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Vamos reformar o Código Civil?

O direito romano enfrentou debates sobre sua aplicabilidade imediata ou histórica. A evolução levou a integrá-lo aos sistemas locais, refletindo as demandas contemporâneas.

15/4/2024

O Direito é fruto do seu tempo. A grande discussão que existiu entre os intérpretes do direito romano era sobre a aplicabilidade imediata das regras romanistas ou do seu estudo apenas para fins históricos. É certo que o debate no mundo ocidental sobre o direito romano se reinicia no século XI e se prolonga até o século XVIII. Ora, como aplicar a jurisprudência majoritariamente produzida entre os séculos I aec e III e compilada no século VI, por Justiniano, dez séculos depois? As famosas escolas jurídicas se debruçaram sobre essa questão e sucederam-se ao longo do tempo variando entre os que queriam dar imediata aplicação ao direito romano e os outros que entendiam que suas máximas e regramentos deveriam se coadunar com o direito local produzido contemporaneamente.

O caminho, por fim, adotado foi o de se entender que aquele enorme corpo documental jurídico produzido em Roma deveria ser a base histórica do nosso direito continental, recebido e apropriado pelos diversos direitos locais e com eles formar novos sistemas jurídicos, que retratassem as questões do seu tempo. Isso porque, o direito é algo vivo que não pode ser engessado em um determinado espaço temporal. O século XIX nos trouxe a ideia da codificação racional e sistemática do direito e a produção de longos textos legais, que se revelaram verdadeiras obras-primas com ideais de imortalidade conceituais. No Brasil, apesar da CI de 1824 ter indicado o abandono das Ordenações portuguesas para produção de um direito nacional, somente em 1916 tivemos o nosso Código Civil na esteira das codificações do século anterior. Sua duração se prolongou por quase 90 anos e sua substituição foi precedida de longo tramitar de um novo Código, que veio à luz em 2002.

A perenidade pretendida dos grandes códigos oitocentistas não conseguiu segurar a rápida dinâmica social que modifica e reestrutura a sociedade. Foi preciso, então, reescrever regras e recodificar conceitos. O mundo mudou nos últimos 20 anos. Tanto quanto havia mudado em 90 anos. Mudou de forma rápida e contundente com o questionamento das mais basilares instituições do direito dos cidadãos. É natural que o conjunto de normas do século passado não acompanhe essa nova formatação de direitos e conceitos. Por isso, a proposta de reformar o atual Código Civil trazendo para dentro dele  novas configurações sociais é medida necessária e absolutamente condizente com a longa história de transformação do ius civile romano que desde a sua época mais arcaica continua nos pautando e nos assombrando pelo seu exemplo histórico de ressignificação do direito conjuntamente com o seu tempo. O espírito romanista é reformador e sobretudo apropriador da cultura do seu tempo. 

Que venha o novo Código!

Carlos Gustavo Direito
Desembargador com assento efetivo na 16ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro desde 30 de agosto de 2021.

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