1. Introdução
A recente decisão do STF no Tema 6 trouxe novos parâmetros que afetam diretamente os usuários do SUS que buscam medicamentos de alto custo não incorporados na lista oficial. O STF, com maioria formada pelos votos dos ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, estabeleceu critérios rígidos para que esses medicamentos possam ser obtidos por meio de decisões judiciais, tornando o processo mais restritivo e focado em situações excepcionais.
Para que o Judiciário autorize o fornecimento de um medicamento que não faz parte das listas do SUS, o paciente precisa cumprir uma série de exigências. Agora será necessário:
- Provar que o fornecimento foi negado administrativamente pelo SUS;
- Comprovar que o medicamento possui inscrição na Anvisa - Agência Nacional de Vigilância Sanitária;
- Comprovar que não há substitutos viáveis entre os medicamentos já fornecidos pelo SUS;
- Demonstrar a eficácia e segurança do medicamento com base em evidências científicas robustas (o que significa dizer que será necessária a apresentação de ensaios clínicos ou meta-análises robustas).
- Comprovar a indispensabilidade do tratamento para a condição de saúde do paciente.
- Evidenciar a incapacidade financeira de adquirir o medicamento por conta própria.
2. Problemática enxergada pelo STF
Esses novos requisitos foram estabelecidos em uma espécie de resposta do STF à preocupação do Estado com o impacto financeiro da judicialização na saúde pública. A concessão de medicamentos via decisões judiciais, quando feita sem critérios técnicos, pode comprometer o orçamento do SUS e afetar negativamente a maioria da população que depende do sistema.
No entanto, diante deste novo cenário, podemos enxergar que pacientes com doenças raras ou que necessitam de terapias experimentais tenderão a enfrentar ainda mais obstáculos para conseguir medicamentos pela via judicial. A decisão do STF exige um equilíbrio entre a proteção individual e a sustentabilidade do sistema, e aponta para a importância de seguir as diretrizes técnicas, como as da Conitec, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.
Ainda que essas medidas visem maior controle e eficiência, é fundamental que cada caso seja analisado com cautela, considerando as necessidades específicas do paciente.
3. Do requisito do respeito à medicina daseada em evidências
A exigência de que o medicamento solicitado judicialmente seja respaldado por evidências científicas robustas é um ponto central da decisão. Isso inclui a apresentação de estudos clínicos randomizados, revisões sistemáticas e meta-análises que comprovem a eficácia e a segurança do fármaco.
A abordagem baseada em evidências é fundamental para garantir que os recursos públicos sejam usados de forma eficiente e em tratamentos que realmente ofereçam benefícios comprovados. O STF adota, assim, uma postura de maior deferência às análises da Conitec, órgão técnico que avalia a incorporação de novas tecnologias de saúde ao SUS com base em critérios como custo-efetividade, impacto orçamentário e eficácia comprovada.
4. Critérios de excepcionalidade
Embora a decisão busque limitar o fornecimento indiscriminado de medicamentos não incluídos nas listas do SUS, ela abre espaço para exceções. Para que um paciente possa obter o medicamento via judicial, deve ser demonstrado que não há outra alternativa terapêutica disponível no SUS e que o tratamento é indispensável para a sua sobrevivência ou melhora significativa da qualidade de vida. Essa excepcionalidade também inclui a necessidade de comprovar que o pedido de incorporação do medicamento foi negado de maneira arbitrária ou que houve mora no processo de avaliação pela Conitec?.
5. Sustentabilidade do sistema
Um dos grandes argumentos que sustentam as novas regras é a proteção da sustentabilidade financeira do SUS. O STF reconhece que a judicialização excessiva, sem critérios claros, pode desestabilizar o orçamento público, já que decisões favoráveis a pacientes específicos podem ter efeitos sistêmicos negativos.
A concessão de medicamentos de alto custo a indivíduos, sem considerar o impacto coletivo, supostamente poderia prejudicar o funcionamento do sistema como um todo. Dessa forma, a Corte buscou garantir um uso racional e equilibrado dos recursos, respeitando as diretrizes públicas e evitando que decisões judiciais isoladas criem privilégios desiguais no acesso à saúde?
6. Interferência judicial e limites
A decisão reforça que o Poder Judiciário deve atuar de maneira subsidiária nas políticas públicas de saúde, respeitando as avaliações técnicas de órgãos como a Conitec. O julgamento reafirma que a expertise técnica desses órgãos deve prevalecer, limitando a reavaliação judicial em casos de medicamentos não incorporados. Ao impor essa barreira, o STF sinaliza que o Judiciário não deve invadir competências próprias da Administração Pública, como a gestão de recursos de saúde, salvo em situações onde ocorra claro abuso ou omissão?.
7. Questões orçamentárias e gestão pública
Outro ponto relevante da decisão é a crítica implícita à má gestão de recursos e à alocação ineficiente dos investimentos no SUS. O STF reconhece que a judicialização, por si só, não é a principal causa do desequilíbrio orçamentário do SUS, mas sim a falta de um gerenciamento eficaz. A decisão sublinha que o problema não é apenas a demanda por medicamentos de alto custo, mas também a gestão inadequada dos recursos públicos e a necessidade de uma política de saúde mais eficiente, que contemple tanto a inovação terapêutica quanto a capacidade de financiamento do sistema?
8. Do prejuízo que o Tema 6 causará na luta pelo direito à saúde
A decisão do STF no Tema 6 claramente prioriza a preservação do orçamento público em detrimento ao direito à saúde dos cidadãos. Ao estabelecer critérios mais rigorosos para o fornecimento judicial de medicamentos de alto custo, a Corte demonstrou uma preocupação predominante com os impactos financeiros da judicialização da saúde, justificando que a concessão indiscriminada de medicamentos poderia comprometer o funcionamento do SUS.
No entanto, ao fazer isso, a decisão negligenciou a realidade de muitos pacientes que, sem essas terapias, enfrentarão o agravamento de suas condições ou até a morte. Embora seja inegável a importância de preservar os recursos públicos, a saúde deveria ser tratada como um direito fundamental, e não como um privilégio condicionado à capacidade financeira do Estado?
9. Conclusão
Com o julgamento do Tema 6, o STF estabeleceu um marco importante para o equilíbrio entre o direito individual à saúde e a sustentabilidade do SUS. Ao exigir critérios rigorosos para a concessão judicial de medicamentos fora das listas do SUS, a Corte protege a eficiência do sistema de saúde pública, mas também cria desafios adicionais para pacientes que dependem de terapias de alto custo.
Assim, é crucial que os advogados que atuam na defesa dos direitos desses pacientes estejam bem preparados para reunir as provas e documentações exigidas, além de garantir que seus clientes atendam aos critérios excepcionais estabelecidos pela decisão.
Para os pacientes, a orientação de um advogado especializado será crucial para navegar por esses novos critérios e assegurar o acesso ao tratamento.