Nos últimos anos, as chamadas Stock Options vêm se tornando cada vez mais comum no Brasil. Porém a falta de regulamentação normativa gera diversos questionamentos tributários.
Sem regulamento expresso no ordenamento jurídico brasileiro, as Stock Options possuem sua permissão no art. 168, §3º da Lei n. 6.404/1976, dispondo que “o estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com o plano aprovado pela assembleia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.”
Para compreender a natureza jurídica das Stock Options, partimos da premissa de que são planos de opção de compra de ações que uma empresa concede aos seus próprios colaboradores, especialmente com a finalidade de compensar, atrair e manter aqueles que mais se destacam, ou ainda da concessão, pela empresa, dessas ações. Aqui, ressaltamos que se trata de uma faculdade da empresa e do funcionário, não uma obrigação. As Stock Options são concessões dadas a um empregado do direito de comprar, ou de receber, ações da empresa em que trabalha por um valor abaixo da média do mercado e, depois de determinado período, poderá vende-las.
No caso de compra das ações por um valor inferior, em um primeiro momento, há a outorga da oportunidade pela empresa ao colaborador de adquirir as ações por um valor fixado inferior à média do mercado se continuar no quadro de funcionários durante um tempo (vesting period). Depois, o colabordor tem o direito ao exercício da aquisição das ações, porém mais uma vez precisa aguardar um espaço temporal para a possibilidade de venda (lock-up).
Em outras palavras, as Stock Options são direitos adquiridos pelo colaborador da compra de ações no futuro por um preço anteriormente fixado com a possibilidade de venda depois de mais um período.
Na prática, esses planos de opção da empresa são um incentivo para aqueles colaboradores que desempenham suas funções com prestígio, de modo que continuem trabalhando com o mesmo afinco para seu crescimento, já que a partir do momento que compra ou ganha a ação, a empresa de alguma forma também passa a ser sua, além de reduzir a rotatividade de quadro de funcionários.
Como não existe uma norma jurídica que as regule, cada empresa possui suas próprias regras de aquisição, manutenção e venda pelos funcionários, causando ainda muitas dúvidas sobre seu funcionamento.
Durante anos, houve algumas discussões no CARF e na justiça federal sobre a natureza das Stock Options ser mercantil ou remuneratória. Por um lado, a maioria dos julgados do CARF era no sentido de incidência de contribuições previdenciárias por as Stock Options terem natureza remuneratória, por outro, julgados da justiça federal eram mais no sentido contrário, de que as Stock Options possuem natureza mercantil, de modo que deve incidir Imposto de Renda.
Outra dúvida que rondava as Stock Options era o momento da incidência tributária: (i) momento da efetiva compra das ações pelo empregado depois do vesting period, (ii) durante o período que o empregado precisa esperar, depois da compra das ações, para poder vende-las (lock up), ou (iii) momento da venda das ações.
Há poucos dias, porém, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Tema 1.226, a nosso ver de maneira brilhante, que, finalmente, definiu a natureza das Stock Options como sendo mercantil, bem como o momento em que ocorre a incidência tributária. Assim, os empregados pessoas físicas devem ser tributadas com o Imposto de Renda no momento da venda das ações, com as alíquotas variando de 15 a 22,5%, e não com as contribuições previdenciárias e alíquota do Imposto de Renda chegando a 27,5%, como seria no caso de reconhecimento da natureza remuneratória.
O julgado determinou que, “no regime do stock option plan (art. 168, §3º, da lei 6.404/1976), porque revestido de natureza mercantil, não incide o imposto de renda pessoa física/IRPF quando da efetiva aquisição de ações, junto à companhia outorgante da opção de compra, dada a inexistência de acréscimo patrimonial em prol do optante adquirente. Incidirá o imposto de renda pessoa física/RIPF, porém, quando o adquirente de ações no Stock Option Plan vier a revendê-las com apurado ganho de capital.”
Este entendimento do STJ corrobora o art. 2º do PL 2.724/221, que trata do “regime dos planos de outorga de opção de compra de participação societária – Marco Legal das Stock Options”, em tramitação no Senado Federal, que define a natureza mercantil da outorga da opção de compra e venda. Um dado importante desse Projeto de Lei é que não há a concessão das ações pelas empresas aos colaboradores, apenas a compra e venda.
Agora vamos às mudanças que podem ocorrer com a Reforma Tributária. O art. 4º do PL 68/2024, que trata sobre o fato gerador do IBS e da CBS, determina que estes tributos incidem sobre “operações onerosas com bens ou com serviços”. Mais adiante, os arts. 170 e ss tratam da incidência do IBS e da CBS sobre os serviços financeiros, e aqui, no que concerne às Stock Options, destacamos o art. 171, VII2 que especificamente dispõe que o arrendamento mercantil por meio da cessão de direitos é um serviço financeiro.
Sendo assim, será que existirá a tributação sobre a venda das ações das Stock Options pelo colaborador, além da tributação do Imposto de Renda devido ao ganho de capital, por conta da sua definição como serviço financeiro passível de incidência pelo IBS e pela CBS?
Hoje, o que sabemos é que o IBS e a CBS incidirão sobre mais atividades de consumo, já que as hipóteses de incidência aumentaram. Por exemplo, como apontado, os arts. 170 e ss preveem a tributação pelo consumo sobre os serviços financeiros, que não existe no ordenamento jurídico tributário atual, como operações de crédito, operações de câmbio, arrendamento mercantil, entre outros.
Como o texto do art. 4º mencionado acima, o IBS e a CBS incidirão sobre operações onerosas com bens ou com serviços, e, conforme o art. 171, VII, sobre arrendamento mercantil de cessão de direitos referente à serviços financeiros.
Por operações onerosas, entendemos como aquelas que geram vantagens e obrigações valorativas para as partes envolvidas. No âmbito do Direito, ainda, um contrato oneroso, que gera uma operação onerosa, exige uma contraprestação, geralmente financeira, de uma ou mais partes. Em uma operação de compra e venda, por exemplo, uma parte se compromete a entregar um bem ou direito à outra mediante o pagamento de uma quantia.
Arrendamento mercantil, por sua vez, é contrato que permite que uma pessoa, o arrendatário, use por um período bem ou direito de outra, o arrendador. Arrendamento mercantil por meio da cessão de direitos, desse modo, é negócio jurídico que arrenda direitos de uma pessoa para outra, não precisando, necessariamente, ser oneroso. Portanto, o colaborador, caso queira arrendar suas ações à terceiro e não as vender, também correrá o risco de sofrer a cobrança de IBS ou CBS.
Com isso, em uma primeira leitura, podemos depreender que a venda de uma ação pelo colaborador oriundo de um plano de Stock Option ou seu arrendamento por meio da cessão de direitos, poderá sim acarretar a incidência do IBS ou CBS por se tratar de uma operação onerosa de bem sobre o consumo ou de cessão de direito. Mas claro que muitas mudanças ainda ocorrerão até que os novos textos inseridos possam prever as peculiaridades e particularidades das relações de consumo. O presente artigo é apenas uma possível interpretação do texto atual do PL 68/2024 em cima de um recorte muito pequeno. O importante é não perder nenhum detalhe das movimentações e discussões que ainda surgirão, sempre com a função de respeitar o ordenamento jurídico tributário, as relações entre o Fisco e o contribuinte, e, acima de tudo, os princípios constitucionais.
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1 Art. 2º. São elementos intrínsecos aos instrumentos do plano de opções:
(...) Parágrafo único. A opção de compra de participação societária outorgada nos termos previstos nesta Lei possui natureza exclusivamente mercantil, conforme previsão contida no art. 168, §3º, da lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das Sociedades por Ações), e não se incorpora ao contrato de trabalho nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista ou previdenciário ou tributo.
2 Art. 171. Para fins desta Lei Complementar, consideram-se serviços financeiros:
(...)
VII – arrendamento mercantil (leasing), operacional ou financeito, de quais bens, incluindo a cessão de direitos e obrigações, substituição de garantia, alteração, cancelamento e registro de contrato e demais serviços relacionados ao arrendamento mercantil.