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O programa de incentivo à cultura (PIC) do estado de Santa Catarina: Benefícios fiscais de dedução de ICMS e desconto em dívidas ativas

O programa de incentivo à cultura (PIC) de SC oferece dedução de ICMS e desconto de 25% em dívidas ativas para empresas que apoiam projetos culturais.

26/9/2024

1. ICMS em Santa Catarina: Benefícios fiscais decorrentes do programa de incentivo à cultura

Visando promover a cultura e valorizar a produção artística regional, a lei Estadual 17.942, de 20201, instituiu o incentivo fiscal denominado de PIC - “Programa de Incentivo à Cultura” no âmbito do estado de Santa Catarina. Inicialmente, a benesse fiscal produziria efeitos até o dia 30 de junho de 2022, mas veio a ser prorrogada até o dia 30 de abril de 2026 por força do convênio ICMS 226/23/SC. 

Em síntese, a legislação estadual permite descontos em dívidas ativas e deduções mensais no ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços aos “incentivadores”, assim entendidos como contribuintes ou pessoas jurídicas que apoiem financeiramente projetos culturais (art. 2º, inc. I, lei  17.942/20) devidamente aprovados pela FCC - Fundação Catarinense da Cultura.

Examinaremos, no presente artigo, como este incentivo fiscal pode proporcionar vantagens significativas ao empresariado catarinense, facilitando a regularização de suas obrigações tributárias ao mesmo tempo em que fomenta a cultura local.

2. Dedução de ICMS pelo contribuinte incentivador da cultura em Santa Catarina

Segundo a lei Estadual 17.942/20, a dedução máxima de ICMS permitida varia de acordo com a receita bruta anual da empresa2, aferida em conformidade com o valor declarado pelo contribuinte na DIME - Declaração do ICMS e do Movimento Econômico do ano anterior3:

(1) Se tratando de empresa com receita bruta anual entre R$ 4.800.000,00 e R$ 9.600.000,00, a dedução poderá ser de até 15% sobre o ICMS devido mensalmente, até atingir o montante total dos recursos aplicados em projetos culturais.

(2) Se tratando de empresa com receita bruta anual entre R$ 9.600.000,00 e R$ 38.400.000,00, até 10% sobre o ICMS devido mensalmente, até atingir o montante total dos recursos aplicados em projetos culturais.

(3) Se tratando de empresa com receita bruta anual superior a R$ 38.400.000,00, até 7% sobre o ICMS devido mensalmente, até atingir o montante total dos recursos aplicados em projetos culturais.

Nesse sentido, confere-se do teor do art. 3º, §1º da legislação em comento:

Art. 3º O contribuinte do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) que apoiar financeiramente projetos culturais poderá deduzir do valor do imposto devido, mensalmente, os recursos aplicados nos projetos, na forma e nos limites estabelecidos por esta Lei.

§ 1º A dedução será efetivada a cada mês, não podendo exceder os seguintes limites:

I – 15% (quinze por cento) do valor do ICMS devido no período, até atingir o valor total dos recursos dedutíveis, para empresa cuja receita bruta anual se situe entre o limite máximo de faturamento da empresa de pequeno porte, definido na Lei Complementar federal nº 123, de 14 de dezembro de 2006, e o montante de quatro vezes esse limite;

II – 10% (dez por cento) do valor do ICMS devido no período, até atingir o valor total dos recursos dedutíveis, para empresa cuja receita bruta anual se situe entre o montante máximo permitido para as empresas classificadas no inciso I, deste artigo, e o valor de oito vezes o limite máximo de faturamento da empresa de pequeno porte, definido na Lei Complementar federal nº 123, de 2006; e

III – 7% (sete por cento) do valor do ICMS devido no período, até atingir o valor total dos recursos dedutíveis, para empresa cuja receita bruta anual seja superior ao montante máximo permitido para as empresas classificadas no inciso II, deste artigo.4

Destarte, a empresa poderia reduzir mensalmente os percentuais previstos do ICMS devidos (15%, 10% ou 7%, conforme sua receita bruta), até que o total das deduções alcance o valor total investido nos projetos culturais. Disso resulta que os valores investidos pela empresa nesses projetos poderão ser descontados gradualmente ao longo dos meses, sempre respeitando os limites mensais definidos.

A menção de que as empresas podem realizar deduções “até atingir o valor total dos recursos dedutíveis”, contida na legislação (art. 3º, §1º), sinaliza que a dedução do ICMS pode ser acumulada mês a mês, desde que não ultrapassado o valor total aplicado nos projetos culturais.

Imagine, a título de exemplo, que a empresa “Delta Ltda” tenha investido R$ 60.000 em um projeto cultural no Estado de Santa Catarina, e, segundo sua receita bruta (entre R$ 9.600.000,00 e R$ 38.400.000,00), ela se enquadre na dedução de 10% do ICMS devido (art. 3º, §1º, inc. II, LE n. 17.942/20).

A tabela abaixo demonstra como a dedução seria aplicada nessa hipótese, ilustrando o valor deduzido mês a mês com base na receita bruta da empresa e no valor de ICMS por ela devido:

Seguindo o exemplo: Inicialmente, a empresa possuía R$ 60.000 aplicados em projetos culturais (portanto, passíveis de dedução de ICMS). Ao longo dos meses, a empresa foi deduzindo 10% do ICMS devido mensalmente, o que reduziu o saldo dos recursos dedutíveis de forma proporcional, de modo que, após 12 meses, o valor total das deduções acumuladas foi de R$ 24.000,00, restando R$ 36.000,00 em recursos dedutíveis para os meses subsequentes.

Dessa forma, a dedução do ICMS permite que a empresa continue a aplicar parte do imposto devido até que o montante total dos recursos investidos no projeto cultural seja integralmente deduzido. No caso da "Delta Ltda.", a dedução jamais ultrapassará os R$ 60.000,00 investidos, e o saldo restante de R$ 36.000,00 poderá ser abatido nos meses seguintes, desde que respeitado o limite de 10% do ICMS devido mensalmente.

No entanto, esse benefício não se aplica indistintamente a todos os contribuintes, sendo necessário que o incentivador cumpra uma série de requisitos legais estabelecidos pelo Estado de Santa Catarina.

Citam-se, aqui, alguns pressupostos normativos contidos no art. 414 do anexo 6 do regulamento de ICMS do Estado de Santa Catarina5, e na portaria 464/21 da secretaria Estadual da Fazenda6:

(1) Não é possível a dedução de valores devidos à título de ICMS por substituição tributária, responsabilidade tributária e já apurados por crédito presumido;

(2) O contribuinte/incentivador deverá estar em dia com suas obrigações acessórias relativas à DIME;

(3) Deverá ser apresentada CND - Certidão Negativa de Débitos ou Certidão Positiva com Efeitos de Negativa.

Preenchendo esses requisitos, o contribuinte/incentivador poderá promover a “Solicitação de Habilitação como Incentivador”, disponibilizada no SAT - Sistema de Administração Tributária, dando início à fase de habilitação, regida pela portaria 464/21 da secretaria Estadual da Fazenda.

Faculta-se, ainda, a possibilidade de desistência, a qualquer tempo. Este ato importará na impossibilidade de realização de novas desistências ao projeto cultural, ou mesmo que o contribuinte se habilite novamente no mesmo projeto cultural.

Por derradeiro, registra-se que, caso o limite global de 0,5% da receita líquida anual do ICMS do Estado seja atingido, a dedução poderá ser temporariamente suspensa, aguardando o próximo ano/exercício fiscal para ser retomado, em conformidade com o art. 4º, da lei Estadual 17.942, de 2020:

Art. 4º A soma dos recursos do ICMS disponibilizados pelo Estado para efeito do art. 3º desta lei, não poderá exceder, relativamente ao montante da receita líquida anual do imposto, o percentual de 0,5% (zero vírgula cinco por cento).

Parágrafo único. Atingido o limite previsto no caput deste artigo, o projeto cultural aprovado deverá aguardar o exercício fiscal seguinte para realizar a captação.

O impacto para o contribuinte, nesse caso, guarda relação com um pequeno “atraso” nas deduções do ICMS, mas não pode importar na perda do direito de deduzir o valor investido. Em outros termos, o projeto cultural continuará válido, mas a empresa deverá aguardar até o ano fiscal subsequente para completar suas deduções.

Analisadas as regras gerais de dedução de ICMS proporcionadas pelo PIC, passamos a expor, no tópico seguinte, o tratamento privilegiado de descontos aplicáveis ??a contribuintes com créditos inscritos em dívida ativa e que optem por contribuir para consecução de projetos culturais no âmbito do Estado de Santa Catarina.

3. Desconto tributário pelo contribuinte incentivador da cultura em Santa Catarina

A lei Estadual 17.942 também permite um desconto de 25% ao contribuinte incentivador que possua créditos tributários inscritos em dívida ativa há mais de doze meses, contados da data do seu requerimento.

Nos moldes do seu art. 5º, §1º, para que o contribuinte incentivador possa usufruir do benefício, deverá protocolar requerimento junto à SEF - Secretaria Estadual da Fazenda, e, no prazo de cinco dias após o deferimento do pedido, efetuar o recolhimento do valor do crédito tributário, considerando o desconto de 25%, nas condições abaixo:

(1) Recolhimento de 75% da dívida, por meio de DARE - Documento de Arrecadação de Receitas Estaduais;

(2) Recolhimento de 25% diretamente ao proponente do projeto cultural, por meio de crédito em conta bancária exclusiva do projeto.

No exemplo abaixo, veja-se que, para um crédito tributário de R$ 100.000,00, após o desconto de 25%, o contribuinte deverá recolher R$ 75.000,00, sendo 75% desse valor (R$ 56.250,00) via DARE e os 25% restantes (R$ 18.750,00) diretamente ao projeto cultural:

 

Ressalta-se que o pagamento não precisa ser necessariamente feito à vista, podendo o valor ser parcelado mediante autorização pela SEF - Secretaria Estadual da Fazenda, de acordo com a regulamentação específica.

De toda sorte, a mera apresentação do pedido de desconto perante a SEF implicará na confissão da dívida pelo sujeito passivo da obrigação tributária. Em outros termos, ao solicitar o benefício, o contribuinte assumirá formalmente a responsabilidade pelo crédito inscrito em dívida ativa, impedindo sua contestação posterior e interrompendo o prazo prescricional (art. 174, parágrafo único, inc. IV, CTN).

Por fim, o art. 5º, §4º, do diploma legal em estudo traz hipótese de exclusão do benefício para os créditos inscritos em dívida ativa oriundos de ato praticado com dolo, fraude ou simulação pelo sujeito passivo, restringindo o benefício àqueles contribuintes que agem de boa-fé, vedando sua aplicação a créditos tributários resultantes de práticas espúrias.

4. Síntese conclusiva

À luz das precedentes considerações, é possível concluir que:

(1)PIC - Programa de Incentivo à Cultura oferece deduções mensais no ICMS para empresas que financiam projetos culturais em Santa Catarina; 

(2) as deduções são limitadas a 15%, 10% ou 7%, conforme a receita bruta anual da empresa, podendo ser distribuídas ao longo de vários meses até atingir o valor total investido; 

(3) empresas com créditos tributários inscritos em dívida ativa há mais de doze meses podem obter um desconto de 25% desde que cumpram os requisitos legais e protocolem o pedido junto à secretaria Estadual da Fazenda.

_____

1 SANTA CATARINA. Lei n. 17.942, de 12 de maio de 2020. Disponível em: https://legislacao.sef.sc.gov.br/html/leis/2020/lei_20_17942.htm. Acesso em: 19 set. 2024.

2 Toma-se como base o “limite máximo de faturamento da empresa de pequeno porte, definido na Lei Complementar federal nº 123, de 14 de dezembro de 2006”, conforme inteligência do artigo 3º, Lei n. 17.942, de 12 de maio de 2020, que, em conformidade com a Lei Complementar n. 123, de 2006, é de R$ 4.800.000,00. Confira: “Art. 3º [...] II - no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais)” (BRASIL, Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp123.htm. Acesso em: 19 set. 2024).

3 “Art. 414. [...] VI – em cada período de apuração, aos seguintes percentuais, conforme valores declarados em DIME no ano anterior, observado o disposto nos §§ 9º e 10 deste artigo [...]” SANTA CATARINA. REICMS/SC. Anexo 6. Disponível em: https://legislacao.sef.sc.gov.br/html/regulamentos/icms/ricms_01_06.htm. Acesso em: 20 set. 2024.

4 SANTA CATARINA. Lei n. 17.942, de 12 de maio de 2020. Disponível em: https://legislacao.sef.sc.gov.br/html/leis/2020/lei_20_17942.htm. Acesso em: 19 set. 2024).

5 SANTA CATARINA. REICMS/SC. Anexo 6. Disponível em: https://legislacao.sef.sc.gov.br/html/regulamentos/icms/ricms_01_06.htm. Acesso em: 20 set. 2024.

6 SANTA CATARINA. Portaria SEF n. 464/2021. Disponível em: https://legislacao.sef.sc.gov.br/html/portarias/2021/port_21_464.htm. Acesso em: 20 set. 2024.

Adriel Mafra Limas
Bacharel em Direito (UNIVALI). Pós-Graduando em Direito Tributário (IBET). Assessor Jurídico (JVLN Advogados Associados).

Laudelino João da Veiga Netto
Advogado e sócio do escritório JVLN Advogados Associados. Mestre em Ciência Jurídica (UNIVALI). Especialista em Direito Tributário (FGV). Especialista em Direito Imobiliário (CESUSC).

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