Migalhas de Peso

A transcendência entre o realismo e idealismo internacional

A difícil interação entre as normas e condutas, produzidas internamente pela lei suprema de um país e os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, após as crises globalizadas geradas nas duas grandes guerras mundiais.

23/7/2024

Historicamente falando de Direito humanos, sabe-se que foram positivados, após os conflitos armados e as crises humanitárias geradas com as duas grandes guerras mundiais. Nesse contexto, antes da promulgação destes direitos supracitados, havia autoritarismo por parte das autoridades, abuso de uso da força e não existia a proteção do direito à dignidade da pessoa humana e à vida. Destarte, a filósofa Hanna Arendt descreveu, em seu livro Eichmann em Jerusalém, sobre “a banalidade do mal”, descortinando as atrocidades acometidas no Holocausto, com a finalidade de resguardar a supremacia da raça ariana no mundo. 

Nessa linha de discussão, o paradigma idealizado pelas grandes nações se pautava no Realismo, cuja segurança e poder se exprimia no Estado como um ator e sujeito nacional, fortalecido para suprimir outros Estados, na ocorrência de conflitos bélicos. Nessa toada, comparando-se o realismo com um tabuleiro de xadrez fictício, infere-se que cada Estado tinha a autonomia absoluta para definir suas próprias estratégias, sem se importar com a internacionalização de direitos e suas decorrências. Ou seja, a única forma de um ente político internacional obter o equilíbrio era promover guerras, impondo sua soberania e o interesse pessoal se traduzia no nacional. Para muitos juristas, o pessimismo antropológico não conseguia acompanhar o progresso humano nos campos socioeconômicos e culturais, gerando a crise institucional internacional humanitária. 

Após o fim da 1ª guerra mundial, criou-se a Liga das Nações, com a finalidade da coletividade da pacificação e reorganização estrutural, diante da anarquia realista imposta. Todavia, o trabalho realizado por esta foi destruído pela axiologia nacionalista alemã, conquistando mais da metade da Europa- fato que causou muita desconfiança global na capacidade de inter-relacionamento humanizado entre os Estados. Explicando melhor, a Liga das Nações, outrora criada para pacificar, não tinha o condão de arrefecer a soberania estatal e as atitudes das autoridades, uma vez que não ostentava a capacidade sancionatória e coercitiva. Segundo o historiador Thomas Huhn, “A sociedade internacional era formada por atores politicamente autônomos, interdependentes com múltiplas relações que podem ser cooperativas ou opostas”. 

Com a finalização da 2ª guerra mundial, instituiu-se a ONU com o intuito de cooperação coletiva para a paz, promovendo a proteção dos Direitos humanos. Posteriormente, em 1945, houve a assinatura da Carta das Nações Unidas comprometendo-se a manutenção da cooperação internacional. Entretanto, este fato não impediu a polarização das potências americanas e russas na “Guerra Fria” instaurada, demonstrando que o ideal Realista estava no comando das instituições. Em consequência disso, os Estados perceberam a real necessidade de regular as relações entre si e criar normas de coexistência globalizada, pois a ameaça nuclear assombrava a todos. 

Nessa linha de pensamento, as ideias de Immanuel Kant se sobressaíram para contrariar a valoração Realista anárquica, encontrando reduto no Idealismo antropológico de que o homem é naturalmente bom. Isto é, os pensamentos deveriam ser preestabelecidos para cooperação entre as instituições internacionais. Por conseguinte, havia a expressão no pensamento otimista da natureza humana e na resolução pacífica dos conflitos. Para se exemplificar, a realização do Pacto Kellogg-Briand em 1928 foi um marco na proibição de guerras e armamentos militares. Nessa perspectiva, o homem passou a ser um sujeito de direito subjetivo em nível internacional, conquanto ainda necessitava de instituições concretas para regularização de normas coletivas sui generis. 

Finalmente, após toda a dissertação sobre o embate e a complementariedade do Realismo e o Idealismo mundiais, preconizou-se o Institucionalismo liberal, na figura de Organizações intergovernamentais, não governamentais e Convenções internacionais. Para o jurista Kenneth Waltz, “A política mundial, embora não esteja formalmente organizada, não está inteiramente sem instituições e procedimentos ordenados”. Nesse diapasão, retoma-se a discussão sobre o grau de coercitividade das decisões destas instituições para sancionar atitudes advindas de autoridades estatais, uma vez que há a proteção do direito interno específico. Assim, existem países que sobrepõem os direitos humanos internacionalizados aos inerentes à própria Constituição, mas alguns priorizam a supremacia e autonomia normativa intrínseca. Desse modo, não se pretende esgotar o tema internacional, mas aguçar o senso crítico para a adaptação da melhor axiologia às reais necessidades de cada nação em equilíbrio com a globalização de interesses pacíficos. 

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Calduch, Rafael. A Sociedade Internacional em Relações Internacionais. (p.63-79) 1991. Madri. Ediciones Ciencias Sociales 

Kuhn, Thomas. ; The Structure of Scientific Revolutions, 2nd Ed. Uni. Of Chicago Press, 1970. 

Morgenthau, Hans. Política entre as nações, Nova Iorque. 1942. 

Joseane de Menezes Condé
Mestranda em Direito FUNIBER, pós graduação em Direito Constitucional Damásio, pós graduanda em direito tributário Anhanguera, coautora do livro novos temas de direito e pós modernidade (2023).

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