A regularização fundiária é um tema de crescente relevância no debate sobre políticas públicas e direitos humanos, especialmente no Brasil, onde a desigualdade no acesso à terra e à moradia é marcante. Em tempos de crise social e econômica, o direito à moradia digna se torna uma necessidade moral e legal. Essa questão se torna ainda mais necessária quando consideramos o papel que movimentos sociais e lideranças comunitárias desempenham na luta pela regularização, para alcançar a luta pela moradia.
Regularização fundiária e inclusão social
A regularização fundiária desempenha um papel crucial na promoção da inclusão social, pois proporciona segurança da posse para milhares de famílias que ocupam áreas urbanas e rurais sem a devida titulação. Ao receber reconhecimento formal de seus direitos, essas pessoas se tornam titulares de propriedade, o que lhes permite acessar serviços essenciais, como água, luz e esgoto, além de abrir portas para financiamentos e melhorias em suas condições de vida.
A inclusão social não se resume apenas ao acesso à moradia; ela também abrange o empoderamento das comunidades. Com a regularização, os moradores têm mais voz e participação nas decisões que afetam suas vidas, fortalecendo a cidadania e promovendo a coesão social. Esse processo é essencial para garantir que as políticas públicas atendam às reais necessidades da população, especialmente aquelas mais vulneráveis.
O contexto jurídico
O recente caso julgado no TJ/SP (processo 0037077-76.2019.8.26.0002) ilustra os desafios enfrentados por famílias em situação de vulnerabilidade. No julgamento, o juiz Fábio Henrique Prado de Toledo determinou a suspensão do cumprimento de um mandado de reintegração de posse, argumentando a necessidade de um plano de execução que leve em conta as condições das famílias que habitam a área há anos.
Essa decisão está alinhada com o entendimento do STF na ADPF 828, que recomenda a criação de comissões de conflitos fundiários para mediar desocupações e garantir a proteção de grupos vulneráveis. A ADPF 828, decidida em 31/10/22, destaca a importância de ações que respeitem o contexto social das ocupações, enfatizando a realização de inspeções judiciais e audiências de mediação antes de qualquer ordem de desocupação coletiva. Essa decisão representa um avanço significativo na proteção dos direitos das populações mais vulneráveis, refletindo a necessidade de um tratamento humanizado nas questões fundiárias.
O papel político dos movimentos sociais e do MTST
Os movimentos sociais têm um papel fundamental na luta pela regularização fundiária e pela defesa do direito à moradia. O MTST é um dos protagonistas nesse cenário, mobilizando milhares de pessoas em todo o Brasil. Desde sua fundação, o MTST tem se empenhado em pautar a questão da habitação como um direito fundamental, realizando ocupações e protestos para chamar a atenção para a precariedade habitacional e a necessidade urgente de políticas de regularização.
A luta do MTST não se limita apenas à conquista de moradia, mas se estende à promoção de políticas públicas que garantam dignidade e inclusão social. O movimento busca negociar com o poder público soluções viáveis para as famílias em situação de vulnerabilidade, promovendo o diálogo entre as comunidades e as autoridades para viabilizar a regularização das ocupações.
A própria Débora Lima, presidente municipal do PSOL e coordenadora do MTST, tem se destacado como uma liderança forte e comprometida com a luta pela regularização fundiária e pelos direitos das populações marginalizadas. Sua atuação ressalta a importância de políticas públicas que reconheçam a posse e promovam a dignidade das comunidades que habitam áreas vulneráveis. Como ela mesma afirma: "A luta pela moradia é a luta pela dignidade. Não podemos permitir que famílias sejam jogadas na rua enquanto há terrenos ociosos e políticas que precisam ser transformadas."
Lima defende que a regularização fundiária é essencial para assegurar a cidadania plena e o reconhecimento dos direitos das populações mais necessitadas. Sua visão se alinha com a ideia de que a moradia não é apenas um bem material, mas um espaço de construção de identidade e comunidade. Sob sua liderança, o MTST tem realizado campanhas e mobilizações para pressionar por políticas de regularização que considerem as necessidades específicas das famílias que ocupam áreas irregulares.
A atuação de Débora Lima também reflete uma crítica ao modelo de urbanização que prioriza a especulação imobiliária em detrimento das necessidades habitacionais das camadas mais pobres da população. Para ela, a regularização deve ser acompanhada de uma política de habitação que garanta não apenas a segurança da posse, mas também condições de vida dignas para todos.
Necessidade de políticas públicas eficazes
Apesar dos avanços legislativos, como a lei 13.465/17, que estabelece normas para a regularização fundiária, ainda há lacunas significativas na implementação de políticas públicas eficazes. Muitas vezes, as diretrizes não são suficientemente abrangentes ou adaptadas à realidade das comunidades, resultando em processos morosos e burocráticos que dificultam a efetivação do direito à moradia.
Além disso, a falta de articulação entre diferentes esferas do governo e a escassez de recursos financeiros para programas de regularização agravam a situação. É imprescindível que as políticas públicas sejam integradas e orientadas a promover a inclusão, levando em conta as especificidades de cada comunidade.
Jurisprudência e impacto social
A jurisprudência brasileira tem avançado no reconhecimento da necessidade de uma abordagem humanizada nas questões de regularização fundiária. O papel da defensoria pública e do ministério público, conforme destacado no caso mencionado, é crucial para garantir que as vozes das comunidades sejam ouvidas e respeitadas.
Essas decisões judiciais não apenas oferecem uma luz no fim do túnel para as famílias que lutam por suas casas, mas também sinalizam um compromisso mais amplo com a justiça social e a igualdade de direitos. Ao considerar o contexto social e histórico das ocupações, os tribunais começam a reverter a lógica punitiva que frequentemente prevalece em casos de disputa de terras.
Conclusão
A regularização fundiária deve ser vista como um instrumento vital para a promoção da inclusão social. Além de garantir direitos, ela é um passo essencial na construção de cidades mais justas e sustentáveis. O comprometimento do judiciário em respeitar e proteger as comunidades vulneráveis é um avanço necessário e deve ser fortalecido por políticas públicas que priorizem a justiça social.
A reflexão sobre a importância da regularização fundiária é um chamado à ação, não apenas para o governo, mas para toda a sociedade civil, a fim de garantir que o direito à moradia digna seja uma realidade para todos. A luta por uma sociedade mais justa e igualitária passa, indiscutivelmente, pela regularização fundiária e pelo respeito aos direitos humanos. O trabalho de movimentos sociais como o MTST e a liderança de Débora Lima são fundamentais nesse processo, lembrando-nos que a mobilização social e a pressão política são essenciais para transformar a realidade das comunidades mais necessitadas.