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Limbo previdenciário - Abandono de emprego

A jurisprudência do TST determina que o ônus da prova do "limbo previdenciário" recai sobre o empregado, que deve comprovar a recusa patronal ao retorno.

23/9/2024

A questão relativa à eventual responsabilidade ou não do empregador pelo pagamento dos salários no período em que o empregado se encontra no denominado limbo previdenciário, vem provocando consideráveis questionamentos no âmbito do Judiciário. O limbo previdenciário ocorre quando “o trabalhador recebe alta médica do INSS e, ao procurar a empresa, é impedido de retornar ao trabalho pelo médico desta por considerá-lo inapto”.

Dessa forma, enquanto o empregado assim permanece não recebe benefício previdenciário por parte do INSS e, tampouco, recebe salário do seu empregador.

A jurisprudência do TST, já pacificou posicionamento no sentido de que, nos casos em que a recusa da volta advém de ato do empregador, deste é a responsabilidade pelo pagamento dos salários.

Por outro lado, hipótese diversa ocorre quando a ausência do retorno ao emprego não decorre de iniciativa patronal.

No dia 29/08/2024 foi publicada notícia no site do TST referente ao julgamento proferido nos autos do processo TST-Ag-AIRR - 836-66.2019.5.08.0128, cujo acórdão foi publicado no dia 07/06/24.

A matéria foi intitulada “servente não comprova ‘limbo previdenciário’ e ficará sem receber salários e benefício”.

No processo em questão a 1ª turma do TSTrabalho negou provimento ao recurso de uma servente da Star - Serviços Especializados de Mão de Obra, de Belém (PA). O objetivo dela era o de receber salários referentes ao período entre a alta do INSS e o pretenso regresso ao trabalho. Aduziu a demandante que “a empresa teria rejeitado seu retorno ao serviço, mas não houve comprovação disso”.

Os fatos que originaram o julgamento, em síntese, foram assim descritos: “Admitida em outubro de 2013, a servente foi afastada em setembro de 2014 pelo INSS por motivo de saúde. Em 2017, o benefício foi cortado. Diante disso, ela entrou com ação previdenciária para voltar a receber o benefício, mas o pedido foi negado e hoje está em fase recursal. Em dezembro de 2019, ela ajuizou ação trabalhista contra a Star para receber salários referente ao limbo previdenciário, além de indenização por dano moral. Também na ação, a servente afirmou que a Star havia impedido seu retorno ao trabalho, deixando-a sem amparo financeiro. Segundo ela, a empresa sabia da pendência relativa ao benefício previdenciário. Justificou ainda que não voltou ao serviço após a alta porque ainda estava incapacitada para o trabalho.” De outro lado, “em contestação, a Star afirmou que não impediu o retorno da trabalhadora, mas sim que foi informada por ela sobre a incapacidade para o trabalho e sobre o recurso pendente de julgamento no

INSS. A empresa disse que, em outubro de 2019, comunicou à trabalhadora que o afastamento do trabalho por auxílio doença havia cessado em 2017 e que ela poderia ser demitida por justa causa por abandono de emprego, diante da falta de contato.”

O TST firmou a sua jurisprudência na direção de que, em casos como estes, cabe ao empregado o ônus de provar que a empregadora recusou a sua volta ao trabalho.

Assim, por se tratar de direito constitutivo, aplica-se os arts. 818, I, da CLT c/c o 373, I, do CPC. E para justificar o entendimento a turma julgadora citou no acórdão os seguintes julgados:

(...) LIMBO PREVIDENCIÁRIO. RETORNO AO TRABALHO. AUSÊNCIA DE PROVA DE RECUSA POR PARTE DA EMPRESA RÉ. SÚMULA N.º 126 DO TST.

TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 1. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica quanto à responsabilidade do empregador pelo pagamento dos salários do empregado, a partir da alta previdenciária, ainda que considerado inapto pela junta médica da empresa. 2. Todavia, por se tratar de direito constitutivo, nos termos do art. 818, I, da CLT c/c art. 373, I, do CPC, cabe ao empregado o ônus da comprovação de que a ausência de retorno ao trabalho decorreu da recusa patronal. 3. Na hipótese, o Tribunal regional, após o exame do conjunto fático- probatório, concluiu que "inexiste qualquer prova nos autos de que houve recusa patronal a pedido da obreira de retorno ao trabalho". 4. Nesse contexto, a aferição das alegações autorais, no sentido de que a empresa ré não permitiu o seu retorno ao trabalho, exigiria indispensável revolvimento de fatos e provas, pelo que incide, no aspecto, o óbice da súmula de n.º 126 do TST. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR-1000373-82.2021.5.02.0006, 1ª turma, relator ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 21/10/2022).

AGRAVO. RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. LIMBO PREVIDENCIÁRIO. RETORNO AO TRABALHO. AUSÊNCIA DE RECUSA. SÚMULA Nº 126 DO TST. TRANSCENDÊNCIA

NÃO RECONHECIDA. 1. O Tribunal regional, após o exame do conjunto fático- probatório (notadamente o depoimento do agravante), concluiu que "não houve, de fato, intenção de retornar ao posto de trabalho e que o autor não foi impedido, pela reclamada, de voltar a trabalhar". 2. A aferição das alegações autorais, no sentido de que o empregado não foi intimado a retornar ao trabalho ou que houve recusa do retorno por parte da empregadora, exigiria indispensável revolvimento de fatos e provas, pelo que incide, no aspecto, o óbice da Súmula de nº 126 do TST. 3. Confirma-se, assim, a decisão agravada, porquanto não constatada a transcendência da causa do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo. Agravo a que se nega provimento. (Ag-RRAg-1001323-73.2019.5.02.0067, 1ª turma, relator ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 16/08/22)

[...] LIMBO PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DO CONTRATO DE TRABALHO APÓS O TÉRMINO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PROVA DA RECUSA DA EMPREGADORA EM ACEITAR O TRABALHO OBREIRO APÓS A ALTA PREVIDENCIÁRIA. 5. RESCISÃO INDIRETA. SÚMULA 126 e 297/TST.

De acordo com a ordem jurídica atual, que aloca o indivíduo em posição especial no cenário social, desponta nítido o caráter precursor do direito à dignidade da pessoa humana (1º, III, da CF) sobre todo o sistema constitucional. Ademais, a convenção 161 da OIT impõe, como princípio de uma política nacional, "a adaptação do trabalho às capacidades dos trabalhadores, levando em conta seu estado de sanidade física e mental". Dessa forma, é inconteste que cabe à Empregadora, ante a cessação da licença, reintegrar ou readaptar o Reclamante em atividade compatível com suas limitações físicas, e não puramente recusar seu retorno ao trabalho. Isso porque, segundo o ordenamento jurídico pátrio, o empregador também é responsável pela manutenção e respeito aos direitos fundamentais do empregado, devendo zelar pela afirmação de sua dignidade e integração no contexto social - e a readequação de suas funções no processo produtivo da empresa faz parte desse mister. Por outro lado, agregue-se que, por se tratar de fato constitutivo do direito da parte autora, cabe à empregada comprovar que o "limbo previdenciário" decorreu da recusa da empregadora em recebê-la na empresa ou em readaptá-la em função compatível. Julgados do TST nesse sentido. No caso dos autos, contudo, consta na decisão recorrida que a Obreira foi afastada das atividades laborais para o gozo de benefício previdenciário de 13.6.2015 e 22.3.2016 e que o Tribunal regional, após sopesar as provas dos autos, concluiu que "caberia à reclamante comprovar a alegada recusa por parte da demandada de que a mesma retornasse às suas atividades laborais após a alta médica em 22.03.2016, ônus que não se desvencilhou". Em suma, o Tribunal regional, diante da ausência de provas de que a reclamada recusou o trabalho da autora após a alta previdenciária, manteve a sentença, que concluiu pelo indeferimento do pedido de pagamento dos salários e reflexos referentes ao período não acobertado pela licença previdenciária. Nesse contexto, não há como esta Corte alterar o enquadramento jurídico conferido pelo Tribunal a quo, pois, à míngua de provas de que a reclamada teria afrontado os direitos da reclamante ao retorno ao trabalho após a cessação do benefício previdenciário ou à sua readaptação em função compatível, não há como esta Corte Superior, no aspecto, conferir enquadramento distinto . Assim, diante das premissas fáticas registradas pelo TRT, o processamento do recurso de revista fica obstado, por depender do reexame de fatos e provas (Súmula 126/TST). Recurso de revista não conhecido quanto aos temas [...] (RRAg-612-39.2019.5.12.0057, 3ª turma, relator ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 17/12/21).

Com efeito, segundo posicionamento pacificado no TST, consubstanciado, inclusive, na Súmula 32, é presumido “o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer”, o que enseja a dispensa por justa causa tipificada no artigo 482, alínea “i”, da CLT.

Apesar do ônus da prova ser do trabalhador, em situações como as descritas acima, por cautela e visando maior segurança, o que se recomenda é que o empregador faça convocação formal dirigida ao empregado a fim que o mesmo regresse ao trabalho, imediatamente após o conhecimento da alta previdenciária. Ultrapassado o prazo de 30 sem que o mesmo reassuma as suas atividades ficará caracterizado o abandono de emprego.

Orlando José de Almeida
Sócio do escritório Homero Costa Advogados.

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