Em termos de conceito, FGTS nada mais é do que a sigla para Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, criado pela lei 5.107/66, tendo por escopo a proteção do trabalhador demitido sem justa causa (hodiernamente, é regido pela lei 8.036/90). O FGTS – na prática – funciona como um conta bancária em nome do trabalhador e vinculada a ele no momento da assinatura do primeiro contrato de trabalho.
Nessa conta bancária, o empregador deposita todos os meses o valor equivalente a 8% do salário pago ao trabalhador, acrescido de juros e atualização monetária. Desta forma, vai sendo formado um fundo de reserva financeira para o mesmo. Ou seja, o FGTS exerce a função de uma poupança utilizada pelo desempregado, sem justa causa, ou no momento em que surge uma finalidade relevante, nos termos da lei.
Caso o empregado seja demitido sem justa causa, o empregador é obrigado a depositar na referida conta vinculada uma indenização compensatória de 40% do montante de todos os depósitos realizados durante a vigência do contrato de trabalho (atualizados monetariamente e acrescidos de juros). O FGTS possui natureza jurídica de direito social do trabalhador, sendo considerado, portanto, fruto civil do trabalho.
A Caixa Econômica Federal exerce o papel de agente operador do FGTS. Dentre outras funções, cabe à referida instituição bancária centralizar os recursos do Fundo, bem como controlar as contas vinculadas e emitir extratos individuais correspondentes às contas vinculadas.
O FGTS é regido por normas e diretrizes estabelecidas por um Conselho Curador, composto por representação de trabalhadores, empregadores, órgãos e entidades governamentais, na forma estabelecida pelo Poder Executivo. As reuniões do referido Conselho serão públicas, bem como gravadas e transmitidas ao vivo por meio do site do FGTS.
Por força de lei, o FGTS precisa ser corrigido mensalmente, devendo incidir a correção monetária. O índice utilizado é a TR - Taxa Referencial), que é o mesmo índice aplicado para a correção da poupança, mais juros de 3% ao ano (a remuneração da caderneta de poupança – diferentemente de qualquer outro índice oficial de inflação – é sempre prefixada). A TR é uma taxa de juros calculada pelo Banco Central e serve para atualizar determinados investimentos e empréstimos. Tal peculiaridade deixa nítida a existência de uma desvinculação entre a remuneração da poupança e a evolução dos preços da economia, isto é, a TR não acompanha a variação da inflação. A óbvia conclusão que se chega é que todo índice definido de forma antecipada é incapaz de refletir a real flutuação de preços apurada no período em referência. Trata-se do caso, em específico, da TR (poupança).
Qualquer cidadão que se aprofunde no estudo do FGTS vai ter a plena ciência de que o mesmo, por ter uma função social a cumprir, deve estar sujeito a critérios diferenciados do mercado financeiro em geral, razão pela qual o índice oficial da inflação – IPCA - deve ser a referência aplicada para a correção dos saldos dos depósitos realizados nas contas a ele vinculadas.
Por razões óbvias, sua remuneração não poderia ficar abaixo da inflação (IPCA). Tal fato viola a Constituição Federal, eis que acarreta com que os trabalhadores percam seu poder aquisitivo, já que seu saldo do FGTS não acompanha o aumento de preços. Portanto, quando a forma atual de remuneração (TR mais juros de 3% ao ano) não acompanhar a inflação, o Fundo deverá compensar os trabalhadores, fazendo a remuneração chegar até o índice oficial de inflação (IPCA).
Tal compensação teve a concordância das maiores centrais sindicais do país, que representaram os trabalhadores nesta negociação.
Diante de todo esse contexto, o Partido Solidariedade ingressou com ADI, no STF, pedindo a declaração de inconstitucional do art. 13 da lei 8.036/90 e do art. 17 da lei 8.177/91 na parte que que eles preveem a TR como sendo o índice de correção dos depósitos nas contas vinculadas do FGTS e a decisão proferida neste julgamento será aplicada ao saldo existente na conta a partir da publicação da ata do julgamento ocorrido em 17/6/24.
Abaixo, apontamos cada item da decisão do STF sobre o julgamento da correção monetária do STF:
- A remuneração do FGTS não pode realmente ficar abaixo da inflação. Se o índice de remuneração do FGTS ficar abaixo da inflação, estará havendo uma violação do direito de propriedade;
- O índice oficial de inflação é o IPCA - Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo. Este índice é produzido pelo IBGE (fundação federal) e, por ser calculado por essa instituição, é considerado um índice federal de correção monetária. O IPCA é um índice que mede a inflação de um conjunto de produtos e serviços comercializados no varejo, destinados ao consumo final das famílias. Ele é utilizado como parâmetro para metas de inflação, reajuste de impostos e contratos;
- O período anterior a esse julgamento não será afetado. No entanto, daqui em diante, quando a forma atual de remuneração do FGTS (TR mais juros de 3% ao ano) ficar abaixo da inflação, o Fundo deverá compensar os trabalhadores, fazendo a remuneração chegar até o índice oficial de inflação (IPCA);
- A decisão será aplicada ao saldo existente na conta do FGTS a partir da data de publicação do resultado do julgamento (17/6/24);
- Caberá ao Conselho Curador do Fundo (art. 3º da lei 8.036/90) definir a forma dessa compensação;
Tão logo este julgamento foi finalizado, pairou no universo jurídico a seguinte questão: Por que o STF não altera de forma definitiva a TR por outro índice?
As justificativas podem ser diversas – tanto jurídicas quanto políticas.
Fato é que o FGTS possibilita o crédito para o financiamento imóveis. O rendimento do FGTS, se fosse mais oneroso do que o legalmente previsto, ensejaria restrições ao crédito para o financiamento imobiliário em desfavor dos menos favorecidos, em razão do ônus financeiro. Ademais, o STF entende que haveria limitações para a atuação do Poder Judiciário, pois a intervenção pública no domínio econômico é excepcional, em respeito ao primado da livre iniciativa, ao respeito com a responsabilidade fiscal e à consequente mitigação de novas despesas obrigatórias.
Outra questão que foi levada em consideração é a busca da previsibilidade da segurança jurídica. O STF afirmou que deveria ser prestigiada a autonomia privada coletiva, eis que houve um acordo entre a AGU e as quatro maiores centrais sindicais do Brasil, no sentido de que, nos anos em que a forma legal de atualização for inferior ao IPCA, caberá ao Conselho Curador do Fundo determinar a forma de compensação. O STF entendeu que essa medida, além de garantir o direito de propriedade do trabalhador — por permitir que a correção monetária acompanhe o aumento geral dos preços — protege os projetos sociais a serem realizados com o dinheiro do FGTS, o qual não funciona apenas como uma “poupança compulsória do trabalhador”, mas também como um financiador da política habitacional na aquisição da casa própria por pessoas de baixa renda e da realização de obras de saneamento básico e de infraestrutura urbana.
Em síntese: O FGTS, por ter uma função social a cumprir, está sujeito a critérios diferenciados do mercado financeiro em geral, de modo que o índice oficial da inflação (IPCA) deve ser a referência mínima para a correção dos saldos dos depósitos realizados nas contas a ele vinculadas, a fim de garantir a manutenção do poder aquisitivo do trabalhador.