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Enchentes no RS: Medida provisória prorroga prazo de concessão do Drawback

A medida provisória 1.266 estendeu o prazo da concessão do Drawback por mais um ano às empresas beneficiadas e atingidas pelas inundações que acometeram o estado do Rio Grande do Sul.

23/10/2024

Noticiadas em todos os meios de comunicações do Brasil, as fortes chuvas que atingiram o estado do Rio Grande do Sul, em abril de 2024, geraram grandes impactos na região. De acordo com a Secretaria de Comunicação do Estado, cerca de 478 municípios (aproximadamente 96,17%) sofreram com as enchentes, afetando uma população de 2,39 milhões de pessoas, com 806 feridos e 183 óbitos confirmados. O evento trágico ocasionou grande repercussão nacional e a soma de esforços do país inteiro para auxiliar a população local1.

Além do impacto ambiental e social, o Rio Grande do Sul sofreu uma grande implicação no seu setor econômico em razão da dificuldade de manter as suas relações comerciais ante a catástrofe. Segundo a Federação das Industriais do Rio Grande do Sul (FIERGS), em torno de 94% das atividades econômicas do estado foram abaladas. E claro, o comércio exterior não ficou de fora da estatística2.

De uma maneira demonstrativa, segundo os dados da secretaria municipal de meio ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (SMAMUS) de Porte Alegre, 45.970 empresas foram afetadas, sendo 29.048 empresas de serviços, 11.320 de comércio, 5.496 industriais e 106 de outros ramos3.

Para ter uma rápida compreensão da importância do comércio exterior gaúcho, consta nos dados colhidos pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) que o Rio Grande do Sul, em 2023, representou o 6º lugar no ranking de importações (valor total de US$ 13.762,2 milhões) e exportações (valor total de US$ 22.307,9 milhões) no Brasil. Em comparação, no ano de 2024, entre os meses de janeiro a setembro, mesmo com as adversidades, o estado riograndense se encontra na 7ª posição do ranking de exportação, acumulando o valor de US$ 15.349,9 milhões, e na 8ª posição referente à importação, com US$ 9.746,8 milhões. Os principais produtos exportados são a soja e o tabaco descaulificado ou desnervado, e os produtos mais visados na importação são os óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos, crus, e adubos fertilizantes químicos (exceto fertilizantes brutos)4.

Em decorrência da maior inundação registrada na história do Rio Grande do Sul, atingiu-se as estruturas logísticas do estado, com a interdição de estradas, aeroportos internacionais e terminais portuários, que tiveram suas atividades reduzidas. O setor que mais sofreu com as consequências foi o da importação, o qual obteve a menor índice desde maio de 2020. Já as exportações apresentaram uma queda pequena comparadas às oscilações comuns5.

Com o objetivo de incentivar o desenvolvimento das indústrias nacionais, fomentar a competitividade e conceder condições de lidar com o comércio exterior, os regimes aduaneiros especiais consistem em tratamentos fiscais peculiares concedidos à empresas exportadoras e importadoras, visto que suspendem, isentam ou restituem os tributos exigidos nessas operações.

Para cada regime aduaneiro estabelece-se requisitos legais e prazos de vigência a serem respeitados pela empresa beneficiária para se obter os benefícios ficais nos créditos tributários incidentes no processo de importação e exportação

O Drawback, especificamente, se trata de um regime aduaneiro especial cujas modalidades permitem a suspensão, isenção ou restituição de tributos decorrentes da importação de insumos utilizados na industrialização de produtos destinados à exportação, com previsão no art. 78 do Decreto-Lei 37 de 19666.

A modalidade de suspensão estabelece atinge os seguintes tributos: imposto de importação, IPI, PIS, COFINS, ICMS e AFRMM (de acordo com o art. 2º, da portaria SECEX 44/20). Na modalidade de isenção, por sua vez, não há recolhimento dos seguintes tributos: imposto de importação, IPI, contribuição do PIS/Pasep, COFINS, contribuição PIS/PASEP-importação e da COFINS-importação (art. 48 da portaria SECEX 44/20)7.

De acordo com o art. 307 do decreto 6.759/098, o prazo de suspensão do pagamento das obrigações fiscais pela aplicação dos regimes aduaneiros especiais, na importação, será de até um ano, prorrogável, a juízo da autoridade aduaneira, por período não superior, no total, a cinco anos. Sendo assim, tal regra também se aplica ao regime do Drawback.

Neste contexto, foi publicada no Diário Oficial da União, no dia 15 de outubro de 2024, a medida provisória 1.2669 determinou a prorrogação excepcional dos prazos do regime Drawback isenção, suspensão e de redução a zero de alíquotas por mais um ano. Essa posição do governo teve como objetivo auxiliar as empresas importadoras e exportadoras atingidas pelas inundações no Rio Grande do Sul, incentivando a reestruturação econômica do estado.

A Medida prevê que a prorrogação incide em duas hipóteses: a) quando se tratar de suspensão e isenção, aplica-se às pessoas jurídicas beneficiárias de atos concessórios com domicílio no Estado do Rio Grande do Sul, quando beneficiadas na modalidade isenção; b) quando se tratar exclusivamente da modalidade de suspensão, aplica-se às empresas denominadas fabricantes intermediários não domiciliadas no Estado do Rio Grande do Sul, com vistas à industrialização de produto intermediário a ser ou que já tenha sido diretamente fornecido a empresas industriais-exportadoras domiciliadas na referida unidade da federação, para emprego ou consumo na industrialização de produto final destinado à exportação.

Logo, não há necessidade de a empresa vinculada ao ramo do comércio exterior ter sua sede dentro dos limites do território do Rio Grande do Sul, no entanto, deve ser fabricante-intermediária, ou seja, fornecedora de produtos para industrialização de outros produtos a serem destinados à exportação.

Outra questão que deve ser observada pelas empresas interessadas na prorrogação do prazo diz respeito ao Ato Concessório, o qual consiste em um documento responsável pelo registro das operações utilizando o regime aduaneiro especial, vinculando-o ao referido instrumento. A medida provisória determina que, tanto na suspensão, quanto na isenção e alíquota zero, é necessária a previsão do termo final do ato concessório dentro do período compreendido entre 24 de abril e 31 de dezembro de 2024.

Além disso, vale ressaltar que o prazo já deve ter sido prorrogado pela autoridade aduaneira competente anteriormente.

A medida provisória em tela está vigente e produzindo efeitos desde a data da sua publicação, entretanto, ainda está pendente de apreciação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para convertê-la em lei.

As enchentes do Rio Grande do Sul afetaram grande parte da economia da região, sendo assim, é preciso adotar medidas que visam reduzir os danos e reestruturar o estado. Os regimes aduaneiros especiais podem ser de grande valia quando utilizados para essa questão.

A prorrogação do prazo de concessão do Drawback pela medida provisória 1.266/24 é apresentada em um momento oportuno, de crise do estado, caracterizando-se como uma forma de auxiliar as empresas atingidas pela catástrofe no Rio Grande do Sul, tentando retomar o nível de exportações e importações, assim como reestruturando as relações comerciais exteriores.

________

1 SOS Rio Grande do Sul: Situação dos Municípios. Secretaria de Comunicação. Disponível em: https://sosenchentes.rs.gov.br/situacao-nos-municipios. Acesso em: 19 out. 2024.

2 PESQUISA da FIERGS mostra industriais do RS sem confiança. FIERGS, 20 jun. 2024. Disponível em: https://www.fiergs.org.br/noticia/pesquisa-da-fiergs-mostra-industriais-do-rs-sem-confianca. Acesso em: 19 out. 2024.

3 IMPACTOS das cheias de maio de 2024 em Porto Alegre/RS. Prefeitura de Porto Alegre, 2024. Disponível em: https://prefeitura.poa.br/inundacoes. Acesso em: 19 out. 2024.

4 BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. ComexVis, 2024. Disponível em: https://comexstat.mdic.gov.br/pt/comex-vis/5/45. Acesso em: 19 out. 2024.

5 IMPACTOS iniciais das enchentes na atividade econômica do RS. Banco do Brasil: relatório de inflação, 2024. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/content/ri/relatorioinflacao/202406/ri202406b1p.pdf. Acesso em: 19 out. 2024.

6 BRASIL. Decreto-lei nº 37, de 18 de novembro de 1966. Dispõe sobre o imposto de importação, reorganiza os serviços aduaneiros e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0037.htm. Acesso em: 20 out. 2024.

7 BRASIL. Ministério da Economia. Secretaria de comércio exterior. Portaria nº 44, de 24 de julho de 2020. Dispõe sobre o regime aduaneiro especial de drawback e altera a Portaria SECEX no 23, de 14 de julho de 2011, que dispõe sobre operações de comércio exterior. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 de julho de 2020. Seção 1, Página 11. Disponível em: https://www.gov.br/siscomex/pt-br/legislacao/PortariaSecex44de2020Drawback.pdf. Acesso em: 20 out. 2024.

8 BRASIL. Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009. Regulamenta a administração das atividades aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6759.htm. Acesso em: 20 out. 2024.

9 BRASIL. medida provisória nº 1266, de 14 de outubro de 2024. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 15 out. 2024. Seção 1, p. 1. Disponível em: https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/165735#tramitacao_10941201. Acesso em: 20 out. 2024.

Felipe Fukuyama Bernini
Discente do 4º ano de graduação do Curso de Direito, mantido pela Instituição Toledo de Ensino (ITE) em Bauru/SP. Autor de artigos científicos relacionados ao tema de Direito Aduaneiro.

Gabrielli de Alvarenga Simoni
Graduanda do 4° ano do Curso de Direito, da Instituição Toledo de Ensino (ITE). Autora de artigos científicos relacionados ao Direito Aduaneiro.

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