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A prática da shorlist no Brasil: Sua viabilidade jurídica e política

Nos Estados Unidos o perfil de futuros ministros para a Suprema Corte é debatido na campanha presidencial. São as chamadas shorlists. Seria isso possível no Brasil?

10/10/2024

I. Terrivelmente evangélico

O Brasil acordou em 10/7/19 debatendo a frase do então presidente Jair Bolsonaro afirmando que indicaria um “ministro terrivelmente evangélico” para o STF. A comunidade jurídica ficou escandalizada. A opinião de setores não afetos ao Direito mais ainda. O campo político se viu em polvorosa.

A frase simplesmente externou aquilo que todo presidente sempre faz: eleger um perfil para seus indicados. A grande diferença naquele evento: o então presidente externou e trouxe ao debate público sua posição e o perfil que alegadamente desejava para nomeação.

Além disso, o então presidente cumpriu uma promessa de campanha, no sentido de fazer um governo voltado às aspirações de grande parte da população que o elegeu, sabidamente de maioria dita “conservadora”.

Não precisamos concordar com o perfil. Não precisamos aceitar a expectativa da grande massa de votantes que esperava daquele presidente que imprimisse em sua gestão o viés político alardeado no horário eleitoral. Perfil que o fez merecedor de votos. Ou seja: que cumprisse o que prometeu.

O que não se pode desconhecer é que o tema “indicação de ministros e outros juízes” deve ser trazido à arena pública. E isso pode agregar valor para o eleitor. E votos para os políticos.

II. O que são as shortlists nos Estados Unidos?

Nos Estados Unidos da América o perfil de futuros ministros para a Suprema Corte é escrutinado desde muito cedo.

Candidatos a presidente da república apontam o que esperam de um futuro Supreme Court Candidate. Não necessariamente fazem uma lista formal; algumas vezes traçam apenas o perfil. Mas na maioria das situações há de fato uma lista de prováveis nomes para futuras vagas e nomeações. As chamadas shorlists.

E sim, os eleitores têm o direito de opinar se aqueles nomes de futuros possíveis nomeados lhes agradam ou não. O eleitor fala na hora do voto. A lista vira tema de campanha eleitoral.

Abrasileirando a expressão, seriam um tipo de listas preliminares de possíveis candidatos a nomeações. Doravante usaremos: lista preliminar.

É algo parecido com o Oscar para o cinema: o ator ou a atriz entram previamente numa lista de “Indicados ao Oscar de melhor ator”, mas, nem sempre ganham a estatueta ao final. E são várias categorias: Diretor; ator/atriz principal; ator/atriz coadjuvante; roteiro; e vários outros.

Isso traz uma questão adicional: a exemplo do Oscar, que tem várias categorias, essas listas preliminares também podem orientar outras nomeações, além da Suprema Corte. Os juízes de “Circuitos”, por exemplo. Algo como os desembargadores dos nossos regionais Federais.

III. Efeitos de estar na lista preliminar

Estar em uma shortlist ou lista preliminar é tanto um privilégio quanto um fardo.

Um privilégio, pois, é possível notar que parcela da assessoria de autoridade com capacidade de decisão (de fazer uma nomeação) para cargos de alta relevância, entendeu que o nome de certo profissional é relevante.  

Mas, é um fardo, pois ele ou ela que forem listados passarão ao escrutínio público sem nem mesmo terem sido nomeados para absolutamente nada.

Como diria o juiz Brandeis da Suprema Corte Americana: “o melhor alvejante é a luz do sol”. A prática traz para a arena pública aquele debate.

O próprio debate público a respeito dos nomes que constam na lista preliminar auxiliará o presidente da república — ou os governadores de Estado, como veremos adiante — ao tempo da efetiva nomeação.

IV. O Brasil: Os cargos que poderiam receber listas preliminares de potenciais candidatos

A CF/88 brasileira traz uma série de cargos que são vitalícios e que, por isso mesmo, envolvem uma alta relevância republicana. Tanto a nível Federal quanto a nível estadual.

Na seara Federal temos os ministros do STF, STJ e TST, além do Tribunal de Contas da União. Não bastando isso, há as vagas para os desembargadores dos Tribunais Regionais Federais.

Na seara Estadual temos os desembargadores dos Tribunais de Justiça, além do Tribunal de Contas do Estado ou dos municípios (onde existem).

Portanto, a noção de lista preliminar não se limita ao nível Federal e, muito menos, apenas à ideia de nomeação para o STF.

Os políticos, especialmente os que mais se proclamam conservadores devem ter essa preocupação desde sempre. Primeiro para que atraiam a atenção e o voto de seu eleitorado, e, segundo, para que façam boas escolhas.

V. A atenção do eleitorado brasileiro cresce nesse tema das nomeações

Nos Estados Unidos é uma realidade a discussão entre os eleitores a respeito de um “perfil” ou uma “lista” para futuras nomeações em Tribunais Federais e a Suprema Corte.

Famosa é a atuação da Federalist Society ou FedSoc - Sociedade Federalista, um Think Thank republicano e conservador para a área jurídica, que, dentre outras realizações, formula avaliações de nomes para estas listas preliminares em governos republicanos.

No Brasil este tema passou a ser foco de atenção nos últimos anos. Há uma frase meio cômica, mas, cheia de razão: “hoje a população está mais atenta à composição do Supremo Tribunal do que para a escalação da seleção brasileira de futebol.”

“Arroz e feijão do político é o voto”, já dizia um sábio vereador do interior do Espírito Santo. E se o tema “perfil de futuros juízes a serem nomeados” é do interesse de quem vota, seguramente esse assunto deve ser, no mínimo, objeto de atenção para a classe política, que precisa dos votos.

VI. Fim

Como visto o texto acima é flagrante defesa do expediente das listas preliminares. O eleitor nacional, hoje, tem absoluto e legítimo interesse de conhecer potenciais nomes que seus constituintes pretendem apoiar para futuras nomeações de cargos vitalícios.

De toda sorte, ainda que não sejam tão publicizadas como ocorre em outros países, especialmente nos Estados Unidos, instituições conservadoras deveriam se ocupar de fazer esse prévio escrutínio. Até mesmo para auxiliar seus representantes eleitos na hora daquelas escolhas.

Algo assemelhado àquilo que a FedSoc realiza, com muito sucesso, nos Estados Unidos. Basta olhar a composição atual da Suprema Corte de cada um dos países. Nos EUA a sociedade federalista, especialmente, ajudou a construir uma composição mais republicana do tribunal (6 x 3).

Luiz Henrique Antunes Alochio
Doutor em Direito (Uerj). Mestre em Direito Tributário (UCAM). Visiting Scholar - Florida State University (2022/23). Advogado (ES). Conselheiro Federal OAB (2019/2022). Redes sociais: @luiz_alochio

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