A delimitação da fundada suspeita para a revista pessoal no policiamento ostensivo.
A busca ou revista pessoal é um meio de obtenção de provas, embora encontra-se no CPP no título referente à prova, isto é, como se meio de prova fosse. É um instrumento disponível para o sistema de justiça criminal do Estado, principalmente a polícia, podendo até mesmo sem mandado judicial procedê-la, uma vez diante de hipótese de flagrante delito, ou quando a pessoa estiver portando arma proibida ou objetos ou papéis que constituem corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar (CPP, art. 244).
Além do dispositivo legal ser claro ao referir a busca pessoal com uma finalidade probatória, exigiu fundada suspeita aferível de modo objetivo, concreto, não por meio de critérios subjetivos dos policiais, sejam quais forem, por exemplo, expertise adquirida ao longo dos anos. Proibido fica também utilizar esse instrumento com finalidade preventiva, praxe ou rotina, por meio de policiamento ostensivo, menos ainda utilizar da pesca probatória (fishing expeditions).
A denúncia anônima, outrossim, por si só, não é meio hábil para que se promova a revista pessoal, de modo que o agente policial deverá ter elementos sólidos bastantes autorizando-a, caso o contexto fático seja insuficiente para tal será necessário investigar, ainda que sumariamente.
O Min. Rogério Schietti do STJ assentou que há três razões principais para limitar a fundada suspeita em elementos objetivos e concretos, para a busca pessoal, são eles: evitar o uso excessivo desse expediente, pois restringe direitos fundamentais, como privacidade, intimidade e liberdade; garantir a sindicabilidade da abordagem, ou seja, poder controlar sua legalidade, tanto pelas partes quanto pelo judiciário; evitar práticas que reproduzem preconceitos estruturais consolidados na sociedade. (STJ, 6ª Turma, RHC 158.580-BA)
A decisão exposta asseverou que a cada cem pessoas submetidas a busca pessoal apenas uma é autuada por alguma ilegalidade. Evidente o caráter contraproducente do seu uso indiscriminado pela polícia, além da falta de controle dos órgãos responsáveis pela fiscalização da atividade policial. Portanto, o delegado de polícia, o Ministério Público e parte do Poder Judiciário têm responsabilidades direta pelos abusos cometidos pela polícia quando do policiamento ostensivo pratica a revista nas pessoas desarrazoadamente.
A pessoa vítima de abordagens ilegais e desarrazoadas não pode continuar a sofrer punições, como as são, por demonstrar certo nervosismo ao avistar policiais, por estar desse ou daquele modo de vestimenta, bem como por ter tatuagens, cor da pele preta, cabelos crespos, morar em periferia etc., sem qualquer dado concreto que a relaciona direto com atividade criminosa.
A fundada suspeita, segundo o professor Aury Lopes, tem um conteúdo vago e impreciso, decorrente de um Código autoritário de 1941, sendo imprescindível uma mudança legislativa para corrigir as distorções, uma vez que o preenchimento de seu conteúdo nada mais é do que pura ilação teórica, na prática, ficando os policiais abordando quem e quando quiserem. (LOPES Jr., Aury, Direito processual penal- 15. Ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p. 528.)
A revista pessoal vem tendo um olhar mais agudo pelo Poder Judiciário, principalmente do STJ, por meio das suas turmas com competência criminal – 5ª e 6ª-, justamente para frear os abusos. No entanto, a própria população, parte dela, até mesmo atores jurídicos, mostram-se contrários, principalmente quando a partir da revista se encontra algum elemento de prova, como drogas. Mas o fato de se encontrar drogas, eventualmente, não torna a conduta legal se não há base justa e concreta a corroborar a fundada suspeita antes. Em outras palavras, a revista pessoal é legal e as provas encontradas lícitas quando um dado objetivo antes é claro e visível, podendo ser indicado pelos policiais e fiscalizado a posteriori pelas agências de controle.