um passo fundamental para estabelecer parâmetros claros sobre a relação entre o direito à saúde e as limitações contratuais impostas pelos planos de saúde. A decisão afetará não apenas as famílias que dependem dessas terapias, mas também todo o setor de saúde suplementar, com impactos sociais e econômicos significativos.
O que está em jogo?
A controvérsia gira em torno da possibilidade de os planos de saúde limitarem ou recusarem a cobertura de tratamentos essenciais para pacientes com TEA e outras condições semelhantes.
Do ponto de vista jurídico, o debate se concentra em dois pilares fundamentais:
- O direito à saúde como garantia constitucional: Art. 196 da CF/88 estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado, o que tem sido interpretado como base para a regulação do setor privado.
- Os limites contratuais impostos pelos planos de saúde: As operadoras frequentemente argumentam que as terapias não previstas no rol da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar não são de cobertura obrigatória, gerando litígios constantes.
O STJ, ao definir uma tese jurídica sobre o tema, poderá pacificar o entendimento e influenciar diretamente o alcance do direito à saúde no Brasil.
Por que essa decisão é tão importante?
- Impacto no Direito à saúde: Uma decisão que determine a obrigatoriedade de cobertura terá um papel transformador, especialmente para famílias que dependem de terapias contínuas e de custo elevado. Pacientes com TEA, por exemplo, frequentemente necessitam de tratamentos multidisciplinares, como fonoaudiologia, terapia ocupacional e psicologia, que são essenciais para seu desenvolvimento.
- Uniformização da jurisprudência: Hoje, há decisões judiciais conflitantes sobre a obrigatoriedade de cobertura de tratamentos não listados no rol da ANS. Isso gera insegurança tanto para os pacientes quanto para as operadoras. Uma tese vinculante do STJ criará um norte jurídico, promovendo maior previsibilidade.
- Controle sobre os planos de saúde: Caso o STJ reforce a obrigação de cobertura, a decisão será um recado claro contra práticas abusivas. Muitos planos de saúde utilizam argumentos contratuais ou o rol da ANS como barreiras artificiais para limitar o acesso de pacientes a tratamentos necessários.
Os potenciais impactos na sociedade
A decisão não afetará apenas as famílias diretamente envolvidas, mas também poderá gerar consequências em várias esferas:
- Para os pacientes: Garantia de acesso a terapias indispensáveis para qualidade de vida.
- Para os planos de saúde: Eventual aumento de custos operacionais, o que pode ser repassado aos consumidores.
- Para o SUS - Sistema Único de Saúde: Redução da sobrecarga no sistema público, que por vezes absorve pacientes recusados pelos planos privados.
A importância da participação social
É crucial que a sociedade civil acompanhe de perto o julgamento no STJ. As operadoras de planos de saúde certamente estão mobilizadas, investindo em argumentos técnicos e lobby para minimizar seus custos. Do outro lado, cabe à sociedade pressionar por uma decisão que reflita o espírito da CF, priorizando o bem-estar e os direitos dos pacientes mais vulneráveis.
Organizações, associações de pais e profissionais de saúde devem articular esforços para que suas vozes sejam ouvidas, apresentando a realidade dos pacientes e a importância das terapias no contexto do desenvolvimento humano.
Conclusão: Um momento decisivo
O julgamento no STJ vai além de uma simples disputa entre consumidores e planos de saúde; ele reflete o compromisso do Judiciário com a proteção dos direitos fundamentais. A sociedade não pode se omitir nesse momento. A decisão que for tomada impactará a vida de milhares de pessoas, definindo os rumos do direito à saúde e o equilíbrio de forças entre os interesses econômicos e a dignidade humana.
Que essa decisão seja um marco de avanço e justiça social.