Sabe-se que quando se trata de empresa que se encontra em processo de recuperação judicial, uma das vantagens aos credores é que estes poderão negociar junto a companhia um plano de pagamento que caiba em seu fluxo de caixa e, doutro lado, não implique em prejuízo aos credores dela sujeitos nos termos do art. 49 da lei 11.101/05 (“LFR”).
Dentre os efeitos gerados pela aprovação do plano de pagamento do devedor em recuperação judicial, um deles é que com a homologação pelo juízo competente, o documento passa a ter força contratual e, consequentemente nova-se a obrigação anterior (art. 59 da LRF), atraindo, inclusive, uma força executiva ao que foi pactuado.
Com isso, ainda que o juízo competente onde se processe o pedido de recuperação judicial tenha o dever de analisar eventuais ilegalidades nos moldes taxativos da Lei 11.101/2005, fato é que, justamente pela índole marcadamente contratual, ele não poderá se insurgir contra as tratativas negociais, dado o direito disponível dos credores sujeitos aos efeitos do procedimento, tal como decidido no REsp 1.631.762/SP.
Por essa ótica, se o juiz não pode adentrar no conteúdo econômico-financeiro da empresa recuperanda, igualmente não cabe a ele dispor sobre diversas cláusulas contidas em diversos planos de recuperação judicial, como quando a empresa, apenas para fins de resguardado e na remota hipótese de ter a sua situação patrimonial afetada, inclui cláusula específica de, na hipótese de o plano ser descumprido, poderá ser convocada uma nova assembleia para deliberação de um modificativo das condições de pagamentos anteriormente aprovadas e homologadas.
Tal cláusula não somente preserva o interesse da própria empresa, ante o princípio da preservação insculpido no art. 47 da LRF, como também permite aos credores que, ainda que se deparem com um descumprimento do acordo, possam novamente entender a situação econômica da empresa e, consequentemente, negociar novas condições, seja em razão de prazo, deságio, ou até mesmo juros e correção monetária.
E isso não implica na inobservância do art. 73, IV da LRF, dentre o qual normatizou que o juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, visto que, para além da força contratual já sedimentada pelos Tribunais Pátrios e STJ, igualmente foi chancelada no julgamento do Resp 1.830.550/SP.
Observa-se, assim, que o julgado põe fim à polêmica no que referia ao controle judicial sobre o plano de recuperação, e, especificamente quanto a cláusula em comento, deixando claro que, ainda que exista descumprimento das condições aprovadas, tal fato não ocasionará a aplicação automática do art. 73 da LRF quando se tratar de PRJ que contenha a cláusula para convocação de um novo ato assemblear.
O Tribunal andou bem ao decidir nessa linha, visto que para além das discussões anteriormente existentes acerca do controle judicial já ter caído por terra, igualmente atesta o que já era entendimento pacificado da força contratual do plano de recuperação judicial, e, como bem fundamentado no v. acórdão “Referida resolução é extremamente benéfica à continuidade da empresa e, por conseguinte, à sociedade, pois permite a manutenção de postos de trabalho e a circulação e geração de riquezas, bens e serviços, assim como o recolhimento de tributos”.
Assim, o julgado traz segurança jurídica ao que expressamente foi deliberado em assembleia geral de credores, bem como garante a soberania da decisão dos credores referente ao conteúdo do plano de recuperação judicial.