A atividade rural se pratica sob o risco de endividamento, e isto não se dá simplesmente pela gestão dos recursos, mas como consequência direta da natureza da atividade exposta a fatores climáticos e comerciais que não são controlados pelo empreendedor rural.
Assim, ao contratar uma operação de crédito rural, seja por meio de uma cédula de crédito rural ou cédula de crédito bancário, o tomador do crédito se obriga a devolver os recursos ao credor na data previamente ajustada. Porém, a exigibilidade do financiamento está relacionada a obtenção de receita pelo produtor rural que lhe capacite de pagar o valor pactuado.
Pois, em hipótese de ocorrer fatores adversos que interfiram na sua atividade e diminuam a sua capacidade de pagamento, assiste ao empreendedor rural o direito de alongar o débito para pagamento posterior, conforme previsão no Manual de Crédito Rural, assegurado pelo parágrafo único do artigo 4o da lei 7.843/89, assim expresso:
“Parágrafo único: Fica assegurada a prorrogação dos vencimentos de operações rurais, obedecidos os encargos vigentes, quando o rendimento propiciado pela atividade objeto de financiamento foi insuficiente para o resgate da dívida, ou a falta de pagamento tenha decorrido de frustração de safras, falta de mercado para os produtos ou outros motivos alheios à vontade e diligência do devedor, assegurada a mesma fonte de recursos do crédito original.”
E pelo item 2.6.4 do Manual de Crédito Rural do Banco Central do Brasil, dispõe:
“4 - Fica a instituição financeira autorizada a prorrogar a dívida, aos mesmos encargos financeiros pactuados no instrumento de crédito, desde que o mutuário comprove a dificuldade temporária para reembolso do crédito em razão de uma ou mais entre as situações abaixo, e que a instituição financeira ateste a necessidade de prorrogação e demonstre a capacidade de pagamento do mutuário:
a) dificuldade de comercialização dos produtos;
b) frustração de safras, por fatores adversos;
c) eventuais ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações.”
Sendo que os prazos de pagamentos devem guardar sintonia com os ciclos de produção e a comercialização dos bens produzidos.
Lembrando que o alongamento e ou prorrogação da dívida rural não se confunde com a revisão e ou redução do débito, mas trata-se de reestruturação para pagamento em ocasião mais favorável ao devedor, sem que isso represente prejuízo ao credor, o qual tem o seu direito preservado de receber o capital acrescido dos juros sobre ele incidentes1.
Assim, diante da situação declarada de emergência por meio do Decreto n.º 10.407, de 5 de fevereiro de 2024 do Estado de Goiás e pela Portaria n.º 485, de 07 de fevereiro de 2024 do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil em decorrência da estiagem nos municípios goianos de Acreúna, Amorinópolis, Araguapaz, Arenópolis, Baliza, Bom Jardim de Goiás, Britânia, Caiapônia, Diorama, Guarani de Goiás, Iporá, Israelândia, Ivolândia, Jaupaci, Moiporá, Montes Claros de Goiás, Mozarlândia, Nova Crixás, Palestina de Goiás, Paraúna, Piranhas, Porangatu, Quirinópolis, Santa Helena de Goiás e Turvelândia, os produtores rurais que exercem sua atividade em áreas situadas nestes municípios e que tenham sofrido redução de sua capacidade de pagamento em razão de frustação de safra ou redução da produção, provocada pela estiagem, podem pleitear o alongamento/prorrogação de sua dívida rural, e poderão formalizar os pedidos junto as instituições financeiras até o dia 31 de maio de 2024, conforme resolução CMN 5.123, de 28/3/24.
Prorrogação que notoriamente se aplica as regiões atingidas pelas inundações no Rio Grande do Sul, sobre as quais devem vir resoluções específicas do Conselho Monetário Nacional, assim esperamos e confiamos na sensibilidade do Poder Público.
Esclarece que o Judiciário possui firme posicionamento sobre o tema, esposado na súmula 298 do Superior Tribunal de Justiça, que entende o alongamento de dívida originada de crédito rural como um direito do devedor nos termos da lei.
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1 Pereira, Lutero de Paiva. Alongamento de dívida rural: teoria e prática. Curitiba: Íthala, 2020, pag. 23.