A segurança em condomínios residenciais é uma preocupação constante para os moradores, síndicos e administradores. Dentre as diversas medidas de proteção disponíveis, a instalação de cercas elétricas e concertinas tem sido uma opção adotada por muitos condomínios como forma de deter invasões e garantir a integridade dos residentes e do patrimônio. No entanto, a legalidade dessa prática tem sido alvo de debates e questionamentos.
Este artigo busca analisar a possibilidade jurídica da instalação de cercas elétricas ou concertinas em condomínios, defendendo sua viabilidade dentro do arcabouço legal brasileiro. É importante ressaltar, contudo, que cada município pode estabelecer regras específicas quanto à instalação desses dispositivos, além dos critérios estabelecidos pela ABNT, os quais devem ser rigorosamente observados.
A. Legislação e princípios pertinentes
No ordenamento jurídico brasileiro, não existe uma legislação específica que regulamente de forma abrangente a instalação de cercas elétricas ou concertinas em condomínios. No entanto, alguns dispositivos legais e princípios gerais do direito podem ser invocados para embasar essa prática.
Nesse contexto, é importante considerar o princípio da autotutela, que permite a defesa legítima do patrimônio e da integridade física, desde que observados os limites da proporcionalidade e da razoabilidade.
Assim, a instalação de cercas elétricas ou concertinas pode ser justificada como uma medida de legítima defesa coletiva, desde que não represente um risco desproporcional para a integridade física dos moradores ou de terceiros.
No mais, o Código Civil Brasileiro estabelece a “contrario sensu” em seu artigo 1.336, IV, a competência do condomínio para determinar as obras necessárias para a segurança do edifício. Nesse sentido, a instalação de dispositivos de segurança, como cercas elétricas ou concertinas, pode ser interpretada como uma medida necessária para garantir a segurança do condomínio.
Além disso, o direito à segurança é um direito fundamental previsto na CF/88, o que respalda a adoção de medidas que visem proteger a integridade física e o patrimônio dos cidadãos, inclusive no âmbito condominial.
No entanto, é importante alertar que a instalação de cercas elétricas ou concertinas deve ser precedida de autorização prévia em assembleia condominial.
B. Normas técnicas e regulamentações municipais:
Apesar da ausência de uma legislação específica, a ABNT estabelece normas técnicas que devem ser seguidas na instalação de cercas elétricas e concertinas. Entre essas normas, destacam-se a NBR 5.419, que trata de proteção contra descargas atmosféricas, e a NBR 15.401, que estabelece os requisitos mínimos para cercas elétricas de segurança.
Ademais, é importante ressaltar que cada município pode estabelecer regulamentações específicas quanto à instalação desses dispositivos de segurança. Essas regulamentações podem variar desde a exigência de autorização prévia do poder público até a definição de padrões estéticos e técnicos a serem seguidos.
C. Legislação municipal de Praia Grande:
No âmbito da legislação municipal de Praia Grande, destaca-se a lei complementar 584 de 13/5/11, que dispõe sobre a instalação e manutenção de cercas energizadas em imóveis situados no município. Esta lei estabelece normas e diretrizes específicas para a instalação desses equipamentos, bem como responsabilidades dos proprietários e requisitos técnicos a serem observados.
A seguir, segue um resumo dessa lei:
- Regulação da instalação: A lei define que a instalação de cercas energizadas, independentemente do tipo de propriedade (pública ou privada), é regulada por esta lei complementar, seguindo normas federais e estaduais e as diretrizes da ABNT.
- Projeto de instalação: Para instalar a cerca energizada, é necessário apresentar um projeto completo, incluindo plantas elétricas, memoriais descritivos, declarações de conformidade técnica e ART - Anotação de Responsabilidade Técnica emitida pelo CREA.
- Responsabilidade técnica: Engenheiros eletricistas com registro na prefeitura de Praia Grande são responsáveis pelos projetos e instalações.
- Características técnicas da cerca: A lei estabelece especificações técnicas para a tensão, corrente, duração dos impulsos elétricos, tipo de corrente, potência máxima, entre outros.
- Normas de segurança: Determina o uso de materiais específicos, como isoladores duráveis e não higroscópicos, e proíbe o uso de arames farpados.
- Sinalização: Exige a instalação de placas de advertência a cada 10 metros da cerca energizada, nos portões de acesso e em mudanças de direção, com especificações quanto ao texto, dimensões e cores.
- Manutenção e fiscalização: Os proprietários devem manter as instalações em perfeitas condições de funcionamento e são sujeitos a multas em caso de infração. A fiscalização é responsabilidade das Secretarias de Urbanismo e Meio Ambiente e Serviços Públicos.
- Concordância entre Proprietários: Quando a cerca estiver em linhas divisórias de imóveis, é necessária a concordância dos proprietários vizinhos.
A seguir, algumas especificações importantes da lei complementar 584/11 em relação à altura mínima do solo e outras características das cercas energizadas:
- Altura mínima do primeiro fio de arame energizado: Quando a cerca energizada estiver instalada na parte superior de muros, grades, telas ou outras estruturas similares, a altura mínima do primeiro fio de arame energizado deve ser de 2,20 metros em relação ao nível do solo da parte externa do imóvel cercado.
- Espaçamento horizontal entre os arames energizados e outras estruturas: Deve situar-se na faixa de 0,10 a 0,20 metros.
- Tipos de corrente e características técnicas: A corrente elétrica utilizada nas cercas energizadas deve seguir especificações técnicas detalhadas, incluindo tensão de saída, corrente de saída, duração dos impulsos elétricos, intervalos entre impulsos elétricos, tipo de corrente e potência máxima.
- Estrutura de aterramento específico: Deve ser instalada para a cerca energizada, não podendo ser utilizado para este fim outro(s) sistema(s) de aterramento existente(s) no imóvel.
- Proibição de materiais específicos: Fica proibida a utilização de arames farpados ou similares para a condução da corrente elétrica da cerca energizada.
Isto posto, concluímos que a lei aborda de forma detalhada aspectos técnicos, de segurança e de responsabilidade relacionados à instalação e manutenção de cercas energizadas, visando garantir a segurança das pessoas e a conformidade com normas técnicas. Ela oferece clareza sobre os requisitos necessários para a instalação desses dispositivos e define as responsabilidades dos proprietários, engenheiros e autoridades municipais.
Ao exigir a observância das normas da ABNT, a lei promove a padronização e a qualidade das cercas energizadas instaladas no município. Além disso, ao estabelecer medidas de sinalização e manutenção, contribui para a prevenção de acidentes e o bom funcionamento desses sistemas de segurança.
II. Considerações finais
Diante do exposto, é possível concluir que a instalação de cercas elétricas ou concertinas em condomínios é juridicamente viável, desde que observadas as normas técnicas estabelecidas pela ABNT e as eventuais regulamentações municipais. A medida se justifica como uma forma legítima de proteger a segurança dos condôminos e do patrimônio, respeitando sempre os direitos e garantias fundamentais estabelecidos pela legislação brasileira.