A exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, a chamada “tese do século”, foi apreciada em seu mérito pelo STF no ano de 2017, em sede do RE 574.706, selecionado para apreciação em Repercussão Geral - Tema 69.
O caso transitou em julgado em 2021, após a definição pela produção de efeitos após 15/3/17, data em que julgado o RE 574.706 e fixada a tese com repercussão geral de que o ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento e determinação de que o ICMS excluído da base de cálculo das contribuições ao PIS e a COFINS se trata do ICMS destacado.
Ocorre que até os dias de hoje os contribuintes ainda sofrem com a insegurança jurídica relacionada aos aspectos práticos e operacionais para o aproveitamento de seus créditos, inclusive sobre a tributação dos valores passíveis de recuperação.
Em 2021, após o trânsito em julgado do leading case, a Receita Federal do Brasil publicou a Solução de Consulta COSIT 183/21, com o entendimento do órgão de que o indébito tributário de PIS e COFINS deveria ser oferecido à tributação no trânsito em julgado da sentença judicial líquida, ou seja, que já define o valor a ser restituído ou na hipótese de compensação de indébito decorrente de decisões judiciais transitadas em julgado nas quais em nenhuma fase do processo foram definidos pelo Juízo os valores a serem restituídos, seria na entrega da primeira Declaração de Compensação – DCOMP que o indébito deveria ser oferecido à tributação.
Passados mais de 2 anos deste primeiro pronunciamento, no final do mês de dezembro/2023 a Receita Federal do Brasil publicou, por meio da Solução de Consulta COSIT nº 308/2023, um complemento à Solução de Consulta COSIT 183/21, onde acrescenta que em relação ao valores de principal do indébito “caso haja a escrituração contábil de tais valores em momento anterior à entrega da primeira Declaração de Compensação, é no momento dessa escrituração que tais valores devem ser oferecidos à tributação”.
Em suma, além de criar mais uma forma de exigir que as empresas paguem tributos muito antes de qualquer aproveitamento, tal determinação reforça o cenário de instabilidade, pois muitos contribuintes, seguindo as orientações da Solução de Consulta COSIT 183/21, recolheram o IRPJ e a CSLL apenas na entrega da primeira Declaração de Compensação e agora correm o risco de autuação sob fundamento de pagamento a destempo, uma vez que a Receita Federal dispõe do prazo de 5 anos para fiscalização e cobrança.
Não é de hoje que os contribuintes vêm questionando, inclusive via Poder Judiciário, quando a tributação deve ocorrer, se seria no trânsito em julgado da ação, na habilitação do crédito pela Receita Federal, se no reconhecimento da receita, na primeira compensação, se a cada compensação ou somente quando as compensações forem homologadas, isso levando-se em consideração a questão da disponibilidade econômica ou jurídica da renda.
Seria plausível que o momento de oferecimento dos valores à tributação fosse o de cada compensação realizada, pois nesse caso, é realizada a compensação de um ativo para quitação de um passivo, utilizando-se um valor reconhecido judicialmente e habilitado perante a Receita Federal do Brasil, com a extinção do crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação.
Já existem diversas decisões judiciais que até vão além, no sentido de que o momento correto para que ocorra a tributação é na homologação do pedido de compensação, uma vez que antes disso a compensação ainda pode ser totalmente ou parcialmente indeferida. Nesta linha, a homologação, seja esta expressa ou tácita, é que caracteriza o fato gerador e traz certeza e liquidez, diante da definitiva concordância com os valores compensados e que serão objeto de tributação.
Há ainda, um novo elemento neste cenário, a MP 1.202/23, publicada em 29 de dezembro de 2023, a qual incluiu o artigo 74-A na lei 9.430/96, limitando a compensação dos créditos decorrentes de decisão judicial transitada em julgado. Pela nova regra, para créditos cujo valor seja superior a 10 milhões de reais, pode ser estabelecido limite mensal de aproveitamento por ato do Ministro de Estado da Fazenda, graduado em função do valor total do crédito, o qual não poderá ser inferior a 1/60 do valor total do crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado. Tal prerrogativa já foi exercida e os limites foram estabelecidos por meio da Portaria Normativa MF 14/24.
Ou seja, levando-se em consideração as orientações da Solução de Consulta COSIT 308/23 em conjunto com as disposições da MP 1.202/23, seria antecipada a tributação de um crédito que pode demorar anos para ser utilizado.
Desta forma, não resta dúvida que as recentes definições da Receita Federal do Brasil em sede da Solução de Consulta COSIT 308/23, a respeito do momento do oferecimento à tributação dos valores de indébito, fomentam o ambiente de insegurança jurídica, o que leva inevitavelmente à discussão judicial do tema, como já tem ocorrido.