Não adianta tanta resistência!
Você ainda acredita que o direito como um dos mais antigos ramos da ciência humana, permanece imutável? E, que ser advogado ainda é a mesma coisa hoje ou na década de 90.
Muito tem se falado sobre a implementação de novas técnicas no exercício do Direito. Muito tem criado para a otimização dos processos internos para os escritórios de advocacia. Mas, e o Poder Judiciário?
Como tem caminhado o processo de técnicas disruptivas para o auxílio da atividade meio, ou atividade fim, do Poder Judiciário? Quais os projetos para que possamos aumentar sua produtividade e enxugar a máquina?
Em especial: Quando o juiz da minha causa será uma máquina?
O que parecia uma realidade tão distante já está em pleno uso!
Em 2017, o STF passa a utilizar o “VICTOR”. Uma inteligência artificial que apoiava as atividades de análise de admissibilidade recursal. O Projeto Victor busca encontrar temas de repercussão geral que se aplicam aos ARES e RES que chegam ao STF. A predição é construída com base em legislação, doutrina e jurisprudências acumuladas.
O TJMG, em 2018, implementou o SISTEMA “RADAR”, e julgou 280 processos em uma única sessão, que durou poucos segundos. O sistema radar identificou e separou recursos com pedidos idênticos, permitindo uniformização e agilidade.
No livro “Ensinando um Robô à Julgar”, Alexandre Morais Rosa e Daniel Boeing, propõe três modelos de inteligência artificial e indicam a clara possibilidade técnica e jurídica de desenvolver e utilizar algoritmos que permitirão atos decisórios. São eles:
- O robô classificador;
- O robô relator;
- O robô julgador.
Claro que, aqui não pretendemos a análise profunda deste trabalho, apenas a necessidade de discussão e para evidenciar que podemos preservar as garantias dos direitos fundamentais e os princípios que regem o processo.
Entidades conservadoras protestam, assim como protestaram em diversos outros momentos de inovação. Temem o que não compreendem e se recusam até mesmo a admitir tudo o que pode advir de bom quando a inteligência artificial é usada de modo democrático.
Parece razoável acreditar que o juiz, descrito no art. 93 e seguintes da CF/88 é uma pessoa natural. Em 1988, o constituinte originário não previu robôs e sistemas de inteligência artificial. Mas, em 2020 o CNJ regulamenta o uso da inteligência artificial, e os cuidados necessários na aplicação desta técnica. Ficam claras as preocupações com os princípios éticos, o respeito a fairness, acountability, transparency, tudo muito evidente no texto. Mas, são arcabouços advindos de atos administrativos, sem legislação específica.
A intenção do CNJ não foi a de regulamentar a inteligência artificial na atividade fim do magistrado, mas que servem para auxiliar sua atividade jurisdicional, sempre com a possibilidade de intervenção e revisão humana.
O CNJ, publica no dia 25 de agosto de 2020 resolução 332/20, e em seus arts. 17, 18 e 19, reforçando a necessidade do elemento humano nas decisões finais. Possibilitam a revisão dos atos e reforçam a transparência decisória, tratando da necessidade de se indicar os passos que conduziram à decisão sugerida pela inteligência artificial.
Eu, como entusiasta do tema, aceito tudo o que a tecnologia tem para me oferecer e sigo pesquisando, para garantir a confiabilidade dos sistemas de inteligência artificial, em especial nas garantias da autonomia humana, prevenção de danos e a não discriminação.
Concluindo que os avanços tecnológicos são irrefreáveis (um fato!), cabe ao advogado compreender a complexidade e toda a responsabilidade que o tema exige para a correta e adequada proteção dos seus clientes. E, a transferência destas decisões para o robô não significa o fim do subjetivismo e da discricionariedade.
Por mais incrível que seja o Projeto Victor, por mais minucioso, sabemos que um tema que hoje seja considerado de repercussão geral aparente, poderá, com o tempo, ter sua aplicação alterada. E, para isso, dependeremos do controle humano do trabalho.
E, o ato de julgar, que já nem era assim tão solitária, pois já contava com a fundamentação em jurisprudências, de trabalhos jurídicos e ainda com uma equipe de assessores, agora conta com a pré-elaboração necessária, para o conhecimento da máquina, e será assessorada por algoritmos.
E os advogados devem se preparar para conhecer todas as defesas processuais cabíveis, e também alguns termos como “tratamento de dados”, “auditabilidade”, “manto da invisibilidade”, só como exemplos.
Mas, tenho algumas considerações que ainda me fazem ficar atenta a estes projetos. Considero ser direito fundamental de qualquer pessoa, ter seu caso examinado em suas peculiaridades, a fim de se evitar violações a princípios constitucionais ou mesmo à homogeneização de julgamentos pelo STF, decorrentes de julgamentos realizados exclusivamente pelo Victor.
E, ainda, pelo fato de que, a efetiva implantação destes projetos nos tribunais brasileiros, tiveram pouca participação da sociedade, ou mesmo da comunidade jurídica.
Então, respondendo à pergunta sobre “quando o robô vai sentenciar a sua causa”?
A atual proposta é para decisões automatizadas em atividades repetitivas e burocráticas. Nada além disso!!!
O olhar do juiz, o seu convencimento, o trato humanizado, os detalhes que vão além do repetitivo, não podem ser desconsiderados. A capacidade humana ainda prevalece sobre a tecnologia.
E quanto a nós, advogados, continuamos sendo imprescindíveis à democracia. Vamos nos preparar para entender e atentar para os desafios éticos na utilização de IA, na transparência dos algoritmos, na necessária imparcialidade ou nos vieses presentes nos dados e, principalmente, na responsabilidade pelo uso ético da tecnologia.