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Previdência social: Alteração da tese a ser tratada no tema 1.124 do STJ

O STJ alterou a tese jurídica que será discutida e fixada no Tema 1.124, que trata dos efeitos financeiros de benefícios previdenciários concedidos a partir de novos elementos de prova.

4/6/2024

O STJ afetou em 2021 para julgamento em sede de recurso especial repetitivo o Tema 1.124, cuja tese jurídica originária era a seguinte:

Definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS: se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária.

O julgamento do tema, inicialmente pautado para 22.5.24, foi precedido por questão de ordem na qual se aprovou a alteração da tese que será debatida e fixada, a qual passou a ser a seguinte:

Caso superada a ausência do interesse de agir, definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS, se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária.

Como se vê, houve o acréscimo do seguinte tópico à ementa do Tema 1.124: “Caso superada a ausência do interesse de agir, definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários”.

Ou seja, à questão inicial de mérito, relativa à fixação do termo inicial dos efeitos financeiros da implementação do benefício previdenciário obtido a partir de novos elementos de prova (a partir do requerimento administrativo ou da data da citação da autarquia previdenciária), agregou-se o debate a respeito da configuração do interesse processual.

O primeiro ponto que deve ser ressaltado é a possibilidade de o STJ pode realizar esse movimento processual.

Com efeito, o STJ, no julgamento dos recursos especiais repetitivos e formulação de teses jurídicas dotadas da qualidade de precedentes qualificados (arts. 926 a 928 do CPC/15), não se encontra completamente “preso” ao paradigma processual clássico de adstrição ao pedido (mais vinculado à perspectiva das lides individuais).

No julgamento dos recursos especiais repetitivos, conforme construção histórica realizada desde 2009, ainda sob a égide do CPC/73, importa menos o caso concreto e muito mais o estabelecimento da tese jurídica que repercutirá efeitos nos demais processos que tratem do mesmo tema.

Essa compreensão é reforçada pelo art. 105, inciso III, da Constituição Federal, que estabelece o papel constitucional do STJ:

Art. 105. Compete ao STJ:

III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

  1. contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;
  2. julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; 
  3. der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Ou seja, o STJ é o Tribunal superior que possui a missão constitucional de definir a correta interpretação da legislação federal infraconstitucional.

Assim, poderá esse Sodalício, no exercício de sua função hermenêutica diferenciada, alterar a tese jurídica que será tratada no âmbito dos recursos especiais repetitivos.

Não custa lembrar que o STJ poderá realizar a alteração das teses jurídicas inclusive já fixadas, através do mecanismo conhecido como overruling.

Por todos estes argumentos, compreende-se que não há qualquer descabimento nesta conduta processual adotada pelo STJ quanto ao Tema 1.124.

Todavia, e especialmente por influência do princípio do devido processo legal, consideramos que é necessário, legítimo e democrático franquear nova possibilidade de manifestação processual aos diversos atores processuais que atuaram como amicus curiae no debate em torno do Tema 1.124.

Ademais, essa pretensão encontra espeque no art. 927, § 2º, do CPC:

§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.

Consideramos que tal reabertura para participação social na formação dessa tese jurídica vinculante pode ocorrer na própria sustentação oral a ser realizada na sessão de julgamento do Tema 1.124 ou, quiçá, a partir da apresentação de memoriais complementares aos ministros do STJ.

Por outro lado, cabe compreender qual o correto alcance da mudança imposta à tese que será objeto de debate pelo Superior Tribunal de Justiça.

Houve o acréscimo do seguinte tópico à ementa do Tema 1.124: “Caso superada a ausência do interesse de agir, definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários”.

Os debates pelo STJ ainda irão ocorrer no julgamento do Tema 1.124, mas cogita-se que a interpretação desse novo item pode se desdobrar em dois eixos possíveis: a) o reconhecimento do interesse de agir no caso da apresentação de novos meios de prova será tratado e fixado pela própria tese jurídica a ser construída pelo STJ? b) o reconhecimento do interesse de agir será objeto de apreciação pelas instâncias de origens, no caso concreto?

Para tanto, relevante recordar os dois marcos normativos centrais a respeito do interesse processual em matéria previdenciária.

O interesse processual (apesar de a ementa do Tema 1.124 ainda se referir à expressão do CPC/73, relativa a interesse de agir) está previsto no art. 17 do CPC/15.

No âmbito previdenciário deve ser ressaltado o Tema 350 do STF, que exige o prévio requerimento administrativo para configuração do interesse processual:

I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas; II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado; III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão; (...) V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.

Eis os principais aspectos processuais que podemos indicar em relação à mudança da tese jurídica que será debatida pela 1ª seção do STJ no Tema 1.124.

Marco Aurélio Serau Junior
Diretor Científico do IEPREV - Instituto de Estudos Previdenciários.

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