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NLLC: o que é estudo técnico preliminar?

O estudo técnico preliminar é uma fase inicial e obrigatória de planejamento em licitações, geralmente mais abrangente que etapas posteriores, como o termo de referência, e pode apresentar repetições de informações devido à transição entre leis, refletindo a falta de hábito de planejamento na administração pública brasileira.

9/12/2023

Tema que tem suscitado dúvidas no âmbito da administração pública é sobre a finalidade e a natureza desse novo instrumento criado pela NLLC.

O artigo 6ª da NLLC, verdadeiro sumário de institutos licitatórios, prevê:

“XX - estudo técnico preliminar: documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza o interesse público envolvido e a sua melhor solução e dá base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico a serem elaborados caso se conclua pela viabilidade da contratação;” (grifos nossos).

Estudo técnico preliminar é uma técnica compulsória e preliminar de planejamento.

Sendo o primeiro instrumento de planejamento da licitação ele é, por definição, mais genérico do que as etapas posteriores como o termo de referência, anteprojeto e projeto básico.

Ele terá várias características repetitivas principalmente na etapa de transição da provecta lei 8666/93 e a nova lei 14.133/21, já que o planejamento não é hábito arraigado na administração pública brasileira.

É comum que as estimativas de custos e o termo de referência sejam repetidos no ETP e, também, em fases seguintes já que a administração pública ainda não se habituou a um planejamento prévio, compulsório e sistematizado. Não se trata de um erro no ETP mas mera adequação nesta etapa de transição.

A NLLC prevê alguns itens obrigatórios (em negrito):

“ART. 18 (...)

§ 1º O estudo técnico preliminar a que se refere o inciso I do caput deste artigo deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica da contratação, e conterá os seguintes elementos:

  1. descrição da necessidade da contratação, considerado o problema a ser resolvido sob a perspectiva do interesse público;
  2. demonstração da previsão da contratação no plano de contratações anual, sempre que elaborado, de modo a indicar o seu alinhamento com o planejamento da Administração;
  3. requisitos da contratação;
  4. estimativas das quantidades para a contratação, acompanhadas das memórias de cálculo e dos documentos que lhes dão suporte, que considerem interdependências com outras contratações, de modo a possibilitar economia de escala;
  5. levantamento de mercado, que consiste na análise das alternativas possíveis, e justificativa técnica e econômica da escolha do tipo de solução a contratar;
  6. estimativa do valor da contratação, acompanhada dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte, que poderão constar de anexo classificado, se a administração optar por preservar o seu sigilo até a conclusão da licitação;
  7. descrição da solução como um todo, inclusive das exigências relacionadas à manutenção e à assistência técnica, quando for o caso;
  8. justificativas para o parcelamento ou não da contratação;
  9. demonstrativo dos resultados pretendidos em termos de economicidade e de melhor aproveitamento dos recursos humanos, materiais e financeiros disponíveis;
  10. providências a serem adotadas pela Administração previamente à celebração do contrato, inclusive quanto à capacitação de servidores ou de empregados para fiscalização e gestão contratual;
  11. contratações correlatas e/ou interdependentes;
  12. descrição de possíveis impactos ambientais e respectivas medidas mitigadoras, incluídos requisitos de baixo consumo de energia e de outros recursos, bem como logística reversa para desfazimento e reciclagem de bens e refugos, quando aplicável;
  13. posicionamento conclusivo sobre a adequação da contratação para o atendimento da necessidade a que se destina.

§ 2º O estudo técnico preliminar deverá conter ao menos os elementos previstos nos incisos I, IV, VI, VIII e XIII do § 1º deste artigo e, quando não contemplar os demais elementos previstos no referido parágrafo, apresentar as devidas justificativas.”

O ETP tem sua alma no dever de planejar. Por conta desta característica de “alma ou semente do planejamento” é que o ETP pode ser dispensado, por exemplo, no caso de dispensa de licitação já que a dispensa surge, exatamente, da ausência de enquadramento do mundo dos fatos no planejamento licitatório.

Assim prevê o Códex Licitatório:

“Art. 72. O processo de contratação direta, que compreende os casos de inexigibilidade e de dispensa de licitação, deverá ser instruído com os seguintes documentos:

  1. documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo;”(grifos nossos)

Se uma dispensa surge de uma urgência, de uma pandemia ou de uma imprevisibilidade não seria possível, por definição, um planejamento prévio.

Não se confunda desleixo com imprevisão. Prestação de serviços médicos, por exemplo, são previsíveis. O aumento repentino da necessidade de tais serviços decorrentes de uma pandemia ou de um processo migratório repentino são imprevisíveis.

Outro exemplo para diferenciação entre imprevisível e desleixo imprevidente: canos que entopem todo ano em um número aproximado de vezes. Ainda que haja urgência para seu desentupimento, o fato é absolutamente previsível (até em números aproximados) não se justificando a ausência de ETP neste caso.

Diríamos, em tom poético, que o ETP seria uma espécie de “brainstorming” da licitação.

É uma “tempestade de ideias” minimamente registrada nos termos de seus itens obrigatórios. A figura de linguagem é, ao mesmo tempo, metáfora e hipérbole já que a comparação implícita da figura do ETP (metáfora) não é suficiente para esclarecer sua natureza.

O exagero (hipérbole) decorre do fato de que o ETP não é apenas um “bate-papo” entre amigos da administração como a “tempestade de ideias” pode sugerir, mas um “bate-papo” aprofundado numa descrição minimamente “matematizada” em seus termos obrigatórios.

Para melhor adequação do “apelido” do ETP poderíamos utilizar a expressão “brainstorming cartesiana” já que é uma “tempestade de ideias” devidamente dirigida pelos requisitos do artigo 18 da lei Federal 14.133/21.

Laércio José Loureiro dos Santos
Laércio José Loureiro dos Santos, é mestre em Direito pela PUCSP, Procurador Municipal e autor do Livro, "Inovações da Nova Lei de Licitações", 2ª Ed. Dialética, 2.023.

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