1. O incensado marco legal das garantias alterou o art. 26 da lei 9.514/97 com o objetivo de permitir que nos casos de multiplicidade de garantias imobiliárias e de circunscrições registrais, a intimação do devedor inadimplente ou do fiduciante para a purgação da mora seja realizada por qualquer dos ofícios de registro envolvidos, informando a totalidade da dívida e relacionando os imóveis passíveis de consolidação da propriedade, com a seguinte redação:
Art. 26.
[...]
§ 1º-A Na hipótese de haver imóveis localizados em mais de uma circunscrição imobiliária em garantia da mesma dívida, a intimação para purgação da mora poderá ser requerida a qualquer um dos registradores competentes e, uma vez realizada, importa em cumprimento do requisito de intimação em todos os procedimentos de excussão, desde que informe a totalidade da dívida e dos imóveis passíveis de consolidação de propriedade.
Inexplicavelmente, deixou o legislador de assegurar um detalhamento procedimental mínimo e comum destinado ao controle de informações e anotações entre o ofício de registro escolhido pelo credor fiduciário e os demais registros envolvidos, especialmente para assegurar a estrita observância do princípio da publicidade registral, o controle de títulos contraditórios e a advertência sobre a intimação pendente nas certidões de matrícula emitidas por qualquer deles, tornando as matrículas imobiliárias vulneráveis à averbação de penhoras, indisponibilidades, cessão de direitos reais, dentre outras, durante todo o período intimatório em situação de extremada insegurança jurídica das partes e de terceiros interessados.
Cumpre salientar que não foi por excesso de zelo, que a Corregedoria de Justiça do TJ/SP introduziu o item 240 nas Normas de Serviços do Cartório Extrajudicial dispondo que “o requerimento de intimação deverá ser lançado no controle geral de títulos contraditórios, a fim de que, em caso de expedição de certidão da matrícula, seja consignada a existência da prenotação do requerimento”.
2. Em nada ajuda a Nota Técnica 2/24 do RIB - Registro de Imóveis do Brasil que “sugere” ao interessado (fiduciário) que, “para que a intimação tenha eficácia”, apresente às demais serventias de registro de imóveis certidão conforme quesito expedida pelo ofício responsável pela notificação com as informações do conteúdo da intimação realizada e, ainda “se foi exitosa”, nos seguintes termos:.
O interessado estará dispensado de protocolizar o pedido de intimação perante as outras serventias competentes se, em uma delas, formular um pedido de intimação informando a totalidade da dívida, encargos e todos os imóveis passíveis de consolidação.
Pela dinâmica da lei, é conveniente que o credor informe todos os imóveis garantidos na intimação, ainda que pretenda fazer a consolidação, inicialmente, em apenas um imóvel, pois, desta forma, conseguirá aproveitar a intimação prévia para as consolidações sucessivas.
A medida se justifica para evitar surpresas para o devedor, que, ao ser intimado por um documento dirigido a uma determinada serventia, poderia imaginar que a consequência da mora atingiria apenas o bem registrado naquele ofício e levando-o a crer que os demais estariam salvos da execução.
Para que esta intimação tenha eficácia perante as demais, o interessado deverá apresentar uma certidão conforme quesito expedida pela serventia responsável pela intimação. Ela deverá certificar que o requerimento do interessado abarcou a totalidade da dívida, encargos, quais imóveis constaram da intimação como sujeitos à consolidação fiduciária e, ainda, que a referida intimação foi exitosa.
Salvo melhor juízo, a expedição dessa certidão pelo ofício de registro eleito – contendo informação sobre o êxito da intimação realizada – conforme sugestão da nota técnica parcialmente transcrita somente será possível após a efetiva intimação e conclusão do procedimento,
Aliás, essa informação de que a “referida intimação foi exitosa” nos parece absolutamente desnecessária. O que importa para a consecução do procedimento nas demais serventias é a certificação do atendimento do quanto intimado com o pagamento da dívida para o cancelamento da prenotação ou do decurso do prazo legal ‘in albis’, inaugurando o prazo para a comprovação de pagamento dos tributos devidos pelo fiduciário e consolidação da propriedade.
Evidentemente, considerado o grau de importância da intimação para a purgação da mora no procedimento extrajudicial de execução na alienação fiduciária de bem imóvel a incumbência de proceder a certificação da prenotação do requerimento de intimação envolvendo imóveis e direitos reais objeto de matrículas sob a responsabilidade de outras serventias deve ser imputada ao ofício de registro escolhido para a empreitada, que zelará pelo controle e manutenção da legalidade dos atos praticados.
Cumpre ressaltar – ainda que nem o legislador nem os técnicos da entidade representativa dos registradores de imóveis tenham mencionado – a situação bastante comum nas transações entre pessoas jurídicas de contratos com múltiplas garantias prestadas por múltiplos fiduciantes (acionistas, sócios, pessoas jurídicas vinculadas), que exigirão a intimação pessoal de cada um dos fiduciantes, sem afastar, entretanto, a possibilidade de abranger duas ou mais garantias prestadas individualmente.
3. Para afastar a apontada insegurança jurídica e a vulnerabilidade registral em relação aos direitos envolvidos – e sem a pretensão de ‘ensinar o padre a rezar a missa’ – tomo a liberdade de apresentar um rol de procedimentos para a intimação única de múltiplos imóveis com a exigência dos seguintes cuidados:
- o requerimento deve conter, além dos requisitos comuns, informação sobre o ofício de registro dos imóveis, o número da matrícula, o número e data do registro de cada um dos contratos de alienação fiduciária abrangidos pela intimação, cuidando o requerente de comprovar, quando se tratar de contrato específico de garantia, a vinculação da garantia ao contrato principal inadimplido, informações essas que serão transcritas para o instrumento padrão de intimação utilizado pelo ofício de registros;
- concomitantemente à expedição ou postagem da intimação, o Registro de Imóveis encaminhará certidão a cada uma das serventias imobiliárias, preferencialmente por meio eletrônico, diretamente ou através de entidade representativa dos registradores, sobre a instauração do procedimento intimatório, que será prenotado e lançado no controle geral de títulos contraditórios para que seja consignada sua existência no caso de emissão de certidão da matrícula imobiliária;
- na hipótese do recebimento do valor cobrado, o Registro de Imóveis enviará certidão informando sobre a purgação da mora e convalescimento dos contratos de alienação fiduciária, para que cada uma das serventias proceda ao cancelamento dos efeitos da prenotação;
- na outra hipótese – não recebimento do valor cobrado no prazo legal – noticiará o ocorrido a cada uma das serventias, por meio de certidão de transcurso do prazo para purgação da mora, possibilitando que, mediante comprovação do recolhimento dos tributos exigidos legalmente, possa o credor fiduciário requerer a consolidação da propriedade em seu nome.
- obviamente a cobrança dos emolumentos correspondentes devidos pelos interessados, deverão ser formalizados pelas corregedorias gerais dos Tribunais de Justiça dos Estados.
Finalmente, entendemos que os procedimentos acima expostos para conhecimento e apreciação poderão ser adotados mediante provimento da Corregedoria Geral de Justiça ou por simples nota técnica do RIB sem a necessidade de atividade legislativa ordinária.