Foi encaminhado recentemente pelo Poder Executivo, um PL 3/24) tencionando modificar a lei 11.101/05 - LRF no que diz respeito à falência. O PL possui dois pontos centrais: a criação do gestor fiduciário e do plano de falência.
A leitura do PL a princípio causa um certo estranhamento, pois as tarefas desempenhadas pelo gestor fiduciário poderiam ser realizadas pelo administrador judicial, não ficando claro, a princípio, a razão da criação desse novo personagem, que será elemento central na nova dinâmica de liquidação dos ativos da massa falida, se aprovado o PL como proposto.
Uma das principais atividades do gestor fiduciário será a apresentação do plano de falência, que vai tratar da condução financeira dos recursos da massa falida e da alienação dos ativos para pagamento dos credores.
Em certo ponto o plano de falência se assemelha ao plano de recuperação judicial, pois prevê como meio de pagamento a aquisição de bens da massa falida com créditos; a conversão de ser crédito em participação societária de sociedade a ser criada com ativos da massa; e descontos (deságios) sobre os créditos, além do que, se não houver oposição pelos credores, haverá sua aprovação tácita ou, caso contrário, a realização de assembleia geral de credores (art. 82-D, § 1º e 2º), sendo, neste último caso, necessária a aprovação em todas as classes, pela maioria dos créditos presentes à AGC e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes, tal como ocorre nas classes de credores com garantia real e quirografários nos processos recuperacionais. Tal identificação de procedimentos e quóruns é um fator positivo, pois facilita e agiliza a absorção da norma pelos envolvidos.
O que se depreende da leitura do PL é que aprovado o plano de falência, não haverá a necessidade de autorização judicial para cada ato desempenhado pelo gestor fiduciário ou administrador judicial no cumprimento desse plano, o que traria agilidade ao processo, com a liquidação mais célere dos ativos da massa e, por consequência, pagamento aos credores, problema crônico que afeta os feitos falimentares brasileiros.
Uma preocupação de ordem prática que exsurge da implementação dessa alteração legislativa é quem serão os novos gestores fiduciários nomeados1, uma vez que inexistentes nos processos em curso. Imagina-se que pelas atividades previstas (art. 82-C I a VI) possam ser profissionais com expertise financeira ou mesmo spin-offs de escritórios de administração judicial que já atuem em processos de insolvência.
Outro ponto de dúvida é quanto à remuneração desse profissional. Na LRF em vigor a remuneração máxima do administrador judicial é de 5% sobre o valor de venda dos bens da massa falida, no projeto de lei, entretanto, a remuneração não possui um limite estabelecido, ficando a critério da AGC decidir, de acordo com valores do mercado, podendo ser levada em conta a taxa de sucesso na venda dos bens e pagamento dos passivos (art. 35, II, d; § 2º). De modo geral, essa regra, a nosso ver, se mostra adequada, pois os credores são os maiores interessados, eis que destinatários dos recursos, sendo razoável que possam decidir sobre assuntos que lhes afetem diretamente, tendo consciência de que todos os custos com o gestor fiduciário serão deduzidos dos montantes a eles dirigidos, o que justificaria um maior zelo na aprovação da despesa a esse título.
Importante ressaltar que diante do tempo de duração dos processos falimentares e de sua baixa efetividade2 alterações visando mudar essa realidade são bem-vindas. A rápida alienação dos ativos e encerramento do processo falimentar, além de diminuir o custo da máquina judiciária e pagamento aos credores, dá nova vida aos bens que ficam ociosos, trazendo-os de volta à economia, com novo emprego, resultando em benefícios à sociedade, o que pode ser tardado ou perdido pela morosidade processual.
1 art. 35, II, d e art. 42 caput.
2 https://www.conjur.com.br/2022-abr-05/falencias-arrastam-10-anos-arrecadam-divida/#:~:text=O%20tempo%20mediano%20%C3%A9%20de,processos%20tiveram%20a%20fal%C3%AAncia%20encerrada.