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A aplicação da LGPD na campanha eleitoral

A proteção de dados pessoais no contexto da propaganda eleitoral é um desafio complexo que exige um equilíbrio entre a promoção de campanhas políticas e a preservação dos direitos dos titulares de dados. Diante disso, a Resolução TSE 23.610/19 estabeleceu regras para garantir a conformidade da LGPD na campanha eleitoral.

25/7/2024

A LGPD, lei 13.709/18, impõe uma série de obrigações e restrições para o tratamento de dados pessoais em diferentes contextos, incluindo a propaganda eleitoral. O tratamento de dados pessoais para fins de propaganda eleitoral deve respeitar a finalidade específica para a qual os dados foram coletados, observados os princípios e normas previstas na LGPD e as disposições da Resolução TSE 23.610/19.

As candidatas, os candidatos, os partidos, as federações ou as coligações deverão disponibilizar o Aviso de Privacidade, com informações claras aos titulares de dados sobre como seus dados estão sendo tratados. Devem também implementar uma Política de Segurança da Informação, que deverá contemplar requisitos essenciais e necessários para o tratamento de dados pessoais, além de medidas de segurança técnica e administrativa para proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas.

Ademais, é necessário disponibilizar um Canal de Comunicação que permita ao titular obter a confirmação da existência de tratamento de seus dados e formular pedidos de eliminação de dados ou descadastramento, além de exercer seus demais direitos, nos termos do art. 18 da LGPD. Também é obrigatório nomear um Encarregado de Dados, exceto em municípios com menos de 200.000 eleitores, e manter o Registro das Operações de Tratamento de Dados, conforme o artigo 33-C da Resolução TSE 23.610/19. Em caso de incidentes de segurança que possam acarretar riscos ou danos relevantes aos titulares dos dados, deve-se notificar a autoridade nacional e os titulares afetados.

O consentimento específico, expresso e destacado do titular dos dados é necessário nos casos de tratamento de dados pessoais sensíveis ou de dados pessoais que possam revelar dados sensíveis. Exemplos de medidas de segurança técnica e administrativa incluem o uso de antivírus, políticas de senha, controle de acesso, termos de confidencialidade e treinamento LGPD.

O registro de operações deverá ser conservado pelos partidos políticos, as federações, as coligações e os candidatos durante o período eleitoral, permanecendo a obrigação em caso de ajuizamento de ação na qual se apure irregularidade ou ilicitude no tratamento de dados pelas campanhas. A Justiça Eleitoral poderá determinar a exibição do registro de operações e de documentos que o corroborem.

Na propaganda eleitoral, o tratamento de dados pessoais sensíveis ou de dados pessoais que possam revelar dados sensíveis exige, além do cumprimento das regras gerais para o tratamento de dados pessoais, o consentimento específico, expresso e destacado do titular. Contudo, no caso de dados pessoais sensíveis a que a candidata ou o candidato tenha acesso pessoalmente em decorrência de seu núcleo familiar, de suas relações sociais e de seus vínculos comunitários, como a participação em grupos religiosos, associações e movimentos, o consentimento específico, expresso e destacado só será exigido para a transferência a terceiros, respondendo o cedente por divulgação ou vazamento.

O canal de comunicação com os titulares de dados, bem como a identificação do encarregado pelo tratamento de dados pessoais, deverá ser informado por candidatas, candidatos, partidos, federações e coligações, de forma clara e acessível, nos endereços eletrônicos previstos no art. 28, caput e § 1º da Resolução TSE 23.610/19. (Sites, blogs, redes sociais, entre outros meios de propaganda na internet).

Outra novidade é que o canal de comunicação e o nome do encarregado de tratamento de dados pessoais serão divulgados pela Justiça Eleitoral junto às informações da candidatura.

A mensagem eletrônica igualmente deverá conter a informação sobre o canal de comunicação disponibilizado nos termos do § 5º do art. 10 da Resolução TSE 23.610/19 e explicar, em linguagem simples e acessível, a finalidade do canal. Os partidos políticos, as federações e as coligações poderão centralizar o canal de comunicação e a contratação de encarregado de dados.

O tratamento de dados tornados manifestamente públicos pelo titular realizado por candidatas, candidatos, partidos políticos, federações ou coligações para fins de propaganda eleitoral deverá ser devidamente informado ao titular, garantindo a este o direito de opor-se ao tratamento.

A violação das regras da LGPD na propaganda eleitoral acarretará a remoção do conteúdo veiculado e a comunicação do fato à Autoridade Nacional da Proteção de Dados, a quem compete avaliar a aplicação das sanções previstas no art. 52 da LGPD, sem prejuízo da eventual apuração de ilícitos eleitorais ou crimes.

Partidos políticos, federações, coligações e candidatos são responsáveis por garantir que as empresas e pessoas contratadas para suas campanhas cumpram as disposições da LGPD.

Em municípios com menos de 200.000 eleitores, partidos, federações, coligações e candidatos são considerados agentes de tratamento de pequeno porte e podem ter certas flexibilidades, como a dispensa de indicar um encarregado pelo tratamento de dados e a faculdade de estabelecer política simplificada de segurança da informação.

Em síntese, as alterações na Resolução TSE 23.610/19 foram inseridas para assegurar que o tratamento de dados pessoais durante as campanhas eleitorais esteja totalmente alinhado com os princípios e diretrizes estabelecidos pela LGPD, estipulando medidas claras e específicas para proteger a privacidade dos eleitores, promovendo transparência e segurança no uso de dados pessoais durante o processo eleitoral. Embora o cumprimento dessas regras represente um desafio significativo no contexto eleitoral, é esperado que, com o tempo, a proteção de dados no Brasil amadureça, consolidando uma cultura de proteção de dados, como assegurada no art. 5º, LXXIX, da Constituição Federal.

Fernanda Pinho Martinez.
Advogada. Especialista em Compliance, LGPD e Direito Digital. Certified Privacy Officer (CPO), Certified Data Protection Officer (DPO). Membro da Comissão de Direito Digital e Proteção de Dados OAB/PR

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