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Análise crítica do contrato de doação no âmbito das relações jurídicas condominiais

A doação, concebida como modalidade contratual bilateral, requer manifestação de vontade das partes. No contexto condominial, a assembleia deve autorizar expressamente. A formalização, inclusive em cartório, é essencial, especialmente se envolver ônus.

28/5/2024

Tratando-se de negócio jurídico bilateral, deve-se conceber o instituto da doação como uma modalidade contratual.Nesse sentido, resta vetusta e obsoleta a classificação oriunda do Direito Romanode que a doação encontra a sua natureza jurídica como "modo de aquisição da propriedade".

Com efeito, no âmbito dos condomínios edilícios, não é raro se deparar com empresas que queiram doar bens ao condomínio, o mesmo ocorrendo, vez ou outra, até mesmo com condôminos. Ademais, nada obsta que o condomínio possa ser o doador de bens ou de valores, desde que, para esse fim, tenha sido expressamente autorizado pela assembleia geral de coproprietários.

Nesse sentido, para que a doação se aperfeiçoe, necessário se faz que se manifeste materializada a vontade de, pelo menos, duas partes. Ter-se-á, nessa particular e especial relação jurídica contratual, a figura, de um lado, a do doador (aquele que realiza a doação), e de outro, a do donatário (aquele que recebe a doação).

Segundo o nosso sentir, para que o condomínio possa receber uma doação, especialmente de grande expressão, convém seja consultada a assembleia geral de condôminos, em especial, quando referido negócio jurídico contemplar algum tipo de ônus ou obrigação. Convém ainda que ela venha a ser formalizada e até mesmo levada e registro em Cartório de Títulos e Documentos.3

Por vezes, a doação vem travestida de ato de mera liberalidade4 e despretensão, quando na verdade, subliminarmente, ou de forma expressa, importa em criar deveres jurídicos ao condomínio, muitas vezes prejudiciais aos interesses da coletividade.

Há assim de se examinar detidamente cada caso concreto, para que se possa aferir o grau de vantajosidade nas denominadas doações condicionadas, para que o negócio jurídico não venha a refletir em situação embaraçosa ou lesiva ao condomínio.

Cogite-se da empresa que, a pretexto de obter um contrato com prazo determinado por demais extenso, vem a oferecer "graciosamente" diversos "mimos" ao condomínio, como equipamentos diversos ou mesmo benfeitorias. Nesses casos, a vontade da assembleia deve ser colhida pelo síndico, bem como a situação concreta deve ser minuciosamente examinada, para que não se venha a deparar com uma hipótese de "cavalo de Tróia".

Há assim de se perquirir a consensualidade de ambas as partes envolvidas no contrato, exigindo-se, por um lado, a manifestação de aceite do donatário, lembrando, por demais, que a doação poderá ocorrer, especialmente quando sua manifestação de vontade no sentido de doar venha a ser reduzida a termo ou efetivada de outra maneira inconteste, hipótese em que haverá de independer da efetiva transmissão do bem doado para que possa atingir o status jurídico de aperfeiçoamento.

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1 Nesse sentido, assim afirma o art. 538 do Código Civil brasileiro: “Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

2 Segundo a assentada orientação proveniente do Direito Romano, consolidada por meio das Institutas de Justiniano, a doação era incluída entre os meios de aquisição da propriedade, deixando de integrar as modalidades contratuais.

3 TJ/SC - Recurso Administrativo 56386502019. Jurisprudência - Acórdão - Data de publicação: 15/10/2019. RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA INVERSA. RECUSA DO TITULAR DO 2º TABELIONATO DA COMARCA DA CAPITAL EM LAVRAR ESCRITURA DE DOAÇÃO A CONDOMÍNIO EDILÍCIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA POR FALTA DE ANUÊNCIA DOS CONDÔMINOS. DESNECESSIDADE. CONDOMÍNIO DOTADO DE PERSONALIDADE JURÍDICA E AQUISIÇÃO EM BENEFÍCIO AOS CONDÔMINOS. POSSIBILIDADE DE LAVRATURA DO DOCUMENTO. RECURSO PROVIDO.

4 A partir de 2006, a liberalidade foi definida no art. 893 do Código Civil brasileiro, que dispõe: “A liberalidade é o ato através do qual uma pessoa dispõe a título gratuito do todo ou de parte de seus bens ou de seus direitos em benefício de outra pessoa”.

Vander Andrade
Advogado. Especialista, Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Professor Universitário e de Pós-Graduação. Presidente da Associação Nacional de Síndicos Profissionais.

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