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Inteligência artificial: Transformando o processo de licitação, eficiência e transparência à luz da lei 14.133/21

A lei 14.133/21 reformulou as licitações e contratos administrativos no Brasil, com um período de transição até abril/23. As entidades governamentais podem escolher entre a nova legislação e a lei 8.666/93, mas não podem combinar disposições das duas. A nova lei busca maior eficiência.

21/4/2024

1. Introdução

A promulgação da lei 14.133, em 1/4/21, introduziu um novo marco regulatório para licitações e contratos administrativos no Brasil, estabelecendo um período de transição até abril de 2023 durante o qual as entidades governamentais podem optar por adotar a nova legislação imediatamente ou continuar operando sob a lei 8.666/93. Esta flexibilidade tem implicações significativas, pois a mistura de disposições das duas leis é proibida, e a escolha feita pelos órgãos governamentais durante este período será crucial para a adaptação ao novo sistema. A nova legislação também aguarda regulamentações adicionais para sua plena implementação, um fator que adiciona uma camada de incerteza e complexidade ao processo de transição.

Historicamente, a lei 8.666/93, também conhecida como a lei geral de licitações e contratos, tem regulamentado o processo de licitação no Brasil por quase três décadas. A lei estabelece que todas as contratações públicas devem passar por um processo licitatório, exceto em casos específicos onde a licitação é dispensada pela legislação. Essa abordagem assegura a transparência e a igualdade no tratamento dos licitantes, princípios fundamentais para a administração pública.

A lei 10.520/02, que introduziu o pregão como uma modalidade de licitação focada em agilidade, complementou a lei 8.666/93, refletindo a necessidade de processos mais rápidos em determinadas aquisições públicas. Este ajuste foi uma resposta às demandas por maior eficiência em compras governamentais, especialmente para bens e serviços comuns onde a competição se baseia primariamente no preço.

Eventos de grande escala, como a Copa do Mundo FIFA de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 no Brasil, desafiaram o formato tradicional de licitações, exigindo processos mais rápidos e flexíveis. Isso levou à criação do RDC - Regime Diferenciado de Contratações Públicas, uma legislação especial que permitiu exceções ao processo licitatório padrão para atender às necessidades urgentes desses eventos.

A lei 14.133 surge, então, como uma resposta a um ambiente em constante mudança, onde a eficiência e a agilidade se tornaram tão cruciais quanto a transparência e a equidade. A pandemia de Coronavírus, que começou em 2020, apenas reforçou essa necessidade, acelerando a aprovação da nova lei, que foi desenvolvida e promulgada em tempo recorde para facilitar contratações mais rápidas e eficazes em um momento de crise.

Essa nova lei pretende unificar e atualizar o quadro regulatório das licitações e contratos administrativos, substituindo tanto a lei 8.666/93 quanto a lei do pregão, e modificando certos aspectos do RDC. Isso indica uma revisão abrangente e ambiciosa das políticas de licitação, com o objetivo de simplificar e modernizar os processos.

A lei 14.133 é meticulosamente detalhada, com 194 artigos que abrangem cada aspecto do processo licitatório, desde a fase preparatória até a execução dos contratos. A lei não só atualiza as práticas como também incorpora princípios novos e específicos, como o da sustentabilidade e da inovação, refletindo as prioridades contemporâneas da administração pública.

Porém, essas mudanças também trazem desafios. A necessidade de regulamentações adicionais para a implementação efetiva da nova lei cria uma situação de incerteza. Além disso, as orientações da Advocacia Geral da União, que sugerem cautela na implementação antecipada da lei, apontam para as complexidades envolvidas na transição do antigo para o novo sistema.

A redefinição das competências de fiscalização e controle, que antes eram mais claramente delineadas na lei 8.666/93, agora parecem menos explícitas. Isso pode impactar a maneira como os recursos públicos são monitorados e como as responsabilidades são atribuídas dentro do processo de licitação. A nova estrutura proposta pela lei 14.133 busca integrar os órgãos de controle de forma mais colaborativa, mas isso também pode diluir a clareza das responsabilidades individuais, potencialmente complicando os esforços de fiscalização.

O sistema de múltiplas linhas de defesa introduzido na nova lei, que envolve tanto agentes da administração quanto Tribunais de Contas, é uma tentativa de reforçar o controle interno e a supervisão. No entanto, essa abordagem pode gerar preocupações quanto à efetividade do controle, visto que mistura os papéis de fiscalização e fiscalizados, o que pode levar a conflitos de interesse e reduzir a independência dos órgãos de controle.

A modificação nos procedimentos para a suspensão cautelar dos processos licitatórios também representa uma mudança significativa. Os novos prazos estabelecidos pela lei 14.133 são mais lenientes do que os anteriores, oferecendo aos administradores públicos até dez dias úteis, prorrogáveis, para responder a irregularidades identificadas. Esse prazo mais extenso contrasta com a resposta imediata anteriormente exigida e pode afetar a capacidade de agir rapidamente contra possíveis abusos ou erros no processo de licitação.

Essas mudanças destacam a intenção da nova lei de ser mais adaptável e menos rígida do que suas predecessoras. No entanto, a flexibilidade introduzida também requer um alto nível de vigilância e responsabilidade por parte dos envolvidos no processo licitatório, para garantir que a integridade e a transparência não sejam comprometidas.

Além disso, a incorporação de novos princípios como sustentabilidade e inovação sugere uma expansão do escopo das considerações que os administradores públicos devem fazer ao avaliar propostas. Isso reflete uma evolução nas expectativas sociais e governamentais, mas também impõe desafios em termos de como esses princípios são interpretados e aplicados na prática.

A complexidade adicionada pelo novo marco legal exige que os administradores públicos, licitantes e órgãos de controle se adaptem rapidamente às novas normas e procedimentos. Isso inclui uma compreensão profunda das regras e uma capacidade de navegar em um ambiente legal que ainda está evoluindo, especialmente considerando que as regulamentações finais ainda estão sendo formuladas.

Através de uma abordagem metodológica dedutiva, explora-se a principal pergunta de pesquisa: "De que maneira a introdução da IA nos processos de licitação, conforme previsto pela lei 14.133/21, pode transformar a eficiência e transparência desses procedimentos em comparação com as práticas anteriores?" A hipótese central é que a integração da inteligência artificial pode significar aumentar a eficácia e a transparência das licitações públicas ao automatizar a análise de propostas, monitorar a aderência às normas legais e otimizar a tomada de decisões. Como a introdução da inteligência artificial nos processos de licitação, conforme a lei 14.133/21, impacta a responsabilidade civil dos agentes públicos envolvidos, especialmente em casos de falhas ou vieses algorítmicos que resultem em prejuízos ou irregularidades nas licitações?

Entretanto, essa transformação requer ajustes meticulosos nos sistemas administrativos para garantir que o emprego da IA contribua positivamente para a integridade e o cumprimento dos objetivos do processo licitatório. Na primeira sessão do texto, é explorada a breve análise das mudanças inseridas na nova legislação, logo após é inserido no cerne do debate o uso da IA nos processos licitatórios,  na terceira sessão o debate se forma, na capacidade potencial da IA de melhorar esses processos e a responsabilidade civil dos agentes públicos envolvidos.

A transição para a lei 14.133/21, portanto, não é apenas uma mudança de regulamentações, mas uma transformação na cultura de licitações públicas no Brasil. Exige uma nova mentalidade dos participantes do processo licitatório e uma reavaliação de práticas estabelecidas. Os próximos anos serão cruciais para determinar se as reformas alcançarão seus objetivos de maior eficiência, transparência e integridade nas licitações públicas.

Conclui-se portanto, que a lei 14.133/21 representa um passo significativo para a modernização do processo de licitações e contratos administrativos no Brasil, sua implementação bem-sucedida dependerá da capacidade dos órgãos governamentais de se adaptarem a um quadro legal em evolução e de responderem eficazmente aos desafios que surgem. A administração pública, juntamente com os licitantes e órgãos reguladores, deve estar preparada para enfrentar uma curva de aprendizado íngreme e garantir que a nova legislação cumpra sua promessa de aprimorar as licitações no país.

2. O direito constitucional e as novas adequações da lei 14133/21

A lei 14.133/21, conhecida como a nova lei de licitações e contratos administrativos, representa um marco significativo na legislação brasileira ao reformular profundamente os procedimentos de licitação dentro da administração pública. Sancionada no contexto da CF/88, que no art. 37, XXI, determina que os contratos administrativos sejam precedidos de licitação, salvo exceções previstas em lei, essa nova legislação busca modernizar e tornar mais eficientes esses processos, incorporando tecnologias avançadas, como a IA, para otimizar a conformidade com os regulamentos.

Ferreira e Charles (2020) elucidam que, de maneira similar à decisão de uma pessoa ao fazer uma compra importante, a administração pública utiliza um processo formal e estruturado para selecionar a oferta mais vantajosa. A introdução da IA neste processo pode significar um grande salto qualitativo, pois a tecnologia tem o potencial de automatizar a análise de documentos e propostas, garantindo uma verificação rápida e precisa da conformidade das propostas com as normas vigentes.

A IA pode desempenhar um papel vital ao ser constantemente atualizada com mudanças na legislação, ajudando os órgãos públicos a adaptarem-se rapidamente às novas exigências legais. Segundo Baltar Neto e Torres (2020, p. 275), a licitação é definida como um procedimento seletivo prévio que busca, de maneira isonômica e pública, escolher a melhor alternativa para a celebração de um contrato. A automação desse processo por meio da IA pode promover um maior rigor na aplicação de critérios estabelecidos, diminuindo a margem para erros humanos e aumentando a transparência.

Oliveira (2019, p. 591) complementa ao definir a licitação como um processo administrativo empregado pela administração pública com o objetivo de garantir a isonomia, selecionar a proposta mais vantajosa e promover o desenvolvimento nacional sustentável, por meio de critérios objetivos e impessoais. A implementação da IA neste contexto pode assegurar que esses critérios sejam aplicados de forma consistente, evitando favoritismos ou interpretações subjetivas que possam prejudicar o processo.

O emprego da IA em licitações também pode facilitar o cumprimento das novas diretrizes da lei 14.133/21, que almeja, entre outras coisas, evitar sobrepreços e superfaturamentos e alcançar um tratamento isonômico entre todos os participantes. A tecnologia pode detectar padrões anormais em propostas que possam indicar tentativas de manipulação de preços ou outras irregularidades.

Além disso, a IA pode contribuir para a inovação e o desenvolvimento sustentável ao permitir que os órgãos de licitação avaliem as propostas não apenas com base no custo, mas também considerando a qualidade e a sustentabilidade dos produtos ou serviços oferecidos. Isso está alinhado com o objetivo mais amplo da nova lei de promover aquisições que beneficiem não apenas a administração pública, mas também o meio ambiente e a sociedade como um todo.

Contudo, a implementação da IA nos processos de licitação apresenta desafios significativos. Questões como a segurança dos dados, a privacidade e o potencial para viés algorítmico devem ser rigorosamente abordados para evitar a introdução de novas formas de desigualdade ou injustiça no processo licitatório.

Portanto é essencial que haja uma estrutura de governança robusta em torno do uso da IA, com normas claras sobre como os dados são coletados, armazenados e processados. Além disso, deve haver transparência sobre como as decisões são tomadas pelos sistemas baseados em IA e a possibilidade de revisão humana em casos onde as decisões automatizadas possam ter consequências significativas.

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Wellington José Campos
Mestre em Direito das Relações Econômicas e Sociais Faculdades Milton Campos. Graduado em Direito Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix. Especialista em Gestão da Tecnologia da Informação.

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