A arbitragem está absolutamente consolidada no Brasil, que ocupa o segundo lugar nas estatísticas da International Chamber of Commerce (ICC), atrás apenas dos Estados Unidos. Nela, são discutidas questões vultuosas, como contratos de construção de grandes obras, geração e fornecimento de energia, operações de mergers and acquisition, compra e venda de empresas, além de disputas societárias de várias espécies.
Um dos grandes atrativos da arbitragem é a celeridade em relação ao processo civil no poder judiciário. No entanto, nos últimos anos, a comunidade internacional tem levantado críticas sobre os procedimentos arbitrais atuais estarem demorando mais tempo do que deveriam1. Diante disso, a ICC trouxe ao seu Regulamento de Arbitragem de 2017 a figura da arbitragem expedita:
Article 30: Expedited Procedure.
- By agreeing to arbitration under the Rules, the parties agree that this Article 30 and the Expedited Procedure Rules set forth in Appendix VI (collectively the “Expedited Procedure Provisions”) shall take precedence over any contrary terms of the arbitration agreement.
- The Expedited Procedure Rules set forth in Appendix VI shall apply if: a) the amount in dispute does not exceed the limit set out in Article 1(2) of Appendix VI at the time of the communication referred to in Article 1(3) of that Appendix; or b) the parties so agree.
- The Expedited Procedure Provisions shall not apply if: a) the arbitration agreement under the Rules was concluded before the date on which the Expedited Procedure Provisions came into force; b) the parties have agreed to opt out of the Expedited Procedure Provisions; or c) the Court, upon the request of a party before the constitution of the arbitral tribunal or on its own motion, determines that it is inappropriate in the circumstances to apply the Expedited Procedure Provisions.
Para ilustrar esta forma de procedimento, no caso Osram Sylvania Products v. Tiberon Minerals (ICC Case No. 15067), o tribunal observou que de acordo com a arbitragem expedita houve apenas duas rodadas substanciais de alegações escritas (os memoriais pré-audiência e pós-audiência), além da audiência ter sido mantida mais curta do que o inicialmente previsto.
Entre as 269 sentenças arbitrais finais proferidas em procedimentos sob forma expedita da ICC durante o período de 2017 a 2022, foi realizada audiência em pouco mais de metade dos casos (55%); quando os casos decorriam apenas com base em provas documentais, isto era geralmente acordado pelas partes; raramente ocorreu uma fase de produção de documentos (17%); e os memoriais pós-audiência foram apresentados em apenas 31% dos casos. Das 269 sentenças, 67% foram entregues dentro ou próximo do prazo de seis meses; nos casos em que o atraso excedeu um mês sem circunstâncias justificadas, o tribunal aplicou uma redução dos honorários dos árbitros2.
Diante disso, as grandes diferenças em relação à arbitragem regular são o tempo e o custo do procedimento: a arbitragem expedita acaba sendo mais rápida e mais barata. As regras da ICC sobre o tema, atualizadas em 2021, trazem requisitos para que este procedimento seja aplicável, conforme o parágrafo 2°: o montante em disputa3 não pode exceder o limite de US$ 2.000.000 se a convenção de arbitragem tiver sido celebrada entre 01 de março de 2017 e 01 de janeiro de 2021, ou US$ 3.000.000 se a convenção de arbitragem tiver sido celebrada após 01 de janeiro de 2021; além disso, é preciso que as partes concordem a submissão a este procedimento. De outro lado, as mesmas regras trazem as situações em que a arbitragem expedita não poderá ser utilizada, conforme o parágrafo 3°: quando a convenção de arbitragem tenha sido celebrada antes da entrada em vigor da Expedited Procedure Provisions, que foi em 01 de março de 2017; quando as partes tenham acordado não participar deste tipo de procedimento; ou quando a ICC, a pedido de uma das partes antes da constituição do tribunal arbitral ou oficiosamente, determinar que é inadequado, nas circunstâncias, aplicar a arbitragem de forma expedita.
Porém, não são critérios tão objetivos, como o valor em disputa, que decidem pela arbitragem regular ou expedita em cada caso. Também aqui tem lugar a grande resposta do direito: depende! Em algumas situações, mesmo que o valor envolvido seja pequeno, as questões ou a complexidade das questões acabam afastando a possibilidade de outro procedimento que não a arbitragem regular.
Sob o regulamento da ICC, a arbitragem expedita se aplica automaticamente às disputas abaixo do valor determinado. Precisamente, baseia-se no chamado sistema opt-out: além de se aplicar quando as partes assim concordam, aplica-se automaticamente quando o montante em litígio não excede 2 milhões de dólares e quando as partes não o excluíram expressamente na convenção de arbitragem. Se as partes não quiserem se submeter involuntariamente ao procedimento em forma expedita, precisam deixar clara a exclusão da sua aplicação.
O sistema opt-out foi visto em ação em diversos casos, nos quais pelo menos uma das partes discordou da adoção da arbitragem expedita em sua disputa. Em Polyplas v. McNeil & NRM (ICC Case No. 27178), a Requerida informou à Secretaria da ICC que não concordava com a aplicação das disposições de arbitragem expedita, ao que o secretariado observou que, na ausência de acordo das partes, estas disposições não se aplicarão na arbitragem.
Em UNIFI Communication v. Albtelecom (ICC Case No. 22646), depois de ser convidado a comentar a proposta da Requerida de optar pelo procedimento expedito, o Requerente retornou que não tinha interesse porque, nas suas palavras, o litígio em questão provavelmente requeria a realização de uma audiência e inquirição de testemunhas, e, de acordo com as disposições do procedimento de arbitragem expedita, no entanto, o tribunal arbitral podia decidir o litígio apenas com base em documentos sem audiência e sem inquirição de testemunhas4. Conforme o esperado, a secretaria observou que, uma vez que o Requerente não concordou em aderir, a arbitragem expedita não se aplicaria.
Do exposto, ambas as formas de arbitragem são ferramentas valiosas para a resolução eficiente de conflitos, cada modalidade apresenta características singulares, atendendo às demandas de diferentes cenários. A arbitragem regular se destaca pelo exame aprofundado das questões em litígio, enquanto a arbitragem expedita atrai pela celeridade e economia, ideais para casos de menor complexidade e valor. Portanto, a escolha entre a arbitragem regular e a expedita deve ser ponderada considerando as particularidades do caso concreto: complexidade da demanda, valor envolvido, urgência na resolução e disponibilidade de recursos devem ser cuidadosamente analisados.
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1 "When, in a 2015 survey on improvements in international arbitration, the vast majority of interviewees laid emphasis on the necessity of a simplification of arbitral procedures, no one was surprised. Thus, 92% of the interviewees favored the inclusion of simplified procedures in institutional rules for claims under a certain value, with 33% in favor of making the procedure mandatory and 59% in favor of it being optional." (BANIFATEMI, Yas. Expedited Proceedings in International Arbitration. In: LÉVY, Laurent; POLKINGHORNE, Michael (Org.). Expedited Procedures in International Arbitration: Institute Dossier XVI. Paris: ICC, 2017).
2 ZLATANSKA, Elina; DUPEYRÉ, Romain. Expedited Procedures: Practical and Comparative Considerations, ICC Dispute Resolution Bulletin 2023, Paris, n. 1, p. 76-78, abr. 2023.
3 Originalmente estabelecidos em dólares, os valores-base das arbitragens expeditas para o Brasil não são convertidos para o real livremente. De acordo com a nota sobre o funcionamento do escritório brasileiro da ICC, os dois limites em reais são: BRL 6.400.000 (i.e., US$ 2.000.000) e BRL 9.600.000 (i.e., US$ 3.000.000).
4 "[…] because the dispute at hand likely requires holding a hearing and examination of witnesses. Under the Expedited Procedure Provisions, however, the arbitral tribunal may decide the dispute solely on the basis of documents with no hearing and no witness examination" (UNIFI Communication, Inc. v. Albtelecom SH.A, ICC Case No. 22646/MHM/HBH).