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O planejamento tributário e as suas controvérsias no ordenamento jurídico brasileiro

A demora na regulamentação do art. 116 do CTN e no julgamento da ADIn 2.246 pelo STF causa insegurança no planejamento tributário, apesar de alguns avanços conceituais.

25/7/2024

Depois de mais de vinte anos de mora legislativa, o STF, no âmbito da ADIn 2.246, não logrou êxito na superação da famigerada controvérsia acerca da indeterminação conceitual que macula o art. 116, parágrafo único, do CTN - Código Tributário Nacional, este que ainda carece de regulamentação, mesmo após o decurso de longuíssimo lapso temporal desde a sua inserção pela Lei Complementar 104/01 e do insucesso em sua regulamentação pela MP 66/02.

Conforme preconiza o art. 116, do CTN, em seu parágrafo único, a autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

A grande controvérsia gerada pela inserção do referido dispositivo no CTN é a inegável indeterminação do conceito de dissimulação e quais são os elementos objetivos e subjetivos que caracterizam a sua ocorrência. Tal ocorre porque a legislação ordinária, que regulamentaria o referido artigo, não foi editada, sendo impossível sequer verificar o procedimento adequado para a desconsideração dos atos ou negócios jurídicos praticados no âmbito do planejamento tributário.

Deve-se rememorar que a propositura da ADIn 2.446, que levou ao STF a discussão acerca da inconstitucionalidade por omissão do art. 116, do CTN, perdurou por mais de vinte anos até ser julgada, finalmente, no ano de 2022, revelando a crise generalizada do Poder Judiciário, que afeta a previsibilidade e a segurança jurídica das relações tributárias no Brasil – o que não nos é uma novidade.

Questiona-se, dessa forma, sobre a efetividade da prestação jurisdicional, eis que o STF não logrou êxito definir uma conceituação jurídica capaz de colocar fim na indeterminação e consequente insegurança que sói ocorrer pela mora do Poder Legislativo em regulamentar o art. 116, do CTN.

Diante da mora do legislador e da vagarosa prestação jurisdicional, foi-se delineando, tanto no âmbito dos Tribunais Administrativos, como o CARF, algumas balizas que trazem um pouco de luz às questões controvertidas, embora não ofereça propriamente uma solução.

Prepondera atualmente que toda a vez que houver uma movimentação que envolva a reordenação societária ou a reorganização estrutural ou financeira e que desses atos ou negócios jurídicos decorra unicamente a redução da carga tributária, como decorrência de tal planejamento, haverá a falta de propósito negocial – ainda que seja lícita a movimentação, reitere-se.

Entretanto, a autuação da autoridade fiscalizadora não pode ter como base unicamente o dispositivo legal (art. 116, do CTN), pois o referido artigo, como já reconhecido por inúmeros precedentes, não é autoaplicável e, na pendência da devida regulamentação, deverá observar alguns parâmetros jurisprudencialmente delineados.

Nesse sentido, já ficou aclarado, no âmbito da Câmara Superior de Recursos Fiscais, que “Na ausência de eficácia da norma antielisiva, o planejamento tributário realizado dentro das condutas permitidas em lei somente poderá ser alvo de desconsideração para fins tributários quando a fiscalização evidenciar o dolo, a fraude ou a simulação por parte do contribuinte”. (Proc. 16561.720010/2018-87).

Também se depreende do julgamento da ADIn 2.246, apesar de ela não ter superado os problemas de ordem conceitual do dispositivo em estudo, que não cabe a autoridade que autua aferir o proposito negocial por indício. É o ônus da Fazenda Pública fazer a comprovação de dolo e fraude.

Assim, porquanto não se tenha um parâmetro seguro para a definição do conceito de simulação, tem-se o delineamento dos requisitos a serem observados pela entidade autuante – a cargo da qual fica o ônus de demonstrar a existência de dolo e da fraude. Tal parâmetro deve orientar os advogados na análise de autuações fiscais tendentes a desconsiderar atos ou negócios jurídicos tributários provenientes de planejamentos pautados na licitude.

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MACHADO, Hugo de Brito. Introdução ao Planejamento Tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2019.

DERZI, Misabel Abreu Machado; LOBATO, Valter. Planejamento Tributário, a ADI 2.446 e a Constitucionalidade da Norma Geral Antievasiva no Sistema Tributário Nacional. In: BRIGAGÃO, Gustavo; MATA, Juselder Cordeiro da (Orgs.). Temas de Direito Tributário em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Belo Horizonte: Arraes, 2020.

MACHADO, Hugo de Brito. Introdução ao Planejamento Tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2019.

ROCHA, Sergio André. Planejamento Tributário na Obra de Marco Aurélio Greco. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019.

ROCHA, Sergio André. Para que Serve o Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN Afinal? In: GODOI, Marciano Seabra de; ROCHA, Sergio André (Coords.). Planejamento Tributário: Limites e Desafios Concretos. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2018.

TORRES, Ricardo Lobo. Planejamento Tributário: Elisão Abusiva e Evasão Fiscal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.

Letícia de Mello
Mestranda em Direito (UNISINOS); Especialista em Direito Penal Econômico (IDPEE); Especialista em Direito e Processo Penal (FMP); Especializanda em Direito Tributário (FMP); Professora; Advogada.

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