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As novidades da resolução CVM 204/24 para as assembleias gerais das companhias abertas

Resolução CVM 204/24 moderniza normas de assembleias de acionistas, focando em eficiência e redução de custos, destacando o boletim de voto a distância.

17/7/2024

A Resolução CVM 204/24 (Resolução 204), publicada no início do mês de junho/24, com vigência programada para 2/1/25, estabelece alterações relevantes na Resolução CVM 80/22 (Resolução 80) e na Resolução CVM 81/22 (Resolução 81), especificamente no que concerne às normas sobre assembleias de acionistas, com o intuito de tornar o procedimento mais efetivo e menos custoso para os envolvidos. As mudanças, que modernizam as normas de participação e votação a distância em assembleias de acionistas, envolvem boletim de voto a distância, solicitação de voto múltiplo via boletim, mapas de votação, participação em assembleia e uso de sistemas eletrônicos.

Sobre o BVD - boletim de voto a distância, que será o objeto central do presente artigo, a regra atual (contida no art. 26 da Resolução 81) é a de que, em até 1 mês da data marcada para a realização da assembleia, a companhia deve disponibilizá-lo: (i) por ocasião da assembleia ordinária; (ii) sempre que a assembleia geral for convocada para deliberar sobre a eleição de membros do conselho fiscal ou do conselho de administração; e (iii) sempre que a assembleia geral extraordinária for convocada para ocorrer na mesma data marcada para a ordinária. Em outras hipóteses, o BVD é atualmente dispensado, podendo ser utilizado pela companhia facultativamente.

Também há previsão, conforme regulamentação atual, de que a companhia pode disponibilizar aos acionistas sistema eletrônico para o envio do BVD ou participação a distância durante a assembleia.

Com a nova regra trazida pela Resolução 204, o BVD precisará ser sempre apresentado pelas companhias, salvo nas hipóteses de dispensa tratadas adiante. Assim, além de mantidas as obrigatoriedades de disponibilização vigentes, nos termos acima explicitados, o BVD deverá ser disponibilizado para todas as demais assembleias [nestes casos, em até 21 (vinte e um) dias antes da data marcada para o conclave]. Trata-se, portanto, de nova obrigação em relação a qual as companhias abertas precisarão ficar atentas à partir de 2025.

Além da mudança sobre sua disponibilização, o BVD, no novo regramento, poderá ser recebido do acionista em até 4 dias antes da data da assembleia, e não mais em 7 dias. A considerável redução do prazo pode, eventualmente, intensificar os dias precedentes à assembleia, tendo em vista que existem diversas outras obrigações a serem observadas pela companhia. Por outro lado, a mudança pode ser benéfica para os acionistas, que terão maior prazo para envio do BVD a um dos receptores estabelecidos.

A propósito, a lista de receptores do BVD foi ampliada pela Resolução 204. A partir do início da sua vigência (i.e., em janeiro/25), o acionista poderá remeter o documento: (i) diretamente à companhia, por meio postal ou eletrônico, observando, se houver, as orientações do anúncio de convocação ou dos demais documentos e informações disponibilizados aos acionistas; (ii) por transmissão de instruções de preenchimento para prestadores de serviço aptos a prestar serviços de coleta e transmissão de instruções de preenchimento do BVD, a saber: (a) o custodiante do acionista, caso as ações estejam depositadas em depositário central; (b) a instituição financeira contratada pela companhia para prestação dos serviços de escrituração de valores mobiliários caso as ações não estejam depositadas em depositário central; e (novidade) (c) o depositário central no qual as ações estejam depositadas.

A companhia aberta poderá, a partir das alterações trazidas pela Resolução 204, disponibilizar correio eletrônico para recebimento do BVD pelo acionista, em exclusão à possibilidade do recebimento por correio postal. Trata-se, certamente, de fluxo favorável aos acionistas e às companhias, haja vista que o recebimento postal pode apresentar gargalos tanto quanto ao seu trânsito (já que o documento pode ser extraviado ou atrasar por razões alheias à vontade do acionista), como na chegada na sede companhia (tendo em vista que o documento pode não necessariamente ser entregue ao responsável direto pelo recebimento).

Outra possibilidade adequadamente regrada pela nova Resolução 204 consiste no recebimento do BVD via sistema eletrônico específico, sendo este meio excludente à recepção por correio postal ou eletrônico. Esta solução, em especial, acaso devidamente implantada, terá potencial para garantir maior participação dos acionistas em assembleias.

A Resolução 204 demonstra, aliás, de forma evidente e acertada, essa preocupação. Suas disposições, como bem escudado pela CVM ao longo dos últimos anos, servem para impulsionar a democratização do mercado de capitais brasileiro, fomentando um maior engajamento e participação dos acionistas no processo deliberativo das companhias.

Seguindo com as alterações, o sistema eletrônico disponibilizado para envio BVD pode permitir aos acionistas que assinem o boletim e os demais documentos de representação do acionista diretamente no próprio sistema eletrônico, desde que as assinaturas sejam feitas por meio de certificação digital ou reconhecidas por outro meio que garanta sua autoria e integridade em formato compatível com o adotado pela companhia para a realização da assembleia.

Quanto às hipóteses de dispensa do BVD, o art. 30-A a prevê quando cumulativamente verificadas as seguintes condições: (i) a assembleia geral ordinária mais recente da companhia tenha sido realizada tempestivamente; (ii) na assembleia geral ordinária mais recente e nas demais assembleias de acionistas desde então realizadas, a companhia: a) tenha disponibilizado tempestivamente o boletim de voto a distância ou não o tenha feito por já estar dispensada, nos termos do regulamento; e b) tenha recebido por meio do boletim de voto a distância votos correspondentes a ações representativas de menos de 0,5% (meio por cento) do capital social; (iii) até o momento da convocação da assembleia na qual a companhia pretenda valer-se da dispensa, não tenha sido recebido pedido de inclusão no boletim de candidatos ou propostas; (iv) a companhia tenha convocado a assembleia na qual pretenda valer-se da dispensa de que trata este artigo tenha com ao menos trinta dias de antecedência, indicando expressamente a intenção de não disponibilizar o boletim de voto a distância, e não tenha sido tempestivamente comunicada de oposição por parte de acionistas, nos termos do da resolução; e (v) não tenha ocorrido oferta pública de distribuição de ações de emissão da companhia desde a assembleia ordinária mais recente.

Ou seja, as companhias abertas devem seguir a regra geral, de disponibilizar o BVD aos acionistas, e, excepcionalmente, podem deixar de utilizá-lo (conforme regras atuais, conforme ressaltado acima, é necessária a utilização do BVD apenas em determinadas hipóteses, como no caso da realização de uma assembleia geral ordinária).

Ademais, no caso de realização de assembleia que pretenda eleger membros do conselho de administração, a Resolução 204 estabelece que, caso não haja candidatos ao conselho de administração além daqueles indicados pela administração ou pelo acionista controlador, a solicitação de adoção de voto múltiplo formulada mediante BVD fica sem efeito. Isso também vale para o caso de solicitação, via BVD, de instalação do conselho fiscal: o pedido fica sem efeito se não existirem candidatos ao órgão fiscal.

A CVM, como visto, empenha-se para tornar a regulamentação mais coesa, segura e atualizada em relação às novas tecnologias. As mudanças regulamentares têm sido frequentes e, sobretudo, relevantes para o mercado de capitais, de modo que as companhias precisam se manter bem assessoradas e estarem atentas para evitar descumprimentos às normas estabelecidas pela autarquia, evitando-se desdobramentos negativos e penalizações.

Especificamente quanto aos tópicos acima tratados, as companhias deverão adaptar seus sistemas e rotinas para atender as novas regras da Resolução 204, que representam um importante avanço no desenvolvimento das assembleias de acionistas no Brasil, contribuindo positivamente para um ambiente negocial mais democrático, moderno e eficiente.

Cássio N. de Lira Braga
Advogado integrante do Monteiro de Castro, Setoguti Advogados. Mestre em ciência política na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). Pós-graduado em direito empresarial na Fundação Getulio Vargas (FGV). Bacharel em direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

Karina Miranda
Advogada integrante do Monteiro de Castro, Setoguti Advogados. Pós-graduada em direito empresarial na Fundação Getulio Vargas (FGV) e pós-graduanda em direito societário no Instituto Luiz Mário Moutinho. Bacharela em direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

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