A república federativa do Brasil é uma federação composta pela união indissolúvel de seus Estados, municípios e Distrito Federal, de modo que não há uma hierarquia entre os diversos entes federativos, mas uma repartição de competências.
Por escolha do próprio constituinte, o desenho do federalismo brasileiro foi realizado com plena centralização de competências na União, que detém a atribuição para legislar sobre a maior parte das matérias que impactam significativamente o brasileiro no dia a dia, acerca de diversos temas, tais como Direito civil, penal, processual, comercial, eleitoral, direito do trabalho, desapropriação, águas, energia, telecomunicações, propaganda comercial, entre outros.
Ao ler a CF/88, dá para facilmente identificar que os demais entes possuem atribuições sobre temas que podem ser tratados pela União por meio de normas gerais e, na maior parte dos casos, objetos também de sua competência administrativa, sem mencionar a ampla competência tributária que propicia ao ente em questão maiores possibilidades econômicas, em verdadeira centralização de recursos.
Isso se dá por diversos motivos, como a própria formação do Estado brasileiro, caracterizado como uma federação centrífuga, isto é, por um contexto de Estado unitário que posteriormente se transforma em uma federação, com uma expansão, própria de uma desagregação, muito diferente do que ocorreu nos Estados Unidos, por exemplo, que passou por uma formação histórica completamente diferente, em que diversos Estados independentes se agregaram para formar um novo.
Dito isso, tendo em vista que a União centraliza diversas competências e possui capacidade econômica muito superior, é de pleno conhecimento que é o ente federativo com o condão de impactar o cidadão no dia a dia em maior proporção, fato que leva o brasileiro a dar muito mais importância às eleições e políticos da esfera Federal.
Os Estados e o Distrito Federal, por sua vez, apesar de disporem de menos recursos financeiros e competências em comparação com a União, ainda possuem significativa atenção do cidadão, por ocasião de seu papel fundamental na educação, saúde, segurança pública, transporte, entre outros.
Contudo, acerca dos municípios, é notório que os cidadãos não dão tanta atenção quanto deveria se dar, principalmente no que concerne ao Poder Legislativo local, sendo comum que as pessoas não se recordem dos políticos que os representam na casa legislativa, tampouco do próprio voto nas últimas eleições.
Nesse sentido, este artigo visa destacar a importância dos municípios, entes autônomos que igualmente dispõem de capacidade legislativa, financeira e administrativa, com poder de auto-organização, em um contexto de reconhecimento de um modelo de federalismo de cooperação.
Com efeito, muitos se indagam, principalmente durante o período eleitoral municipal, qual o impacto que o ente local é capaz de promover no dia a dia da sociedade, já que a mídia foca preponderantemente em autoridades e assuntos das esferas Federal e estadual.
A fim de responder ao questionamento de muitos, cabe esclarecer que a CRFB/88 designou que os municípios têm, dentre outras competências, legislar sobre assuntos de interesse local, além da suplementar a legislação Federal e estadual no que couber, nos termos do art. 30, I e II.
O ministro Alexandre de Moraes, ao abordar o assunto destacado, reputa que “Apesar de difícil conceituação, interesse local refere-se àqueles interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União), [...] Dessa forma, salvo as tradicionais e conhecidas hipóteses de interesse local, as demais deverão ser analisadas caso a caso, vislumbrando-se qual o interesse predominante (princípio da predominância do interesse)” (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 39ª ed. São Paulo: Atlas, 2023, p. 396).
E diversas matérias de significativa importância social se incluem no conceito de interesse local, como educação, saúde, segurança, meio ambiente, transporte público, proteção do patrimônio histórico-social, a questão essencial relativa ao ordenamento territorial, entre outros.
Significa dizer, não se deve subestimar a proporção que o ente local é capaz de afetar a sociedade no dia a dia, pelo fato de ter grande atuação na educação básica, na saúde pública por meio do Sistema Único de Saúde, na segurança com a guarda civil, na zeladoria necessária para o cotidiano, com a limpeza dos logradouros públicos, manutenção do asfalto, poda de árvores e plantação de mudas, no transporte público da circunscrição da cidade, com a utilização dos ônibus, com os serviços funerários, na promoção da cultura, além dos instrumentos próprios de ordenamento territorial, o que impacta no planejamento e controle do uso, parcelamento e da ocupação do solo urbano.
No ponto, não se desconhece que em capacidade econômica, os entes locais têm limitações que os demais entes não possuem, por ocasião do próprio sistema tributário atual.
Entretanto, a habilidade dos políticos em atrair investimentos para os seus municípios e obter, por consequência, maior renda, deve ser levada em consideração, na medida em que entes de elevada capacidade econômica inevitavelmente conseguirão transformar as receitas públicas em um retorno mais condizente com as necessidades da população.
Além disso, há no ordenamento jurídico diversos instrumentos de participação popular que os cidadãos não utilizam no dia a dia, normalmente por desconhecimento da legislação, como a possibilidade de propor emendas à lei orgânica municipal, participar de audiências e consultas públicas em matérias que tratam de leis orçamentárias e urbanísticas, fiscalizar as contas públicas e os representantes eleitos, entre outras.
O município também tem um papel relevante na universalização dos serviços públicos e na materialização dos direitos fundamentais das pessoas, em proporcionar o acesso de seus munícipes aos bens, serviços e condições indispensáveis a uma existência humana com dignidade.
Se há diferentes municípios dentro de um mesmo Estado, com capacidades econômicas semelhantes, mas com índices de desenvolvimento humano razoavelmente dissonantes, é notória a importância de se escolher gestões de qualidade.
Por todos os motivos apresentados, se faz necessário haver maior conscientização por parte da população quanto à importância devida aos entes locais, a fim de que seja possível escolher representantes que possam propiciar verdadeira melhoria na qualidade de vida da sociedade, cada qual com suas peculiaridades.