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A polêmica na alteração da apuração de créditos de PIS e Cofins sem o ICMS na sua base de cálculo

O artigo explora os fundamentos para questionar uma alteração específica, considerando suas implicações legais e possíveis desdobramentos para empresas e empreendedores.

30/11/2023

“A alteração proposta pela MP 1.159/23 nos créditos de PIS e COFINS levanta consideráveis desafios para as empresas não-cumulativas, mas também abre uma excelente possibilidade de litigância.”

Se você está aqui, já deve saber que a  MP 1.159/23, cujas as alterações foram mantidas na lei 14.592/23, trouxe mudanças significativas nos créditos de PIS e COFINS, impactando diretamente as empresas sob o regime não-cumulativo dessas contribuições.

Neste artigo, exploraremos os fundamentos que embasam a tese de questionamento dessa alteração, considerando suas implicações legais e possíveis desdobramentos para as empresas e empreendedores.

Nosso objetivo é que, ao terminar essa leitura, você esteja absolutamente confiante de que pode, e deve, questionar essa restrição no judiciário, como tantos contribuintes fazem nesse momento.

Então vamos ao que interessa.

Basicamente, o texto da MP 1.159/23 impõe restrições às empresas não-cumulativas, proibindo a inclusão da parcela do ICMS incidente nas operações dos créditos de PIS e COFINS, o que altera drasticamente o valor da composição desses créditos, reduzindo-os sobremaneira e aumentando de maneira relevante o custo fiscal das empresas envolvidas.

Ocorre que existe uma clara incompatibilidade da MP (e Lei mantenedora) com as normas do regime não-cumulativo que tratam das contribuições ao Pis e à Cofins, e com preceitos constitucionais.

As leis 10.637/02 e 10.833/03 garantem o direito ao crédito, estabelecendo alíquotas específicas, e a MP, ao restringir esse direito, suscita debates sobre sua constitucionalidade.

Diferentemente de tributos como ICMS e IPI, o PIS e a Cofins adotam o método subtrativo indireto. Isso significa que a não cumulatividade dessas contribuições não está vinculada ao montante recolhido na etapa anterior, permitindo a apropriação de créditos sobre o valor das receitas pagas na aquisição de bens e insumos.

Nesse sentido, a limitação aos créditos sobre a parcela do ICMS levanta questionamentos quanto ao princípio federativo, tornando mais atrativo adquirir bens e insumos de estados com benefícios fiscais. A competição entre estados para oferecer vantagens pode ganhar mais relevância, impactando as estratégias de aquisição das empresas.

O art. 62 da CF estabelece que esse mecanismo normativo deve ser utilizado apenas "em casos de relevância e urgência”. No entanto na Exposição de Motivos da MP 1.159/23 não estão demonstrados esses requisitos, pois o governo federal se limitou a argumentar que “[...] caracterizadas a urgência e relevância da medida ora proposta frente à importância que as Contribuições Sociais têm para o financiamento da Seguridade Social e ao iminente dano aos cofres públicos causado pelo desvirtuamento da não cumulatividade da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins”

Nesse ponto, inclusive, vale destacar que as demais ponderações trazidas na Exposição de Motivos sobre a necessária exclusão do ICMS da base de créditos da contribuição para o PIS e COFINS em função da exclusão da base de débitos determinada pelo STF, também não serve como fundamento para demonstração de relevância e urgência da medida.

Isso porque, como visto, o ICMS incidente na aquisição de insumos e bens destinados à revenda, enquanto custo de aquisição, sempre compôs a base de créditos da contribuição para o PIS e COFINS, mesmo após o julgamento do tema 69 pelo STF ocorrido em 2017.

Dessa forma, ainda que a exclusão do imposto estadual da base de cálculo das contribuições fosse considerada um possível desfalque aos cofres públicos, atraindo a necessária equiparação em relação à base de créditos (o que, como visto, não condiz com a não-cumulatividade das contribuições), não haveria razão de urgência e relevância para adoção da medida provisória em questão, em função do transcurso de tempo dessa situação.

É dizer, decorridos 6 anos do julgado do STF sobre o ICMS na base de cálculo do Pis/Cofins, ou no mínimo 2 anos se considerado o fim do julgamento do STF em 2021, não seria em maio/2023 que a restrição dos créditos se impôs tão iminente que não pudesse passar pelo adequado processo legislativo.

A MP 1.159/23, na prática, reconfigura a equação de vantagens na aquisição de insumos, especialmente no que diz respeito ao ICMS. A comparação entre operações com ICMS a 18% e transações interestaduais a alíquotas menores evidencia uma mudança nas dinâmicas de créditos de PIS e COFINS, tornando necessário repensar as estratégias de aquisição.

A lei 14.592/23 criou uma nova relação jurídica, definiu os contribuintes, estabeleceu a forma escritural e operacional das regras de imposto.

Ora, ao definir uma nova relação jurídico- tributária, a referida Lei deve observar os  Princípios  da  Anterioridade de Exercício e Nonagesimal, devendo ser exigida apenas em 2024 ou, no mínimo, em Agosto de 2023.

O escopo da regra da anterioridade objetiva evitar surpresas em desfavor do contribuinte, prestigiando a estabilidade legislativa e a segurança jurídica. Vale dizer, é vedado aos entes federados cobrar tributos antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observando-se, ainda, o princípio da anterioridade anual tributária. No caso em específico, o Pis e Cofins se submete simultaneamente aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal (artigo 150, III, "b" e "c", da Constituição, respectivamente), os quais estabelecem que lei que implique nova cobrança ou majoração do imposto somente pode produzir efeitos no ano seguinte e após o decurso de 90 dias, tendo como referência a sua publicação.

Em termos práticos, considerando que a publicação da lei complementar ocorreu em Maio, entende-se que a exigência será válida a partir de janeiro de 2024.

Conclusão:

Em resumo, diante dos fundamentos apresentados, a alteração proposta pela MP 1.159/23 nos créditos de PIS e COFINS levanta consideráveis desafios para as empresas não-cumulativas, mas também abre uma excelente possibilidade de litigância.

As empresas envolvidas devem estar atentas às implicações, adaptando suas práticas e estratégias à nova realidade que se desenha.

Lucas Parreira
Sócio no Escritório Rosenthal e Sarfatis Metta. Mestre em Direito Empresarial e Especialista em Direito Tributário, Direito Civil e Direito Contratual.

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