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Holding familiar e planejamento sucessório: o que é e por que se tem falado tanto nisso?

Qual destino você planeja para o seu patrimônio? A holding familiar desponta como uma intrigante resposta, mas não é a única.

2/11/2023

Não há como negar, o termo holding familiar tem crescido não apenas na internet, mas no mercado advocatício e, principalmente, nas famílias. Antes, são as famílias que se questionam: o que é e por que tem se falado tanto em holding familiar?

O curioso é que o termo sequer é o mais correto a designar seu instrumento, ao menos não tecnicamente. No direito societário, holding é uma sociedade que tem por objeto administrar um conglomerado de outras sociedades e empresas.

Ainda assim, carinhosamente denominou-se de holding familiar uma sociedade utilizada para organizar e planejar a sucessão do patrimônio de uma família, não necessariamente de outras empresas. O nome, por bem, pegou, e a procura por holdings familiares cresceu exponencialmente nos últimos anos.

Trata-se de uma sociedade constituída para estruturar, gerenciar e, sobretudo, preservar bens familiares, sejam imóveis, investimentos, negócios, etc. O objetivo é fazer com que o patrimônio constituído por uma primeira geração familiar não se dissipe e não se desgaste, justamente para que seja perpetuado ao longo das demais gerações.

Não raro, significativos patrimônios familiares se perderem com o falecimento do patriarca ou da matriarca que os detinha. Aliás, chega a ser consenso o fato de que o procedimento de inventário de qualquer patrimônio deixado por alguém consome e diminui o valor de seu acervo originário.

Ora, a consequência lógica do inventário é a partilha de bens. Com a partilha, o patrimônio é dividido entre os herdeiros. É por conta dessa divisão que o conjunto originário perde valor de forma, inclusive, bastante natural e legítima. 

A exemplo, imaginemos a partilha de um imóvel entre dois herdeiros. Pelas regras da sucessão legal, cada herdeiro fará jus à metade do imóvel. Ao adentrar o acervo patrimonial desses herdeiros, a parte representativa do imóvel estará sujeita às condições pessoais, matrimoniais e judiciais de cada um.

Caso casados sob o regime da comunhão universal de bens, o imóvel será divido, também, com seus cônjuges. Caso casados sob o regime da comunhão parcial ou separação convencional de bens, o imóvel será herdado por seus cônjuges numa eventual sucessão.

Notemos que, com a mera aplicação dos artigos 1.667 e 1.829 do Código Civil, um único bem poderia ser divido em duas, três ou mesmo quatro partes, e seu valor originário seria reduzido de maneira natural e esperada numa sucessão legal.

Mas o exemplo descrito considera somente dois herdeiros. A novidade é que as composições familiares contemporâneas são um tanto mais complexas.

Hoje, as famílias são heterogêneas e distintas, são verdadeiros mosaicos formados entre pessoas que se casam, têm filhos, se divorciam, se casam outra vez, têm filhos outra vez, e assim formam os meus, os seus e os nossos. 

Se existem inúmeras possibilidades familiares, os desafios em acomodar os direitos e interesses sucessórios de cada componente familiar existem em igual ou maior proporção.

Conflitos internos existem, credores de um ou outro herdeiro existem e o insucesso de relacionamentos amorosos (que compartilham de questões patrimoniais) também. Não há qualquer espanto ou indignidade em reconhecer que problemas familiares existem.

O pulo do gato reside, no entanto, em cuidar para que questões familiares sejam separadas de questões patrimoniais, na medida do possível. É desse anseio, ou dessa necessidade, que a holding familiar desponta como um excelente instrumento de planejamento patrimonial e sucessório para as famílias.

A razão de ser de uma holding familiar é cuidar para que a passagem do patrimônio de uma pessoa a seus herdeiros ocorra da maneira mais bem administrada e resolvida possível, através da integralização desse patrimônio no capital social de uma pessoa jurídica.

A ideia é que, posteriormente, a divisão do patrimônio integralizado ocorra com a doação de quotas sociais da pessoa jurídica aos herdeiros do planejador. Assim, uma sucessão regulada pelo direito de família se instrumentaliza pelo direito empresarial.

O patriarca e a matriarca são mantidos como usufrutuários e administradores da pessoa jurídica, pelo que continuam em controle e proveito de todo seu patrimônio. Os herdeiros costumam aparecer como nu-proprietários das quotas sociais dessa pessoa jurídica, por sua vez recebidas em doação.

Dessa forma, os bens ficam agrupados ao invés de divididos. Se falece o patriarca ou a matriarca, basta apresentar a respectiva Certidão de Óbito na Junta Comercial para regularizar a sucessão da pessoa jurídica, sem a necessidade de abrir um custoso e por vezes moroso inventário para a partilha de bens.

Uma vez que esse patrimônio está integralizado em quotas sociais, a tributação do acervo deixa de ser imobilizada, além de evitar eventuais cobranças de ganhos de capital em Imposto de Renda e possibilitar o estudo de isenções de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis para pessoas jurídicas.

Ainda, costuma-se gravar as quotas sociais doadas com cláusulas de impenhorabilidade, incomunicabilidade, inalienabilidade, reversão, ou qualquer outra que proporcione certa proteção diante de eventuais conflitos ou infortúnios.

Não se trata de um instrumento enrijecido, pelo contrário, este é um instrumento que permite aos advogados e às famílias criatividade e uso de técnicas que envolvem gestão de contratos e aplicação de várias matérias em direito.

Ainda assim, o ditado popular não falha, nem tudo são flores!

A constituição de uma holding familiar não é apropriada para todas as famílias. Mesmo porque, a pessoa jurídica patrimonial permanece submetida aos custos e riscos de sua manutenção como qualquer outra empresa.

A má elaboração da sociedade, a inclusão de bens ou atividades arriscadas, a não inserção de cláusulas específicas a cada tipo familiar e a ausência de um estudo tributário longínquo podem comprometer todo patrimônio integralizado.

A boa notícia é que o planejamento patrimonial e sucessório é para todos. Existem variados outros meios de se planejar uma sucessão viável e econômica que não pela holding, através de doações, seguros de vida, previdências privadas, testamento, ou mesmo um inventário com um bom plano de partilha.

Vale dizer, é bastante animador o fato de que as pessoas têm buscado planejar a própria sucessão. A expectativa é que esse cenário avance para que sejam, cada vez mais, construídos meios de se proteger bens e boas relações familiares.

Marina Baleroni
Advogada associada do escritório Advocacia Baleroni. Efetiva da Comissão de Famílias e Sucessões da OAB-MT. Especialista em Direito e Planejamento Sucessório. Autora de artigos e teses jurídicas.

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