Introdução
Julgado em 27/8 e registrado 2024.0000796182 o acórdão da lavra do desembargador Décio Rodrigues é um alerta sobre os abusos de credores dos mais diversos tipos, mas em especial, as grandes empresas financeiras de crédito sobre seus devedores, observando questão recorrente: Credores que optam pelo processo executivo do valor integral da dívida mesmo quando seu crédito é garantido por Alienação Fiduciária de bens móveis ou imóveis.
O acórdão 2024.0000796192
A decisão da 21ª câmara de Direito Privado, proferida no âmbito de processo executivo no qual a devedora encontra-se em recuperação judicial, inicialmente observa a determinação do juiz do 1º grau do processo, que estabelece a necessidade do credor e do juízo da execução obter autorização do juízo da recuperação judicial antes de proceder qualquer ato de excussão de patrimônio de devedor nessa condição.
Tal determinação tem razão de ser, sendo forçoso, apenas, estabelecer um limite, também para evitar abusos pelo devedor. A “data de corte” prevista no art. 49 da lei 11.101/05:
Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.
Assim, qualquer crédito, seja ele o da regra geral (art. 49), seja ele das exceções (art. 49, parágrafos 3º e 4º) devem, sim, sujeitar-se às determinações do juízo recuperacional, cada qual ao seu modo. Os gerais com submissão irrestrita, as exceções com submissão parcial, devendo o credor conservar em seu favor a propriedade fiduciária, porém, sem poder expropriar o devedor imediatamente.
A medida tem razão de ser por prestigiar a manutenção do patrimônio da empresa, notadamente aquele essencial à sua atividade. Nas palavras de Eduardo Secchi Munhoz:
É pressuposto, ainda, da recuperação judicial a previsão de um período de proteção ao devedor, que lhe confira a possibilidade de negociar com seus credores de forma coletiva e organizada, sem a pressão gerada por eventual corrida individual que poderia levar à perda sucessiva e desorganizada de seus bens e direitos, com prejuízo ao exercício de sua atividade1.
O trecho citado refere-se à adoção do stay period, todavia, a interpretação do inteiro teor da lei 11.101/05, permite entender que a recuperação judicial é um meio de preservação de interesses difusos e coletivos, pois a preservação da empresa, enquanto fonte geradora de empregos diretos e indiretos, renda e movimentação econômica que afeta interesses que não se é possível mensurar, deve prevalecer sobre o interesse individual de um único credor.
A definição de direitos difusos e coletivos consta do Código de Defesa do Consumidor e aplica-se a todas às áreas por ser conceito geral, não se limitando ao âmbito das relações de consumo.
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
- interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
- interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
- interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
O grupo de funcionários, cujo próprio sustento e de suas famílias depende da empresa; o grupo de fornecedores de produtos e serviços diretos à empresa; o grupo de fornecedores de produtos e serviços à funcionários da empresa que movimentam a criação de empregos indiretos, etc., são interesses difusos e coletivos, todos ligados a um elemento comum: a existência da empresa.
- Confira aqui a íntegra do artigo.
1 Tratado de Direito Comercial – Vol 7. P. 176.