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O STF e a falta de segurança jurídica no julgamento da Revisão da Vida Toda

O direito à revisão da vida toda foi reconhecido pelo STJ, aplicando a regra do art. 29 da lei 8.213/91 aos segurados até a lei 9.876/99. Contudo, o STF admitiu o RE 1276977, com votação pela rejeição (6x5), mas houve destaque e suspensão do julgamento por pedido do Ministro Nunes Marques.

24/1/2024

A discussão sobre o direito à revisão da vida toda teve desfecho favorável na Corte da Cidadania, que no exercício da sua competência de interprete da legislação federal, editou a seguinte tese no Repetitivo Tema 999:

“Aplica-se a regra definitiva prevista no art. 29, I e II da lei 8.213/91, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3º. da lei 9.876/99, aos segurados que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social até o dia anterior à publicação da lei 9.876/99.” (REsp. 1554596/SC, 1ª Seção, DJe 17.12.19)

Entretanto, o STF acabou por admitir o RE 1276977, com Repercussão Geral Tema 1102, o qual foi levado à votação no Plenário Virtual (25.2.22), com votação pela rejeição do recurso (6x5). Entretanto, depois de depositados todos os votos, houve um pedido de destaque pelo Ministro Nunes Marques, para que o processo fosse retirado da pauta virtual (8.3.22), gerando a suspensão do julgamento.

Na sequência, o relator do caso, Ministro Marco Aurélio Mello teve aposentadoria concedida, mesmo assim, a Corte manteve como válido o voto do então ministro, o que impediu que o seu sucessor, Ministro André Mendonça, proferisse novo voto (QO ADI 5399, em 30.11.22).

Em prosseguimento, na Sessão Plenária de 1.12.22, o STF, por maioria, negou provimento ao recurso extraordinário, fixando a tese de que: "O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da lei 9.876, de 26.11.99, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC 103/2019, tem o direito de optar pela regra definitiva, caso esta lhe seja mais favorável", nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes (Relator para o acórdão).

Posteriormente, o Ministro Relator Alexandre de Moraes, votou por acolher, em parte, os embargos de declaração apresentados pelo INSS, unicamente para modular os efeitos da tese fixada no Tema 1.102. Pediu vista dos autos o Ministro Cristiano Zanin, mas a Ministra Rosa Weber (Presidente) antecipou seu voto no sentido de divergir, em parte, do Relator, na parte da modulação dos efeitos (Plenário, Sessão Virtual de 11.8.23 a 21.8.23).

O Ministro Cristiano Zanin, que sucedeu o Ministro Ricardo Lewandowski, apresentou voto divergente para acolher a nulidade do julgamento proferido pela 1ª Seção do STJ por suposta violação da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da CF), sendo acompanhado pelos Ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli. Entretanto, o processo foi destacado pelo Relator para votação presencial (Sessão Virtual de 24.11.23 a 1.12.23).

Em 21.12.23, o processo foi incluído no calendário de julgamento pelo Presidente para ocorrer em 1.2.24.

Diante desse histórico, questiona-se a validade do voto do Ministro Zanin, tendo em vista que seu antecessor, quando votou o mérito do Tema 1102, em sessão virtual e depois na presencial, acompanhou a tese vencedora e deixou de reconhecer a suposta nulidade.

Caberia então essa reviravolta em Embargos de Declaração provocada por Ministro que não participou do julgamento do mérito da tese acolhida em Plenário?

Salvo melhor juízo, o regramento constante no CPC e no RI da Suprema Corte, não preveem essa possibilidade, pois a sucessão de Ministros na Corte Suprema não autoriza a modificação de um julgamento realizado pelo Plenário da Casa, ainda mais quando inexiste fato ou argumento novo em pauta.

Destaca-se, que nos votos vitoriosos dos Ministros Alexandre de Moraes (relator do voto vista e da tese) e Marco Aurélio Mello (aposentado antes da conclusão do julgamento e relator do voto inicial favorável) houve manifestação expressa em referência a ausência da violação a cláusula de reserva de plenário pela 1ª Seção do STJ ao julgar o Tema 999.

Portanto, a realidade fática e jurídica não permite (ou não deveria permitir) nesta fase processual o acolhimento da citada divergência apresentada pelo Ministro Zanin, como já acentuado pela Corte Suprema em outro julgado (ADI 5399), onde ficou consignado que “... no surgimento de fatos novos, a cadeira poderá falar, mas que fica preservado o voto já proferido”.

Porém, na hipótese do Plenário do STF validar o voto do Ministro Zanin, a fundamentação relacionada à omissão do Ministro Lewandowski (agora aposentado) não pode prevalecer, uma vez que esse entendimento seria contrário à legislação regimental da Suprema Corte.

A Resolução 642/19, que trata do julgamento de processos em lista nas sessões presenciais e virtuais do STF, estabelece no art. 6º, § 1º, “a”, que o voto vogal pode seguir integralmente o do relator. O Ministro Lewandowski seguiu essa diretriz ao expressar em sua decisão que adotava integralmente o voto do Ministro Relator. Portanto, não houve omissão que justificasse a anulação do julgamento.

Assim, a aparente “guinada em curso”, na remota hipótese de acolhimento, poderá representar um verdadeiro desrespeito às decisões colegiadas, subvertendo os princípios constitucionais da segurança jurídica e do juiz natural. Além disso, tal ato poderia abalar a credibilidade da população brasileira em relação ao sistema de justiça.

João Batista Lazzari
Pós-Doutor em Direito e Justiça Constitucional pela Universidade de Bologna/Itália. Professor e Escritor na área previdenciária.

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